Ministério da Emergência da Rússia via Wikimedia commonsO Crocus City Hall, alvo do atentado da semana passada: a Rússia sempre esteve no alvo de extremistas islâmicos

Estado Islâmico à espreita 

Atentado na Rússia mostra que grupo terrorista nunca perdeu seu poder para recrutar novos membros e organizar ataques. Ocidente fica em alerta 
29.03.24

O ditador russo Vladimir Putin fez todo o possível para jogar na Ucrânia a responsabilidade pelo atentado na casa de shows Crocus City Hall, em Moscou, que deixou 139 mortos e 180 feridos. Não conseguiu. Uma mensagem do grupo terrorista Estado Islâmico nas redes sociais e a divulgação de vídeos gravados por câmeras corporais dentro do prédio não deixaram dúvidas sobre os seus verdadeiros autores da matança. O último atentado do Estado Islâmico (também conhecido como EI ou Isis, na sigla em inglês) permite concluir que o grupo, mesmo após ter perdido seu território na Síria e no Iraque, segue ativo e com capacidade de realizar ataques pelo mundo. Entre os seus principais alvos estão cidadãos russos, como represália à ação militar que derrotou o EI no Oriente Médio, e os infiéis, ou não muçulmanos, que podem estar em qualquer cidade do Ocidente.

A ação durou apenas dezessete minutos. Pouco antes das 8 horas da noite de 22 de março, quatro terroristas entraram atirando com rifles de assalto no hall principal da Crocus City Hall. Eles então entraram na arena onde aconteceria o show e foram disparando contra todas as pessoas à sua volta. Minutos depois, os quatro saíram pela mesma porta. Uma explosão foi ouvida, o teto do prédio pegou fogo e desabou.

O ataque no Crocus City Hall tem quase todas as digitais do grupo terrorista. A escolha do alvo priorizou um espaço com grande concentração de civis. Naquela noite, a banda russa de rock Picnic estava pronta para subir ao palco e tocar para mais de 6 mil espectadores. O objetivo nesses casos é alcançar o maior número possível de vítimas fatais em um espaço dedicado à diversão. O atentado, assim, guarda semelhanças com os ataques do EI em Paris, em 2015, que ocorreram na boate Bataclan, em cafés, restaurantes e no Estádio da França (137 mortos). Também se assemelha com os que ocorreram em Manchester, em 2017, após um show da cantor Ariana Grande (22 mortos).

O histórico dos ataques do Estado Islâmico mostra que os europeus precisam aumentar a vigilância. Mas, entre todos eles, os russos são os que mais têm de se preocupar. “Vejo a Rússia como um alvo mais fácil do que a Europa ocidental“, diz Leandro Loureiro da Costa, professor substituto do Instituto de Relações Internacionais e e Defesa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “A Europa ocidental tem se preparado melhor, enquanto a Rússia está toda focada na Ucrânia.”

A fragilidade da Rússia deve-se em grande parte ao autoritarismo de Putin. “O governo russo tem usado a ameaça ucraniana, assim com outras ameaças que eles entendem como extremistas, para acabar com a oposição dentro do país”, diz Sean Steinberg, analista do Soufan Center, um instituto americano especializado em segurança global e política externa. “Com isso, o país perdeu a mão na estratégia para controlar a ameaça jihadista, que paira sobre o país há muito tempo.”

Apesar de os muçulmanos serem cerca de 10% dos mais de 140 milhões de russos, as disputas entre eles remontam ao império russo, que no século 19 subjugou grupos religiosos no Cáucaso e na Ásia Central. Alguns desses grupos jamais baixaram a cabeça para Moscou — os afegãos lutaram por dez anos contra os soviéticos nos anos 80 e os chechenos entraram em guerra com Bóris Yeltsin, em 1994, e com Putin, entre 1999 e 2009. Mais recentemente, a essa rixa de caráter separatista somou-se o fundamentalismo religioso do Estado Islâmico, que se espalhou pelo Oriente Médio e pela Ásia. Dos quatro terroristas presos, três eram do Tajiquistão, ex-república soviética.

Ao conquistar um território na Síria e no Iraque, o EI criou um califado islâmico, com seu próprio governo, o que atraiu radicais do mundo todo. Seu auge foi em 2015. Como o grupo acabou se transformando em uma ameaça para todos os países, foi atacado por um amplo leque de forças. No Iraque, foram bombardeados por americanos, que com os europeus apoiaram as forças curdas e o governo local. Na Síria, foram alvejados pelo ditador Bashar Assad, com ajuda da Rússia e do Hezbollah, financiado pelo Irã. Após o fim do grupo, todos se tornaram alvo de represálias. A Rússia, nessa guerra, teve uma participação especial e por isso hoje é tão odiada pelos terroristas. Desde 2011, Putin tem apoiado o ditador Bashar Assad com armas e o envio de militares. Anos depois, o grupo mercenário Wagner passou a atuar na Síria.

O Estado Islâmico ainda conta atualmente com uma equipe de ação separada, que trabalha com autonomia. É o Isis-K. A letra vem da região conhecida como Khorasan, que englobaria Afeganistão, Paquistão e Irã. “O Isis-K é uma ramificação do Estado Islâmico. Eles juram lealdade ao EI, mas possuem seu próprio organograma e área de atuação”, diz Loureiro.

A resiliência do Estado Islâmico e de sua filial Isis-K hoje são um problema especialmente para a Rússia e para a França, uma vez que Paris se prepara para receber as Olimpíadas este ano. O governo de Emmanuel Macron já entrou em alerta máximo para evitar que cenas como os ataques a casas de show e ao Estádio da França se repitam.

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  1. Os islamitas radicais são movidos a ódio... E a humanidade toda vai sofrer com essa necessidade de destruir os "infiéis". Tempos difíceis 😢🖤😢

  2. Sinto muito pelos cidadãos russos que foram afetados, direta ou indiretamente, por esse atentado. Espero que não tenha sido em vão e que Putin tire daí lições sobre sua pequenez diante de terroristas que, muitas vezes, ele incentiva. Que pare de atacar os outros e cuide melhor de sua casa.

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