Ricardo Stuckert / PRO presidente no Sul: poucas vezes a manipulação política do STF se mostrou tão descortinada para as pessoas

Lulismo sem filtros

Petista reforça controle presidencial na Petrobras, no Banco Central, no Congresso e no Rio Grande do Sul, com envio de seu preposto
16.05.24

As placas tectônicas da política brasileira se movimentaram mais uma vez. Uma combinação de movimentos políticos ampliou a ocupação de espaços por parte de Lula, redobrando a aposta na sua capacidade pessoal de influenciar nas decisões econômicas. O lulismo está se apresentando sem filtros nem intermediários.

Intervenção direta na Petrobras, divisão do Banco Central, operacionalização do STF para dobrar o Congresso Nacional, criação de um canal direto entre Lula e os presidentes da Câmara e do Senado e nomeação de um preposto no Rio Grande do Sul para coordenar esforços de reconstrução do Estado. Todos esses movimentos colaboram para um reforço do controle presidencial sobre o processo decisório.

No caso da estatal petroleira, a troca do presidente – de um político, Jean Paul Prates, para uma burocrata, Magda Chambriard – tem o objetivo declarado de usar a estatal para turbinar o plano de investimentos do governo já anunciados na nova versão do PAC. Trata-se de uma vitória do ministro da Casa Civil, Rui Costa, e da ideia de que crescimento econômico deve ocorrer por meio de obras e intervenção estatal e não pela melhoria do ambiente macro.

A reunião do Copom mostrou uma divisão entre diretores nomeados antes e após Lula e alimentou a expectativa negativa de que decisões mais frouxas de combate à inflação tomarão assento quando Campos Neto passar a bola para o seu sucessor no final do ano. Embora tenha havido um esforço de comunicação posterior, para montar uma operação de “parece, mas não é”, o fato é que o estrago foi feito e há desconfiança quanto à atuação futura do Banco Central que, diga-se de passagem, é a principal âncora de credibilidade do país diante dos investidores atualmente.

O terceiro movimento, o mais grave, foi a instrumentalização do STF para forçar o Congresso a reconsiderar a decisão de desoneração de setores da economia. Em português coloquial, o governo, ao acionar o Judiciário para declarar a inconstitucionalidade da medida, colocou uma arma na cabeça dos parlamentares e dos empresários e disse “ou reabre a negociação ou eu atiro”.

Congresso e empresários chegaram a um novo acordo, chancelado pelo ministro Fernando Haddad, e o governo pediu ao STF para suspender a ação. A questão que fica é se, afinal, a lei de desoneração é inconstitucional ou não ou se a ação foi apenas uma manobra política da qual os ministros toparam participar para pressionar um novo resultado. Se o segundo cenário for o correto, como está se anunciando, poucas vezes a manipulação política da Corte se mostrou tão descortinada para as pessoas.

O penúltimo evento foi a instalação de um canal direto entre Lula e os presidentes Arthur Lira e Rodrigo Pacheco para solucionar negociações em torno de vetos e outras discordâncias entre o Executivo e o Legislativo. Ao dispensar intermediários, Lula demonstra impaciência com o ritmo da pauta do governo no Congresso – depois manifestada em críticas indiretas feitas aos dois por não o acompanharem na sua terceira viagem para o Rio Grande do Sul.

Se Lula quer se envolver diretamente em negociações de votações, deve estar alerta para o fato de que não poderá mais terceirizar a culpa quando acordos forem descumpridos. A partir desse ponto, qualquer crise entre Executivo e Legislativo ganha vulto muito maior do que em casos anteriores.

Por último, a criação do ministério extraordinário para centralizar ações do governo federal no Rio Grande do Sul é, institucionalmente falando, uma situação nova. O papel que será desempenhado pelo ex-ministro da Secom, Paulo Pimenta, que é gaúcho, se parece com o de um interventor. Mas, na prática, está mais ligado ao de um embaixador de Lula no estado porque não tem orçamento próprio e nem caneta para ditar regras. A Medida Provisória editada que criou a pasta define que despesas terão que ser feitas com dotações de outros órgãos da administração pública (direta e indireta).

Além disso, Pimenta não terá competências nem autoridade específica definida, como acontece, por exemplo, quando há intervenções de segurança pública. Se o ministro quiser realizar obras, terá que ser com recursos de outras pastas ou dos governos do estado e dos prefeitos. Se quiser coordenar programas de resgate da economia, idem. Portanto, ele é mais preposto do que interventor com o objetivo de mediar o acesso de políticos e organizações locais e o Orçamento federal e trazer o crédito de reputação da reconstrução do estado para Lula.

Se, no conjunto, os movimentos parecem uma grande reunião de recursos para consolidar uma posição de hegemonia e de domínio sobre o processo decisório, por outro revela muitas fragilidades no sentido em que ocorre de forma improvisada, por meio de puxadinhos institucionais e expondo o presidente a situações de risco, como é o caso de ter se amarrado a Paulo Pimenta na gestão da crise humanitária do Rio Grande do Sul. Há um enorme voluntarismo e pouca disposição para reconhecer limites nesse lulismo reforçado que está sendo instalado no país.

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