Renato Araújo/Câmara dos DeputadosCargo hoje ocupado por Jean Paul Prates no comando da estatal se deve mais a Rodrigo Pacheco, presidente do Congresso

O adulto na sala

Com crise instalada pelo Palácio do Planalto na governança da Petrobras, Congresso avança diante da falta de foco e de unidade do governo
12.04.24

Pode-se dizer que a presidência da Petrobras é uma cadeira elétrica. O motivo é a necessidade de ter que servir a dois senhores, isto é, aos acionistas e ao governo, que nem sempre estão alinhados, seja em governos mais liberais, seja em administrações mais intervencionistas.

No governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, a pressão sobre o preço dos combustíveis derrubou pelo menos uma cabeça. No caso de Lula, além da questão inflacionária—os preços cobrados pela empresa estão 18% abaixo do que está sendo praticado no mercado internacional—, há uma disputa pela disponibilidade de recursos que a empresa terá para investir. Lembrando que o governo previu que que sua contribuição no novo PAC será de 323 bilhões de reais.

Os problemas se tornaram uma disputa interna entre ministros de Minas e Energia, da Casa Civil, da Fazenda, do presidente do BNDES e do próprio Jean Paul Prates, quase dado como ex-presidente em exercício, dominou o noticiário, despejando um caminhão de volatilidade no mercado.

No auge da crise, Prates tentou marcar uma “conversa definitiva” com Lula. Não conseguiu. Queria obter um compromisso por parte do Planalto, mas o efeito foi o inverso: o jornalismo de bastidores vazou que o presidente havia ficado irritado com o que pareceu uma tentativa de emparedamento enredada por Prates e tudo realmente caminhava para um desfecho negativo para o chefe da estatal.

Mas uma declaração de alguém que não estava no mapa da briga mudou tudo. Em uma entrevista a um canal de TV, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado Federal, disse que a Casa que ele lidera se sentia prestigiada com Prates no comando da Petrobras. Foi a senha para as coisas se acomodarem. No mesmo dia, Alexandre da Silveira, titular de Minas e Energia e um dos principais incendiários de toda a situação, pediu que a Petrobras fosse “deixada em paz”.

É irresistível pensar que o peso da frase, “o Senado se sente prestigiado com Prates na Petrobras” não possa ser encaixado na narrativa de que o centro de poder do país se deslocou de forma – até aqui – irremediável para o poder Legislativo. Lula não tocou mais no assunto, os ministros envolvidos foram falar de outras coisas e Prates voltou à sua vida, mas devendo seu cargo, agora, mais ao Congresso do que ao Planalto (que sequer o recebeu).

O furacão da Petrobras apenas começava a se dissipar e outro já se formava a partir das declarações o empresário Elon Musk, dono da rede social X, contra Alexandre de Moraes e, indiretamente, contra Lula, que estaria encoleirado pelo ministro do STF. Uma simples mensagem de um notório polemista foi capaz de estremecer todo o governo, dominando a pauta e gerando inúmeras notas de repúdio. Não demorou para alguém lembrar do PL das Fake News que, na verdade, trata de inúmeros outros assuntos relativos ao funcionamento das redes sociais, e que estava engavetado desde 2023. Seria a hora de aproveitar a comoção e colocar a proposta para votar.

Aí foi Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, que entrou em cena. Na melhor linha do “eu conheço seus interesses melhor do que você”, enterrou o movimento do PL das Fake News primeiro porque ele sabe que o projeto não tem voto e, segundo, porque ele sabe que é mais importante, agora, que o país concentre atenção na reforma tributária, ainda incompleta até que se vote as iniciativas de regulamentação que o governo precisa enviar até o dia 15.

A questão mais ampla é que Lira impôs a agenda econômica ao perceber que o governo queria perder mais tempo com Musk e suas críticas. Está certo que Lula deseja que a pauta da defesa da demora se estenda o máximo que for possível. Mas, se o Planalto decidisse se dedicar ao PL das Fake News, dificilmente resolveria a reforma tributária em 2024 em razão da falta de tempo hábil em um ano sabidamente encurtado pelo calendário eleitoral.

Já se falou muito que o poder recém conquistado pelo Legislativo se deu pelo controle que ele passou a exercer sobre o Orçamento. O que estes dois casos acima indicam, no entanto, é que ele se também se dá pela incapacidade que o governo tem demonstrado de manter o foco na agenda econômica e no estilo de liderança pessoal de Lula que, ao estimular a concorrência interna entre seus ministros, mantém a Esplanada conflagrada o tempo todo.

Aos poucos, mas de forma contundente, vai se respondendo à grande pergunta do início do governo que era como Lula, um presidencialista centralizador, iria se dá com um arcabouço mais favorável ao Legislativo. Hoje, não se passa nem perto disso. A falta de objetividade e de unidade do primeiro escalão tornam até as coisas mais fáceis para o Congresso que, diante desta intempestividade crônica do Planalto, pode até começar a se apresentar para a sociedade como o “adulto da sala”.
Leonardo Barreto é cientista político e diretor da VectorRelgov.com.br

 

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  1. E, mesmo o executivo tendo conseguido a vitória de acabar com o orçamento secreto no STF logo no início do mandato, o legislativo segue sacando toda a grana que deseja do orçamento da união

  2. O novo PAC (programa de aceleração da corrupção ) tem especial interesse do governo, na expectativa de irrigar com grana empresas amigas e obter vantagens com isso, como aconteceu em governos petistas anteriores

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