LeandroNarloch

Como destravar a universidade pública

17.05.19

À parte a comunicação destrambelhada e o belicismo típico de adolescentes, o ministro da Educação está certo numa coisa: as universidades públicas brasileiras gastam demais e educam de menos. Um aluno da Universidade Federal do Rio de Janeiro custou em 2015 quase 6 mil reais por mês – mais que diversas faculdades estrangeiras com prêmios Nobel na estante. Apesar desse custo, a UFRJ mal consegue entrar entre as trezentas melhores universidades do mundo em rankings mundiais como o Times Higher Education.

O problema não é tanto o governo cortar gastos das universidades, mas fazer isso sem viabilizar uma alternativa de financiamento privado.

Passei as últimas semanas conversando com professores, reitores, especialistas em administração pública, estudiosos e especialistas, sobre como destravar a universidade pública. A maioria deles sugeriu um modelo que já tem alguma base legal, já foi testado e aprovado. Mas que esbarra em travas burocráticas, ideologias e principalmente no corporativismo dos funcionários públicos.

É o modelo do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA). Em 2001, diretores do instituto tomaram uma decisão radical: extinguir o órgão que dirigiam e que existia desde 1952. No lugar dele, criaram uma Organização Social (OS) que passou a fechar contratos de gestão com o governo. Os funcionários continuaram como servidores públicos – foram cedidos pelo Ministério da Ciência e Tecnologia à nova instituição.

Desde então, o IMPA passou a contratar apenas pela CLT. Hoje menos de 10% dos funcionários administrativos são servidores; entre os pesquisadores, cerca de 50%. A folha de pagamento – que em geral morde mais de 80% do orçamento das universidades federais – não passa de 20% no IMPA. Cada vez menos a pesquisa científica ficará nas mãos de servidores.

O modelo de Organização Social, uma instituição sem fins lucrativos mas de direito privado, dá uma enorme flexibilidade. O instituto pode negociar contratos e convênios sem passar por licitações e outras burocracias. Isso tudo baixa o custo das operações. A Olimpíada de Matemática, que o IMPA organiza desde 2005, custa menos de 2 reais por participante.

Fundações de apoio às universidades existem desde os anos 1990, mas com poder limitado para organizar o meio de campo entre empresas e pesquisadores. Costumam ter problemas com a Justiça quando contratam pessoal e substituem funções tradicionais da universidade.

Além disso, têm pouco incentivo para arrecadar dinheiro na iniciativa privada. Os recursos que a universidade consegue vão para a conta do Tesouro Nacional e não costumam voltar, pois entram no teto de gastos constitucional. Faria muito mais sentido deixar na universidade (ou numa organização associada) o dinheiro que ela própria arrecada.

Em São Paulo, a coisa é mais complicada. Uma exclusividade da constituição paulista permite que o Tribunal de Contas estadual analise as contas (e não só os contratos) das fundações e organizações sociais, como se elas fossem órgãos públicos. Além disso, uma lei estadual prevê que as OS atuem somente em cultura e saúde. Vem daí exemplos de sucesso de administração de hospitais ou da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp). Mas, sabe-se lá o motivo, e ao contrário da lei nacional, São Paulo deixou de fora as organizações sociais para educação, ciência e tecnologia.

Outra vantagem das OS está na estrutura de comando. Como em empresas ou grandes instituições filantrópicas, seus diretores são eleitos por um conselho. Os integrantes, que em geral vêm do governo e da sociedade civil, elegem um reitor-CEO para cuidar do dia a dia.

Já na universidade pública, é comum professores de história ou sociologia de repente se tornarem reitores a quem cabe administrar orçamentos de bilhões de reais. No cargo, costumam atender mais os interesses dos funcionários que dos estudantes. O orçamento, assim, é quase todo tomado pela folha de pagamento.

Uma longa e gradual transição para o modelo de Organizações Sociais, começando pela gestão do dinheiro por museus, hospitais e centros de pesquisa, é um caminho para torná-las de fato independentes do Ministério da Educação. Uma mudança fundamental como essa não vai acontecer de um dia para outro – mas precisa de um ministro forte para iniciá-la.

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  1. No Rio, as OSs são uma desgraça. Acho enganosa a ideia de que esse modelo é uma espécie de fórmula mágica para melhorar as universidades. Se for adotado de modo generalizado, vai ser alvo de quem quer se locupletar, e a confiança excessiva vai permitir que o façam.

    1. Lamentável o estado da UFRGS. Já nos anos 90 era ruim. Infelizmente, o nosso modelo é ultrapassado, desconectado com a realidade. Muitos cursos ali deveriam fechar. E não sou bolsonarista!

    2. Fiz uma federal na década de 90 e foi uma experiência única. Não havia nada disso que ouço por aqui de professor panfletando querendo meter abobrinha na cabeça de ninguém. Virávamos noites estudando, fazendo projetos, os alunos eram excelentes. Os professores eram os melhores de seu tempo na área. Sinceramente, não me parece justo reduzir a pó essas entidades por falta de conhecimento delas. Bom separar militares e PT, suas imoralidades e ladroagens da história dessas escolas, e corrigir rumos.

  2. Claríssimo eis o caminho sem "ismos" temos que renovar esse pessoal cheirando a naftalina e formol tem que ser renovado fazer ciência é diferente de copiar ciência !!

  3. Enquanto não entendermos q somos semelhantes, não chegaremos a lugar algum. Somos um povo onde a cultura, a educação e o amor ao próximo anda não chegou até nós. A longevidade está nos levando a inutilidade,pois não comungamos as boas atitudes, o respeito e a família. Perdemos em nalgum lugar o outro e o bom senso.

  4. As universidades públicas federais co somem bilhões do orçamento da União, que está falida. O ideal seria passar a cobrar mensalidade de quem pode pagar e a transformar as universidades públicas em sociedades de economia mista, com fins lucrativos sim, como qualquer outra universidade de sucesso no primeiro mundo. A busca do lucro eliminaria o corporativismo medieval, pouparia os cofres públicos e naturalmente obrigaria professores e alunos a romperem com o pacto da mediocridade.

    1. O ideal era acabar com as UP, universidades públicas, não dão retorno acadêmico satisfatórios, os valores destinados a elas é absurdo, esse recurso seria melhor aproveitado na educação básica, implantação das escolas de tempo integral, em todas as séries inclusive no médio em q seria possivel escolher uma profissão, isso sim seria democrático, vc colocaria os jovens em igualdade de armas, munindo o filho do pobre c os recursos intelectuais, para disputar c os ricos 1 futuro melhor

  5. Meu filho não consegue ter aula de cálculo no segundo semestre de engenharia na UFRJ porque o professor fala de tudo, menos da matéria. Estuda sozinho em casa.

    1. Saúde de SP inteiro é OSS, exceto por 42 unidades de Adm direta. OSS funciona muito bem em SP.

  6. E qual foi o custo de um preso, com todos penduricalhos. Digo isso pq se o preso passar mal vai para um hospital e é internado, enquanto o cidadão comum fica procurando vaga de hospital e hospital. Sei que meu comentário não tem nada a ver com a matéria mas só para comparar o custo de um aluno na Universidade e o preso. Quanto nos custa Lula, Juiz Lalau e outros.

  7. ótima sugestão de início de mudança, chega de mediocridade e má gestao, o fato é que mesmo se formando em federais a grande maioria sonha em ser funcionário do estado, onde poderá usufruir do trabalhar pouco e produzir idem e se incluir no sistema

  8. As OS fracassam no Brasil, pois quem as formam no primeiro momento, são os mesmo grupos que agem nas licitações, farejam dinheiro, ha grupos prontos para gerir do jeito que os politicos gostam...É preciso definir parâmetros de funcionamento com responsabilidade de gestores e conselhos sem ligação ideológica. É querer muito não!

  9. De boas intenções o inferno está cheio. Não concordo com a visão do autor que as OS sejam solução. Mesmo com as OSs ainda há o poder de funcionários públicos na indicação de reitores. Ela apenas afrouxa o garrote das licitações. O MEC tem que se responsabilizar pelo ensino básico universal de qualidade e privatizar as universidades. Quem quiser e puder paga e quem não pode pagar deve contar com financiamento estudantil dependendo do desempenho. O resto é manter tudo como está.

    1. Concordo com você, Sandro. O problema é: como chegaremos nesse modelo.

  10. Existia um grande orgulho de ver seu filho ingressar em uma faculdade pública. Hoje lamento ter que depender da USP onde após muito estudar minha filha igressou. Aprendeu muito rápido a ser militante petista até porque nāo tem quem nāo seja.

    1. Isso acontece de forma generalizada no Brasil hoje, pais desesperados por verem os filhos se converterem após o ingresso nas Universidades Estaduais e Federais. Muito triste e preocupante!

  11. As Univ.Federais do Brasil - todas - estão contaminadas e viciadas pela ORCRIM LuloPTista........e por conta disso.......só com muitos sacrifícios o governo Bolsonaro conseguirá abreviar essa desmoralização perante o mundo.. ......é tudo pelo socialismo e nada pelo aprendizado.

  12. Creio que Universidades deveriam ser desvinculadas do MEC. Universidades nao educam, profissionalizam (atualmente muito mal por sinal). EDUCAÇÃO relaciona-se à base.

  13. Não concordo com a ingerência de terceirizados na Educação, porque nem todas as OS's são tão "puras" e "competentes" assim, mas o trabalho feito pelo articulista é o que deveria ter sido feito pelo Ministro. Era obrigação dele reunir os reitores das universidades federais e especialistas em Educação para criar um modelo de convergência para geri-la. Em vez disso soltou a voz de maneira infantil pensando que era dono do pedaço - como o seu chefe - e deu nisso. Pior, ouve mexeriqueiras do PSL.

  14. Ótimo texto num momento em que grupos com intetesses pouco republicanos defendem a manutenção de situacões já testadamente ineficazes. É lastimavel que a grande mídia não dê ampla divulgação a tais idéias. Isto, aliás comprova que além de um processo deficiente de educação, temos um intenso mivimento de deseducação e desinformação patrocinado por interesses inconfessáveis.

  15. Texto muito elucidativo. Uma ideia que já vem sendo realizada e pode servir de exemplo do que deu ou não deu certo. Pode servir como base de estudos junto a outras que estejam indo pelo mesmo caminho.

  16. Acontece, sem depreciar o texto e seu articulista, serenos ambos, que o “belicismo destrambelhados” E INFANTIL deste Ministro falastrão, soa como se fosse mais um olavete que o GESTOR da Importantissima Pasta ‘justamente’ DA EDUCACAO!!! E pior fica, pelo que de angustiante sofre agora a nação, na dúvida quanto a serenidade e equilíbrio do Presidente em que depositou a enorme esperança de salvar o pais, da quebradeira em que o atolaram o Petismo e seus cúmplices. E justo neste momento ERRÁTICO!!!

  17. Estreio da Crusoé com o primeiro comentário elogiando o texto e as ideias nele contidas. Discordo de alguns pontos, mas o importante é apresentar algo que já funciona e fundamentado em experiência positiva. Existem outras alternativas e que devem ser lançadas pela imprensa profissional e sinalizadora de soluções a serem debatidas com gente que entende e de boa índole.

  18. Infelizmente, o modelo de OS não vingou no Brasil. É bombardeado constantemente pelos Ministérios Públicos e outras autoridades e não conta com segurança jurídica. A se pensar a respeito...

    1. O.S? Aqui no RJ a saúde foi entregue à essas organizações. Piorou o serviço à população.

  19. Querem “destravar a universidade pública”? Faça uma devassa. Faça uma limpeza profunda. Faça uma esterilização do MEC. O MEC se tornou ao longo das últimas décadas a última trincheira da esquerda brasileira. Que o diga Paulo Freire e sua “pedagogia crítica” que nada mais foi e é o gramscismo aplicando o marxismo cultural há décadas. Hoje desde às universidades até as escolas rurais paupérrimas, com raríssimas exceções, o que produzem e formam são ativistas e militantes acéfalos. Nada mais.

    1. Não se muda, mantendo-se o que entrava a mudança. Tem que ter força e coragem pra mudar, assumindo e reconhecendo perdas necessárias, abandonando coisas velhas, em cujo lugar assumam coisas novas que venham fazer diferença em favor do país e não de alguns pouco privilegiados.

  20. Bolsonaro no caminho certo, o problema da educação no Brasil é a base, adições simples de matemática e contextualizar um texto de português tem sido uma tragédia pra muitos alunos. Ainda vale mais um bom curso técnico que dê garantias de um bom emprego, que uma formatura superior, onde conheço muitos formados em economia, advocacia e até mesmo engenheiros dirigindo uber.

  21. Acredito que os institutos deveriam ter parcerias como empresas. Os pesquisadores ganhando salário com metas e busca de resultados. Temos que parar de explorar o serviço público. As empresas tem capital tecnologia e vão dar mais estrutura e liberdade ao pesquisador mais laboratórios como no exterior. Vamos deixar entrar parcerias nas universidades colocar gestores no comando num Conselho de Professores. Os ministros Abrahão e Guedes tem boas idéias vamos modernizar e melhorar!

  22. São textos como esse que acrescentam. Mostremos o texto do Sabino ao Presidente e esse ao Diogo. Criticar é fácil. Excelente!

  23. Excelente! Gostaria de acrescentar apenas que o curso de Direito da UFPR da qual sou egressa é quem comumente "elege"o Reitor e é sempre da esquerda ativa.Agora é o ex diretor da faculdade.As paredes são tomadas de cartazes apenas da esquerda. Professores obrigaram alunos ano passado, valendo nota, a ir ao acampamento do Lula e escrever resenha sobre e a favor, lógico. O atual reitor, advogado e professor, foi nomeado pela OAB Nacional para analisar de forma independente a situação do corte...

    1. Quis dizer com isso que há muito movimento político em apenas uma direção, não discussão política, que seria salutar. E a verdadeira balbúrdia está também nas faculdades de Direito Pública, onde a maioria dos professores são de esquerda, mas dirigem Mercedes e Jaguar, convocam protestos e oprimem professores e alunos liberais e capitalistas.

  24. Por outro lado, as universidades privadas são bem "destravadas" e também recebem muitos recursos públicos também (ProUni, FIES, CNPQ, CAPES, ...). Resta comparar os indicadores.

  25. As universidades públicas não conseguem atrair dinheiro privado para pesquisa porque, simplesmente, as pesquisas não interessam a ninguém, somente à própria academia. O professor pesquisa o que bem quiser. Quem quer financiar uma pesquisa que não vai dar resultado prático nenhum?

    1. Concordo. E gostei do texto, seria bom uma análise pelo Ministério da Educação. Garanto que não teríamos teses e pesquisas sobre os temas relatados pelos parlamentares na plenária que convocaram o ministro.

  26. Como sempre, inspirante artigo. Precisamos d ideias boas na educação e principalmente nas universidades. Melhor jeito d acabar com a ineficaz e danosa ideologização marxista

  27. Como sempre um Artigo digno de seu autor e uma aula de jornalismo independente e eficaz.Parabéns Leandro.Sou cada vez mais seu fã de carteirinha.Show de bola!

  28. ministro forte? com a oposição esquerdista, com o centrão, com a desinformação da absoluta grande mídia, com o ainda forte aparelhamento comunista nas universidades e escolas de segundo grau, com tribunais superiores protegendo a corrupção. para ficar por aqui. esqueçam ministros e governo fortes.

  29. Muito boa a matéria. Sou leiga no assunto, mas tudo o que foi colhido pelo Narloch junto aos especialistas faz muito sentido. Falta achar um Ministro capaz de entender e fazer o que precisa ser feito.

  30. Dá gosto de ler! Não é apenas mais uma mera opinião de jornalista, é um estudo sério da situação apontando caminhos. Parabéns!

  31. Na atual conjuntura da legislação trabalhista este modelo não tem muito futuro pois é muito comum os funcionários Celetistas conseguirem na justiça a equiparação aos concursados. Diderot

  32. Sou favorável à desestatização das universidades públicas, e fim do ensino superior gratuito. No Brasil nada do que é público funciona. Nosso sistema político institucional está podre, não serve mais. Temos que mudar radicalmente a mentalidade vigente.

  33. Crusoé permita que compartilhemos esses bons artigos com não assinantes! Como gostaria de encaminhar este por exemplo, para duas pessoas!!!!!

  34. Excelente e oportuno artigo. Discutir eficiência nas universidades públicas - formar profissionais de alto nível - deveria ser o centro da discussão. Longo caminho a ser percorrido, mas valerá o esforço.

  35. Parabéns. Em dezenas de horas de debates na Câmara, não se viu uma proposta razoável para melhora na Educação. Esse artigo, em poucos parágrafos, deu uma bela contribuição que poderia ser melhor discutida.

  36. A meritocracia deveria ser considerada não apenas para a seleção de professores e pesquisadores mais também para mantê-los nos cargos. Métodologias claras e objetivas de avaliação da qualidade da pesquisa e dos resultados do ensino determinaram se um servidor seguiria no cargo ou seria convidado a ceder sua vaga a alguem mais apto.

    1. Creio que um estudo externo, amplo, profundo e professional pode chegar a sugestões com maiores chances de êxito. Já há metodologias claras, objetivas e transparentes de avaliação da qualidade de pesquisa e extensão com métricas adotadas internacionalmente. Há muita heterogeneidade na produção por áreas e como tudo, há variabilidade intra-grupos. A lei de inovação http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13243.htm já permite maior integração com as demandas imediatas.

    1. Os hospitais universitários têm caminhado para uma situação similar. Ver a Lei nº 12.550, de 15 de dezembro de 2011.

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