Foto: Marcelo Camargo/Agência BrasilAlexandre Silveira: cavando um espaço maior na política - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Mais petista que os petistas

Embora pertença ao PSD, o ministro das Minas e Energia Alexandre Silveira ganhou a confiança de Lula ao comprar briga em defesa das teses populistas e intervencionistas do governo
12.04.24

A jovem Pompeia Sula, segunda esposa do imperador romano Júlio César, promovera na casa do casal uma festa exclusiva para mulheres em homenagem à Bona Dea (a boa deusa).

Disfarçado de tocadora de lira, Publius Clodius, apaixonado por Pompeia, conseguiu entrar na festa. Antes que conseguisse se aproximar da moça, no entanto, foi desmascarado pela mãe do imperador e expulso.

Ao saber do ocorrido, Júlio Cesar imediatamente se divorciou da jovem. Em um tribunal, ao ser indagado sobre o caso afirmou não ter nada contra Publius Clodius e que sequer sabia coisa alguma sobre o rapaz.

A explicação para o divórcio ficou gravada para sempre na história. “À mulher de César não basta ser honesta, deve parecer honesta”, decretou.

O mesmo princípio se aplica àqueles que querem fazer parte da trupe petista e buscam orbitar o rei sol do partido, Lula.

Assim o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, tem se portado: alinhando discurso e prática à cartilha petista de proselitismo e estratégias populistas. Como não tem medo de comprar brigas, ganhou muita visibilidade e a confiança de Lula nos últimos tempos.

Silveira se aproximou de Lula nas eleições de 2022, após atuação importante na condução da campanha para virar a balança a favor do petista em Minas Gerais. Foi considerado crucial para a vitória do presidente no estado, mas acabou ele próprio derrotado na disputa para o Senado Federal.

Como token de agradecimento e com o apoio do presidente do Senado, o mineiro de criação Rodrigo Pacheco, Lula o encaminhou para um ministério de relevância, ocupado anteriormente por nomes como Dilma Rousseff.

Apontado na Esplanada dos Ministérios como o “homem forte” do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e com bom trânsito no Legislativo, o chefe da pasta de Minas e Energia adotou o evangelho petista e trabalha com afinco para parecer um correligionário do partido de Lula.

No episódio mais recente, Silveira defendeu em alto e bom som que a Petrobras não deveria aderir à política de “distribuição de lucros exorbitantes aos acionistas”, no tom da cantilena petista mais tradicional.

A posição, no entanto, também servia a um desafeto de primeira hora no governo, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates. O desentendimento entre os dois começou em meados de março de 2023, quando Silveira tirou da relação de indicados ao Conselho da petroleira dois nomes sugeridos por Prates.

À época, a presidente do PT Gleisi Hoffmann partiu para cima de Silveira e acusou estelionato eleitoral. Mas, com a benção de Paulo Pimenta (da Secom), o ministro conseguiu fazer valer os nomes.

De lá para cá, Silveira e Prates se engalfinharam em outros temas como política de gás e reavaliação da venda de ativos. Recentemente, na querela sobre os dividendos extraordinários da petroleira, Prates abriu um flanco importante ao se abster na votação sobre a destinação dos recursos da estatal.

As diretrizes do Planalto para a questão eram claras: a retenção total dos 49,3 bilhões que excediam o valor previsto para proventos na política de dividendos da petroleira. Prates não só encaminhou proposta pela retenção de apenas 50% do montante, como preferiu não se posicionar sobre a proposta encaminhada pelo colegiado pela retenção total dos recursos.

A estratégia foi vista como uma sinalização ao mercado da discordância de Prates com a medida. No dia seguinte à divulgação da retenção dos dividendos, as ações da Petrobras caíram mais de 10% e a companhia perdeu mais de 55 bilhões de reais em valor de mercado. Prates resolveu dobrar a aposta e, em publicação no X, afirmou que a posição do Conselho foi orientada pelo “Presidente da República e pelos seus auxiliares diretos que são os ministros”.

Era a deixa que Silveira esperava para mostrar que era mais petista que o petista Prates. Dias depois, à vontade durante uma entrevista, acusou o presidente da estatal de não ter compromisso com o acionista majoritário, o governo.

“Se o presidente da empresa naquele momento tivesse votado com o Conselho, não teria tido barulho”, disse ele. Em seguida, empunhou a bandeira petista. “Os acionistas minoritários, de referência, estavam mal-acostumados. Estavam recebendo distribuição de dividendos que não era lucro, que era venda de ativos como lucro. Estava uma delícia, estavam até lambendo os beiços.” É para deixar no chinelo até Gleisi no chinelo.

Nesta semana, Silveira lançou, ao lado de Lula, uma MP (Medida Provisória) para a redução da tarifa de energia para consumidores residenciais. Em que pesem as críticas às mazelas que a proposta pode gerar (com custos mais altos no futuro), ressuscitar uma das estratégias mais famosas de Dilma Rousseff reduzir a conta de eletricidade artificialmente para angariar simpatia do eleitorado é quase um batismo de fogo no petismo.

Silveira também recebeu o deputado federal e pré-candidato à Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos (Psol), para tratar dos problemas com a distribuidora de energia da capital paulista, a Enel-SP. Sem nenhum consulta ao atual prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, determinou que a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) abrisse processo para avaliar a cassação da concessão da distribuidora.

Como se não bastasse apoiar o candidato escolhido por Lula para a disputa eleitoral na maior capital brasileira, Silveira ainda defendeu a possibilidade de reestatização da Enel.

Ao longo dos primeiros 16 meses no governo, Silveira mostrou a que veio: defendeu a recompra da refinaria Landulpho Alves, na Bahia; a reestatização da Eletrobras e da Enel; o fim dos lucros para acionistas minoritários da Petrobras; e obediência inconteste da petroleira às demandas governistas.

Tudo na balança, Silveira parece atender à máxima do romano Júlio César: está convicto da necessidade de “parecer” petista. Aliás parece mais do que muitos filiados ao partido e é nisso que aposta para garantir uma vaga no Senado em 2026.

O projeto eleitoral passa pelas eleições municipais deste ano. À frente do PSD no estado mineiro, Alexandre Silveira tem usado a influência junto aos prefeitos de diversos municípios para selar a aliança com o PT.

Nessa estratégia, o PSD será vice na chapa de candidaturas encabeçadas pelo PT nas cidades de Juiz de Fora, Uberlândia e em Contagem. Depois da capital Belo Horizonte, essas são as três maiores cidades do estado. As negociações contaram com o aval de Pacheco e do presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab.

O petismo de Alexandre Silveira, no entanto, é alvo de desconfianças por parte dos integrantes do PT mineiro. A disputa pela prefeitura de Belo Horizonte é o principal entrave. O PSD de Silveira vai apoiar à reeleição do prefeito Fuad Noman, filiado ao partido, enquanto o PT local defende a pré-candidatura do deputado federal Rogério Correia.

Integrantes do Planalto, no entanto, admitem que possa haver uma intervenção de Lula contra a candidatura do PT, caso Correia não ganhe tração até o período de registro das candidaturas. Nesse caso, já existe um acordo, costurado por Silveira, para que o presidente suba no palanque do prefeito do PSD, que busca a reeleição.

Ser mais petista que os petistas é o caminho que o ministro das Minas e Energia encontrou para ampliar seu espaço na política – e até agora, está dando certo. 

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  1. Esse é o eterno problema de ter (más) lideranças políticas à frente de pastas técnicas: o objetivo não é o interesse nacional, mas granjear poder e estatuto a cobrar na próxima eleição. PS: desculpe o pedantismo mas César nunca foi imperador, oficialmente. Ele se arriscou a ser declarado ditador vitalício, mas imperador apenas o seu herdeiro político, Augusto.

  2. De fato, na política, como na vida, quem almeja ter valor, não basta ser honesto, tem também que parecer honesto. O problema com Alexandre Silveira é que qualquer um que apoie Lula e seu entorno, automaticamente parece desonesto e o povo brasileiro, não sou eu quem está falando, mas as pesquisas provam, parece que confirmam isso.

  3. Realmente o Silveira está caprichando nas politicas populistas. Será que vai conseguir manter o Pietro no Conselho de Administração da Petrobras?

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