Ricardo Stuckert/PR via Flickr

Uma aulinha sobre fascismo para Lula

Presidente chamou anônima que estranhou primeira-classe de Dilma, de “fascista”, ignorando amigos que de fato o são
22.12.23

Os jornais publicaram e os perfis de internet repercutiram a abordagem da presidente do Banco do Brics, Dilma Rousseff, por uma passageira anônima da classe econômica, que estranhou:

– De primeira-classe?

A ex-presidente rebateu de primeira, sem deixar a interlocutora concluir a frase:

– Eu sou presidente de um banco.

Terá sido a passageira anônima abusada ao abordar sem conhecer uma “otoridade” da república bipartite sob o desgoverno de Lula Lira? Provavelmente sim! Ou a questão pode ser atribuída ao direito que o pagador de impostos escorchantes em níveis desconhecidos em quase todos os países mais ricos do mundo tem de cobrar mais humildade da casta dirigente? A resposta talvez possa ser qualquer uma das duas hipóteses. Quem a comentou de formas mais absurda e abusada foi, contudo, a autoridade mais alta de um desgoverno compartilhado, Luiz Inácio da Silva, sócio do teoricamente inimigo Arthur Lira.

– Fascista! – disparou.

Ex-dirigente sindical e partidário, ex-presidente em terceiro exercício do mais alto Poder Executivo, o autor do insulto não pode ser obrigado a demonstrar publicamente notório saber sobre ciências políticas e suas armadilhas. Entre outros atenuantes, ele poderia talvez apoiar sua defesa na informação posterior, dada na Folha de S.Paulo, de que, de acordo com o Datafolha, 90% dos brasileiros que votaram nele no último pleito não se arrependeram do fato, Apesar de todos os seus rompantes constantes de grosseria como o citado. Da mesma forma, poderá também usar a desculpa de que 90% dos eleitores que preferiram o adversário direitista, Jair Bolsonaro, manifestaram idêntica convicção. Ou seja, a bipolarização radical da paixão, e não da razão, política está mantida nos mesmos tons e níveis. O que significa que muito provavelmente, se a inelegibilidade deste cair nas mil e uma peripécias das Arábias das altas cortes da Justiça pátria, a disputa se repetirá. Apesar de seu governo ter lançado uma campanha, não de união nacional de todos sob a égide da tal da enxovalhada democracia, mas de forçada unidade sob a égide da dicotomia comunismo/fascismo, que o próprio presidente “de todos os brasileiros” tornou oficial ao comemorar a aceitação do “comunista” Flávio Dino pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado para a vaga de Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal (STF). Na certa, Sua Insolência não dispõe de tempo livre em sua atribulada agenda de viagens às ditaduras dos velhos amigos dele, agora atuais comparsas de nossa democracia cabocla, para ler a obra do melhor exegeta comunista do fascismo do mundo, o italiano Antonio Gramsci. Como este autor o fez na adolescência na Rua Ruy Barbosa, em Campina Grande, o que foi negado pelo falecido teólogo de Bolsonaro e da direita, Olavo de Carvalho. Ou já na senectude, quando o mesmo pôde ler os dois primeiros volumes da trilogia do genial romancista lombardo Antonio Scurati sobre o fundador do fascismo, imitado grotescamente pelo fascistóide (pois é impossível que o tenha conhecido em sua burrice crônica o capitão Bolsonaro).

O presidente do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, constituinte Joaci Góes, escreveu o espetacular Esquerdas e Direitas, cuja leitura também não ouso recomendar, ao meio presidente Lula, por lhe faltar tempo para acompanhar suas 600 páginas. Mas qualquer um poderá reconhecer que este não tem autoridade para, sem saber quem é a ousada colega de voo de Dilma, adivinhar qual seria a ideologia dela neste poluído e polarizado universo político-partidário brasileiro. Mas é possível aduzir que ela não é tão fascista quanto os parceiros dele no cenário político internacional: o venezuelano Maduro, pretendente ao petróleo da Guiana, o russo Putin, invasor da Ucrânia, o nicaraguense Ortega, o cubano Canel, o indiano Modi, o chinês Jinping e outros que de comunistas só têm a fachada. Ao contrário de Dino, cuja biografia com passagem pelo Partido Comunista do Brasil não passa de um registro biográfico, ou no caso atual, curricular.

O próprio Luiz de dona Lidu tem contribuído para o florilégio dos fasci di combattimento de dom Benito com frases como esta, dita na live que fez ao lado da primeira-dama Janja: “se é verdade que eu tenho sorte, o povo deveria me eleger para sempre”. Apesar de estar em seu terceiro mandato e ser favorito para concorrer a nova reeleição, contudo, os democratas que elegeram o amigo dos terroristas do Hamas esperam que essa frase digna de ser dita pelo condutor da Marcha para Roma, o ex-militante socialista e inspirador de todos os fascistas, Mussolini, o M de Scurati.

Para tanto, ele precisa de uma mãozinha do sócio Lira, antes de deixar a presidência da Câmara, corrigindo a ajuda que lhe deu o antecessor Fernando Henrique Cardoso ao permitir a reeleição eterna. Mas sem necessidade de pular uma depois da repetida, Será possível? Quem sabe? O protagonista de Scurati conseguiu criar uma ditadura a partir de uma minoria parlamentar na Itália com a ajuda de covardes majoritários e de sicários fanáticos que assassinaram covardemente o socialista Giacomo Matteoti. Este era o único que resistia ao mandato sem fim, que, segundo a História, terminou com o cadáver de Mussolini dependurado num posto de gasolina, ao lado do da amante de então, Clara Petacci. Fim que o comunista Gramsci não testemunhou, pois não estava mais entre os vivos.

 

José Nêumanne Pinto é jornalista, poeta e escritor

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  1. Quando um petista quer xingar alguém, é só chamar de fascista. Hoje, é pior que chamar de "burguês" ou "reacionário". A esquerda não sabe bem o que é fascismo, mas isso não importa para eles. A realidade não importa para o religioso. E fico imaginando o Lule assistindo um jogo do Corinthians e chamando o bandeirinha de fascista, quando ele marca um impedimento duvidoso. Vale tudo.

  2. Grande Nêumanne!!! Falou tudo. A começar por a dita pesquisa sobre a população que se diz não arrependida do seu voto. A polarização será eterna se o povo continuar com essa cabeça. Por isso gostaria de ver tão breve quanto possível a ventilação de novos candidatos. Quanto mais falam de esquerda x direita, mais o povo acredita que é só essa opção que existe.

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