DivulgaçãoLord Kitchener, do Império Britânico: ele sim resolveria os nossos problemas

Coloniza-te, Estado brasileiro

Antes de o Estado colonizar qualquer coisa ele precisaria colonizar a si mesmo, e trazer alguma civilização para Brasília
06.07.23

Vou plagiar uma coluna do Josias Teófilo. É uma coluna que ele publicou faz pouco aqui na Crusoé dizendo que o Estado brasileiro devia colonizar as favelas e que o problema do Brasil não foi o excesso de colonização, mas a falta.

Li isso e senti vontade de escrever uma coluna dizendo a mesmíssima coisa. Como não sei dizer não para mim mesmo, vou plagiar. Então peço que ninguém conte a ele o que estou fazendo.

Nunca dei muita importância ao plágio, pra falar a verdade. As pessoas fazem muito chilique com isso. Faz diferença, se eu tenho uma ideia, se ela veio num relâmpago de inspiração dentro da minha cabeça, ou se veio num relâmpago de inspiração dentro da cabeça de outra pessoa? Ela agora é minha, está relampejando dentro da minha cabeça, não quero saber de quem ela já foi. Queremos ideias virgens, que nunca foram de ninguém antes? Somos incels do intelecto?

É como um gato que já foi de outra pessoa. Agora eu adotei, vive comigo faz tempo. É menos meu?

Para piorar as coisas, vou copiar um trecho do Josias palavra por palavra, sem aspas nem atribuição:

O Estado brasileiro nunca esteve verdadeiramente presente nas favelas. Elas são como o sertão na época no cangaço. Um lugar que precisa ser colonizado e civilizado. Precisa de saneamento, pavimentação, arborização, policiamento.

E mais outro (não estou nem disfarçando. Estou partindo do princípio que ninguém vai botar no Google e descobrir que só fiz copy and paste):

O problema do Brasil não é a colonização, o problema do Brasil é que a colonização do país nunca aconteceu por completo, nem mesmo dentro das cidades.

Todo mundo conhece aquela cena do A Vida de Brian, do Monty Python, em que um israelita da época de Jesus, na época da dominação romana, faz um discurso bravo contra os romanos, perguntando: “O que é que os romanos já nos deram em troca?” Depois de um silêncio alguém responde timidamente: “O aqueduto?”. “Ah sim, eles nos deram isso, é verdade”. “E o sistema sanitário”, diz mais alguém. “E as estradas”, diz outro. “Sim, certo, tudo bem, mas fora o aqueduto, o sistema sanitário e as estradas…” “Irrigação”, lembra mais um. E assim por diante, vão lembrando de tudo: medicina, educação, vinho, banhos públicos, paz, ordem, “e é seguro andar nas ruas à noite agora”.

Ou, como diz de modo mais sem graça a escritora Erin Blakemore num artigo da National Geographic:

“Os governos coloniais investiram em infraestrutura e comércio e disseminaram conhecimento médico e tecnológico. Em alguns casos, eles incentivaram a alfabetização, a adoção dos padrões ocidentais de direitos humanos, e semearam as sementes de instituições e sistemas de governo democráticos. Algumas ex-colônias, como Gana, experimentaram uma melhora na nutrição e saúde com o domínio colonial, e o assentamento colonial europeu tem sido associado a alguns ganhos de desenvolvimento.”

Toda a minha visão de colonialismo vem do filme Uma Passagem para a Índia. Então o que vejo na minha imaginação é clubes de críquete nas favelas, colonizadores sendo puxados de riquixá pelas ruas estreitas das favelas usando ternos de linho branco e capacetes de exploradores na selva, tomando limonada e gim & tônica no clube de críquete e conversando com outros colonizadores, um ventilador de teto girando sem parar e um nativo abanando os colonizadores com um leque gigante.

Obviamente, o Estado brasileiro sendo o que é, não traria benefício algum para as favelas. Os colonizadores entrariam na favela, fariam pactos com os criminosos nativos e começariam eles mesmos a roubar até as roupas presas nos varais. Até os pregadores de roupa, imagino. Os nativos todos seriam taxados pesadamente sem ver nada em troca, e logo todo o comércio informal encolheria e morreria; o formal seria ainda mais desencorajado pelos impostos e regulações excessivas e ridículas, como é por todo esse país que vê o empreendedorismo com suspeita torpe de funcionário público e filho de funcionário público, ou de filhos ingratos de empreendedores, também; e as favelas, com a ajuda do Estado brasileiro, desceriam gostosamente mais alguns degraus em termos de degradação humana.

Seria praticamente o primeiro caso na história universal em que o colonizador deixaria o colonizado numa situação pior do que estava antes.

A verdade é que o que eu queria mesmo era que o Império Britânico dos séculos 19 e início do 20 colonizassem as nossas favelas. Eles sim resolveriam os problemas. Se fosse assim se Lord Kitchener, Lord Mountbatten e Cecil Rhodes viessem do passado para o presente e colonizassem a Rocinha, Vidigal etc. , os favelados brasileiros do futuro, como os indianos de hoje, seriam os CEOs das maiores empresas do mundo.

O Estado brasileiro, óbvio, não serve pra colonizador. Para colonizado, certamente, mas isso é outro sonho meu.

Antes de o Estado colonizar qualquer coisa ele precisaria colonizar a si mesmo, e trazer alguma civilização para Brasília. Coloniza-te a ti mesmo, Estado brasileiro.

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