Marcelo Camargo / Agência Brasil

Vistos: nem toda recíproca é verdadeira 

Impor mais obstáculos aos turistas de nações com alto poder aquisitivo parece contraditório com os interesses de fomentar o turismo e a economia do país
09.02.24

Em 2019, o presidente Jair Bolsonaro retirou a obrigatoriedade de visto de turismo para viajantes provenientes dos EUA, Austrália, Canadá e Japão que viesse ao Brasil. Na época, essa medida causou certo desconforto nacional, uma vez que não houve uma reciprocidade imediata por parte desses países, ou seja, nenhum deles suspendeu a exigência de visto para os brasileiros naquele momento.

No entanto, além de considerações pessoais ou diplomáticas, é crucial analisar os resultados concretos dessa medida. Um ano após a implementação da flexibilização, observou-se um aumento significativo de 15,73% no número de visitantes americanos, canadenses, australianos e japoneses ao Brasil. Segundo dados do Ministério do Turismo, esse incremento gerou um acréscimo de 450 milhões de reais na economia brasileira em apenas um ano.

O Brasil, situado distante do epicentro do poder global no hemisfério norte, enfrenta desafios significativos na atração de turistas com alto poder aquisitivo. A distância geográfica não é o único obstáculo; a infraestrutura de transporte doméstico também apresenta dificuldades. Em um país de dimensões continentais como o nosso, viajar das metrópoles para destinos remotos, como a Amazônia, pode ser tão caro quanto uma viagem para a Europa ou América do Norte.

Segundo a Organização Mundial do Turismo, medidas que facilitam as viagens podem aumentar o fluxo de turistas entre os países em até 25%. Embora a ausência de reciprocidade possa ferir o orgulho nacional, não se justifica a sua reversão. Pelo contrário, é papel do Brasil, por meio da diplomacia, buscar a reciprocidade e a facilitação da entrada de turistas brasileiros em outros países. O recente exemplo da decisão do Japão, que removeu a exigência de visto para cidadãos brasileiros em setembro de 2023, após extensas negociações, é uma demonstração clara disso.

Não à toa, a reinstituição da exigência de vistos tem sido constantemente adiada pelo presidente Lula. Inicialmente programada para outubro de 2023, passou para janeiro de 2024, e hoje está prevista para abril deste ano. Os motivos desses adiamentos consecutivos são evidentes: impor obstáculos aos turistas durante as maiores festividades brasileiras, como Ano Novo e Carnaval, afetaria drasticamente o setor de turismo. Agora, a nova política está agendada para depois da Páscoa, caso seja implementada de fato.

Considerando a distância geográfica entre o Brasil e os países mencionados, impor mais obstáculos aos turistas de nações com alto poder aquisitivo parece contraditório com os interesses de fomentar o turismo e a economia do país. Em vez disso, seria mais sensato adotar políticas que facilitem a entrada de visitantes estrangeiros, promovendo o desenvolvimento do setor turístico e fortalecendo os laços internacionais. Assim, quem sabe um dia o passaporte brasileiro será suficiente para ingressar em qualquer país do mundo.

 

Izabela Patriota é advogada e diretora de Relações Internacionais no LOLA Brasil

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