REUTERS/Jianan YuZona Franca de Manaus: tratamento diferenciado tira o poder competitivo dos produtos do Sul e Sudeste

Reforma tributária: agora vai?

Texto passa pela Câmara, mas gargalos ainda precisam ser dirimidos para que também possa ser aprovado pelo Senado
07.07.23

Após 40 anos de idas e vindas, finalmente o Congresso deu o primeiro passo para instituir a tão sonhada reforma tributária. Por 382 votos a 118, com três abstenções, os deputados aprovaram na noite desta quinta-feira (6) o texto em primeiro turno. O segundo turno ocorreu na mesma noite e a proposta passou com o placar de 375 a 113.

A aprovação da PEC 45 foi uma vitória do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), no período em que ele se vê acossado pela investigação da Polícia Federal que mira desvios de recursos na aquisição de kits de robótica em Alagoas. Aliados de Lira ficaram aliviados com a decisão do ministro do STF Gilmar Mendes ao paralisar a investigação em curso. Mendes entendeu que o caso precisa de um aval do próprio STF para ter seguimento. Com a suspensão do inquérito e a aprovação da reforma, Lira retomou fôlego, segundo dizem parlamentares aliados do presidente da Câmara.

De outro lado, a votação foi vista como uma derrota de Jair Bolsonaro, que trabalhou contra o texto. As investidas do ex-presidente contra o texto irritaram o presidente da Câmara e a algumas pessoas próximas dele, conforme apurou Crusoé. Lira disse que a bancada do PL na Câmara agora está “só”, indicando que ele não pretende mais interferir para salvar parlamentares da sigla que venham a ser acossados pelo STF ou mesmo pelo Conselho de Ética da Câmara. No PL, os deputados que votaram a favor do texto são aqueles do chamado “Centrão raiz”, como o presidente da bancada paulista da Câmara, Antonio Carlos Rodrigues, ou o ex-líder do partido Wellington Roberto.

O União Brasil também ganhou o que precisava. O partido entregou os votos ao governo e, finalmente, teve a confirmação de que comandará o Ministério do Turismo. Mas, antes de votar, o partido ameaçou se manifestar contrário ao texto. No final, apenas 11 deputados do União mantiveram sua posição contra a reforma.

A versão da reforma tributária que foi aprovada em primeiro turno está em tramitação desde 2019. O texto, de autoria do presidente do MDB, Baleia Rossi, ficou quase dois meses na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e depois vagou por aproximadamente dois anos em uma comissão especial sobre o tema. Foram 101 sessões para debater o texto, até que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) resolveu evocar o texto diretamente para plenário. Somente na comissão especial, o parecer recebeu 219 emendas.

Em 2023, já com a nova legislatura, Lira instituiu um grupo de trabalho (GT) para compor um parecer. Até então, governadores, prefeitos, e determinados setores da economia preferiram atuar com seus lobistas de sempre e evitar maiores pressões contra o texto. Uma oposição mais dura explodiu, no entanto,  há aproximadamente dez dias, quando Lira finalmente resolveu colocar a questão em votação no plenário da Câmara.

Apesar de vários ajustes e de ele ter sido aprovado pela Câmara, há ainda alguns gargalos a serem resolvidos e que devem ser dirimidos no Senado, conforme apurou Crusoé. Por essa razão, a expectativa, em um primeiro momento, é que o texto por lá seja aprovado, na melhor das hipóteses, no final do segundo semestre.

Pacheco já disse a aliados que não pretende fazer discussões açodadas. Nada de pedido de urgência ou de pedaladas regimentais para acelerar a tramitação. A expectativa é que a matéria seja antes debatida pelo menos pelas Comissões de Constituição e Justiça e de Assuntos Econômicos até chegar a plenário.

Algumas dúvidas tocam os fundamentos da reforma. O texto não deixa claro como serão estabelecidas (ou recompensadas) as renúncias fiscais, não apresenta projeções de arrecadação por parte da União e há uma dependência de leis complementares para que o novo sistema passe de fato a valer. Um exemplo: está previsto que as alíquotas de referência do IBS e CBS serão revistas anualmente pelo Senado, mas os parâmetros serão fixados em uma lei futura. Outro detalhe importante: a reforma tributária cria isenção para produtos da cesta básica, mas outro documento legal definirá quais alimentos terão direito ao benefício.

Representantes do setor de comércio e serviços argumentam que o substitutivo aprovado não resolve o problema da cumulatividade ampla – cobrança em cima de outras cobranças. Há receio de que a carga tributária para o setor – hoje responsável por 70% dos novos empregos no Brasil – possa aumentar.

A reforma tributária tem de assegurar a competitividade das empresas brasileiras, reduzindo a burocracia e simplificando as operações. É fundamental garantir que, de fato, tenhamos essa evolução do sistema. Digo isso porque há uma grande preocupação do setor de serviços em não ser mais onerado e de não ter uma ampliação de suas obrigações acessórias”, diz o vice-presidente da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil, Anderson Trautman Cardoso.

Outro ponto polêmico diz respeito à Zona Franca de Manaus e áreas do Centro-Oeste que recebem incentivos fiscais. Os senadores amazonenses, entre os quais Omar Aziz (PSD), um dos principais aliados de Lula, vão pressionar por alterações no texto para deixar mais claro quais são os benefícios fiscais da região.

Virou uma salada. No que diz respeito à Zona Franca, eles dizem sempre que os seus direitos estão garantidos. Ora, se está na Constituição está garantido. Mas a gente quer ouvir é que eles não vão mexer nas nossas vantagens em relação a outros mercados, especialmente do Sudeste. Do jeito que está, eu não voto a favor da reforma”, diz o senador Plínio Valério (PSDB-AM).

Do outro lado, integrantes de estados do Sudeste e Sul reclamam que o tratamento diferenciado à Zona Franca de Manaus tira o poder competitivo dos produtos locais. O ponto deve gerar tensão entre as bancadas.

Uma reforma no emaranhado ininteligível do sistema tributário nacional atual é uma necessidade óbvia, mas a proposta aprovada pela Câmara dos Deputados está longe de atender todos os anseios de modernização e simplificação. Seu impacto sobre setores diversos da economia também parece incerto, assim como há pouca clareza sobre a distribuição da arrecadação, o sistema de créditos e descontos tributários nas cadeias produtivas e o funcionamento de regras para cashbacks. A prova disso é a ideia prevista na PEC de uma alíquota praticamente simbólica no início do processo de transição.

Mesmo que sejam feitos ajustes para contemplar os serviços e o comércio, os governos estaduais e as prefeituras, o que nos preocupa é a carga tributária que recairá sobre o cidadão. A classe trabalhadora, os mais vulneráveis e a classe média não aguentam mais tanto imposto. Sem estudo de impacto, é difícil aceitar a proposta do jeito que está. No Senado, vamos discutir essa matéria exaustivamente”, promete o senador Carlos Portinho, líder do PL na Casa. “Somos a favor da reforma, até mesmo da iniciada no governo passado. Mas essa carece de mais debate e análises.

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500
  1. Depois do PIX de $5bilhões aos nobilíssimos dasputadas e para "obras" na educação, saúde e segurança consagrando a nova democracia roubalística do galinheiro me sobrou a alternaticva de cmprar e rápido xilocaína anestésica que meu rabo já começa a arder e certamente o dos manés em seguida.

  2. A reforma é complexa, nebulosa e mal discutida. Não poderia nunca ter sido votada. Tendo em conta que o Lira fez valer, como hábito, a tratorada, deveria ter sido rejeitada. Mas 2Bi faz uma bela diferença né? E o Brasil? Ele que se fod@.

  3. O atropelo dado ao assunto vai resultar em mais tributação e uma concentração de poder sobre a administração dos tributos nas mãos dos ptralhas o que é extremamente nocivo para os estados e municípios.

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