Waguinho e Daniela: influência sobre a área da saúde no Rio de Janeiro pode satisfazer o casal

Nossa “democracia” limita-se a contar voto

No episódio de Dani do Waguinho, Lula expõe sua deficiente noção de República, limitada à contabilidade de votos e verbas e desprezando a gestão 
15.06.23

Na terça-feira 13 de junho, dia de Santo Antônio, doutor da Igreja e “casamenteiro” de ofício, o presidente da pretensa República, Luiz Inácio Lula da Silva, não escondeu que nesta sua terceira gestão a prioridade é a contabilidade. E mandou os compromissos com a gestão às favas, repetindo a célebre reação do coronel Jarbas Passarinho ao Ato 5, símbolo do tratamento dado pelo que o regime militar de antanho ao que as democracias autênticas ou falsas chamam de “instituição” no plural. E não fez questão de esconder bulhufas do distinto e desprezado agente de poder chamado cidadão, somente em teoria único detentor de todo poder. A matemática mambembe do ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema, hoje do ABC, despreza o decoro da mesma forma que a atividade política dos atuais detentores do poder ignora o alfabeto propriamente dito, a gramática e a ética.

Quem deve estar feliz com isso é o companheiro José Dirceu, que, segundo as boas línguas, advertira o chefinho sobre sua mania de largar amigos e serviçais insepultos. Advertira-o da eventualidade da iniciativa de zumbis, que podem substituir vergonha por vingança. Por via das dúvidas, o número 1 mantém as prerrogativas de pompa e poder para o filho do quem avisa amigo é, Zeca Dirceu. E raros são os fantasmas que aparecem nas noites sem assombração do Palácio da Alvorada. A dúvida voto a voto sobre a vitória da dita “democracia do amor” sobre a tirania negacionista aguçou o sentimento da gratidão do ferramenteiro. Que sempre apreciou o mau humor de João Ferrador, personagem-símbolo dos grevistas dos anos 70, no ápice do militarismo. A contagem dos votos seletos dos parlamentares sob a égide do Centrão de Arthur Lira, gerado na Constituinte no governo Sarney e amamentado pela direita canavieira sob a batuta do pernambucano Ricardo Fiúza no desgoverno Collor, foi a inspiração para compensar a fragilidade do apoio ao governo na Câmara dos Deputados. A cizânia interna do partido União Brasil, insulto à Pátria amada, mãe gentil, pulverizou o sonho da conquista com 37 ministérios, que tornaram a Esplanada de Niemeyer e Lúcio Costa um conto da carochinha.

Enquanto Lira entoava acordes de ira na obsessão pelo Ministério da Saúde, os desaforos de Waguinho, mais lobo do que cordeiro, foram absorvidos com compreensão inesperada pelo chefinho do Executivo. O ex-metalúrgico deu três pastas vazias para os discípulos de Luciano Bivar. Uma delas, a do Turismo, serviu ao despresidente para acalentar a vaidade do primeiro casal de Belford Roxo, no explosivo Grande Rio. Ciente de que o primeirinho entendeu a necessidade da gratidão na democracia que conta votos, mas não está nem aí para os eleitores, Waguinho migrou do dono dos três gabinetes na Esplanada para o Republicanos, em cuja bancada já rosnou o primogênito do ex, Flávio Bolsonaro. A iminência da retirada da titular do Turismo da cúpula federal acirrou os ânimos dos desunidos próceres do União para ocupar a eventual vaga já com o nome de seu sucessor no bolso, Celso Sabino, que, mesmo sendo um pula-pula de poleiro nem pensa em rejeitar o cargo em gratificação à permanência.

A primeira reação do maridão foi dizer que “Lula cometerá erro se retirar minha mulher do ministério”. Mas, depois da reunião dela com o presidente na terça-feira, 13, o alcaide de Belford Roxo mudou o tom ao contar que “ele [Lula] disse: ‘Daniela, você é minha cota, você é minha ministra, eu não quero que você saia’. Quando ele falou essas palavras, os dois choraram. Há esse impasse partidário, e vamos aguardar para ver como isso vai se finalizar”, disse o prefeito.

Os votos amealhados pelo casal na periferia do Rio de Janeiro tiveram grande importância no triunfo apertado do petista. E ele agora trata de arrumar uma saída honrosa para ela. Especula-se que a deputada se prepara para assumir o comando das repartições de saúde no Rio, no governo passado sob o tacão do filho de Bolsonaro. Uma herança que não provocaria desconforto algum no casal, se for mesmo contemplado.

Daniela Carneiro assumiu uma pasta esvaziada com a saída de sua alçada da Embratur. Seria uma nobre e útil tarefa de um gestor digno dessa denominação neste país que tem enorme potencial turístico. Mas nunca foi aproveitado à altura por essa trama sinistra que agora revela o fato que a democracia que derrotou a direita extremada nas eleições de 2022 não passa de uma tabuada de acertos de contas, feitos com respeito apenas ao orçamento.

À gestão do interesse público reservam-se moedas de esmolas de porta de igreja. E é absurdo o abandono da vergonha, única explicação para a esquerda continuar imitando a direita até em episódios grotescos como o golpe fracassado de 8 de janeiro. A punição dos vândalos, pedida pelos falsos defensores da ética, confunde a venda que tapa os olhos de Têmis com a incapacidade de enxergar o óbvio dos empoderados pelo voto. Constrange a qualquer um a ausência do general Gonçalves Dias ao sair ileso da CPI dos atos golpistas pelos votos de autoproclamados porta-vozes do povo. Apesar de ter desfilado, inerme e apalermado, entre os demolidores do patrimônio na sede do poder, que dito Executivo, exime-se de executar, o militar sequer foi chamado para testemunhar.

 

José Nêumanne Pinto é jornalista, poeta e escritor

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  1. Somos uma mera democracia eleitoral, e degenerando rápido. Nunca fizemos o salto final para uma democracia liberal de verdade, sólida.

  2. Creio que Lula nunca se preocupou com gestão. Ele teve bons momentos, sim, mas porque pegou algumas ações de seu antecessor no 1º mantado. Mas, ele não sabe descer do palanque e trabalhar de fato. Após 6 meses de trabalho ainda não sabemos a que ele veio. Onde está seu Plano de Governo que disse que mostraria assim que eleito. Só falou bobagens de populista para eleitor analfabeto funcional e acenou aos intelectuais e artistas.

  3. Não há palavras com as quais podemos nos considerar. Envergonhados? Isso foi a muito tempo. Injustiçados por esta justiça que temos? Isso foi a muito tempo. E.....bom..... deixa para lá. Oooooooo, traz uma pizza por favor.

  4. Infelizmente Lula é o fiel retrato de um povo ignorante, deseducado que almeja um peitinho na porca para também mamar e pensando em comer picanha ungiu um criminoso para a magistratura maior, isto tem preço que começamos a pagar caríssimo tendode nos contentar com jerimum e muita caganeira .. a única coisa democrática nesta galinheiro é o canelau poder suicidar nas urnas.

  5. Esta "democracia" elegeu um presidente que compõe um governo com uma ministra aliada de milicianos. Esses milicianos fortalecem seu feudo eleitoral e, consequentemente, o do presidente eleito. Desvendada essa relação espúria, a ministra segue no cargo e só o perde por aritmética político-partidária e não pela obscenidade eleitoral. Nesse país não há democracia, não se faz justiça nem se governa com propósito. É um país merda e continuará sendo enquanto ignonímias dessas perdurarem.

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