Wikimedia CommonsWinston Churchill: "We shall never surrender!"

A Liga dos Justiceiros

14.12.23

A Rua da Amargura, onde fica estacionado o meu Dodge Dart 73 enferrujado, sempre foi um lugar pacífico e pacato. Por ser um local habitado apenas por pobres desassistidos e remediados sem remédio, aqui nunca teve assalto, estupro, sequestro nem chacina.

Fora as doenças aqui nas redondezas tem nada para pegar, geralmente o ladrão, penalizado com nossa penúria e miserê, é que nos dá algum qualquer pra inteirar uma passagem ou quentinha. Se for em São Paulo é marmitex.

Os turistas também não dão as caras por aqui, essa região desolada onde não tem churrascaria rodízio, casas de massagem, bocas de fumo e outros estabelecimentos de entretenimento que fazem a alegria dos gringos estrangeiros.

Depois que os jornalistas da Globo começaram a ser mandados embora, a coisa mudou para pior aqui no bairro. Teve início um êxodo migratório desta categoria profissional para a nossa vizinhança. Repórteres, colunistas, comentaristas e editores desempregados se mandaram para cá em busca de aluguéis baratos e custo de vida zero ou em até 12 vezes no cartão sem juros.

A presença desses profissionais da bandidagem acabou trazendo o terror, o medo e a criminalidade para a outrora pacata Rua da Amargura. Com os homens de imprensa, vieram também os traficantes, os bookmakers, os homicidas, os bicheiros e os estupradores. Não necessariamente nessa ordem.

Se não fosse a Isaura, a minha patroa, que sempre baixa o cacete em quem nos ameaça, eu já estaria comendo capim pela raiz.

Amedrontados, os moradores resolveram criar uma milícia para proteger os velhos e encanecidos habitantes do local. Assim como os Justiceiros de Copacabana, nossos vigilantes se armaram de soco-inglês, nunchaku, bodoques, tacapes e arco e flecha para defender o nosso patrimônio e a nossa integridade física dos bárbaros marginais que infestam a área.

Infelizmente, nosso arsenal é humilde comparado ao poder de fogo da bandidagem e para isso nosso Justiceiros tem que lançar mão de armamentos medievais como a besta, os aríetes, as machadinhas e rachadinhas, cobrando dos moradores uma contribuição pecuniária voluntária para garantir a segurança.

Em torno da Rua da Amargura construímos um fosso e lá colocamos centenas de lagartixas, já que ficava muito caro comprar jacarés. Para nos camuflar, pintamos a cara de preto, o que gerou um enorme protesto do Movimento Negro que condena o uso do black face como uma forma infame de preconceito. Então resolvemos pintar nossos rostos de cor de rosa mas aí quem protestou foram os trans que nos acusaram de ser homofóbicos.

Agora aguardamos a chegada do inimigo de dentro dos bueiros, becos e outras quebradas cabulosas. Como diria Churchill, “we shall never surrender!”. O que isso quer dizer, eu não tenho a menor ideia, mas se o Churchill falou, tá falado.

O fato é que tudo isso não adiantou nada, a nossa milícia de Jiu Justiceiros é um bando de mocorongos ignorantes e semana passada espancou violentamente o Papai Noel que fazia uma visita às crianças do bairro. Acharam que o Bom Velhinho era um gatuno barbudo carregando um saco cheio de mercadorias roubadas.

 

Agamenon Mendes Pedreira gosta de fazer justiça com as próprias patas. As quatro

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  1. Agamenon, acho que a Rua da Amargura está sendo ampliada e alargada! O bom será partilhar com uma nova vizinhança. Além de ex-funcionários da Globo, terá ex- das Americanas, Magalu, Casas Bahia...

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