ReproduçãoSargento Roger Dias, que foi morto por um detento beneficiado pela saída temporária

Saidinha para bandido, regime fechado para a sociedade

É inconcebível que assassinos sejam liberados ao convívio social simplesmente porque progrediram de regime
19.01.24

No dia 8 de janeiro, milhões de brasileiros manifestaram toda sua indignação e revolta. Antes que você pense que se trata dos “ataques à democracia” tão fervorosamente presente nos discursos da esquerda, não! Milhões de brasileiros que vivem a vida real e não a dos gibis que ilustram a narrativa petista se revoltaram com a morte de um policial militar em Belo Horizonte. Ele foi assassinado com tiros na cabeça dados por um detento que estava em saída temporária — comumente denominada “saidinha de Natal”.

A morte de um trabalhador que escolheu proteger a sociedade como ofício evidencia que a nossa legislação processual criminal é falha e ultrapassada, o que costuma ser fatal para a população. A repercussão do caso merece uma reflexão profunda sobre o sistema nocivo ao qual a população brasileira está submetida.

Em primeiro lugar, cumpre esclarecer a diferença entre as regras dos regimes fechado, semiaberto e aberto.

No regime fechado, o condenado cumpre a pena dentro da prisão sem direito a saídas. No regime semiaberto, o trabalho externo é admissível, bem como a frequência a cursos supletivos, profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior. No aberto, o condenado pode trabalhar, frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada em ambiente externo e sem vigilância, permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga.

O Código Penal brasileiro adotou a Teoria Mista para determinar os objetivos da imposição de pena no Brasil. Segundo essa teoria, a pena teria por objetivos a punição e a prevenção. A punição, por óbvio, é uma competência privativa do Estado em castigar o indivíduo que descumpre a lei penal, privando-o de sua liberdade.

Já a prevenção pode ser entendida por duas perspectivas. A primeira, como uma sinalização para a sociedade na totalidade, mostrando as consequências de se descumprir a lei. A segunda, como uma indicação para o infrator, para que ele não cometa crimes no futuro. Junto a esse entendimento, conclui-se que a restrição da liberdade tem um objetivo final: a ressocialização do criminoso.

Diante dessa visão, as saídas temporárias nada mais são do que etapas da ressocialização de um criminoso. A ideia é colocar o preso para participar de atividades do convívio social, até que ele esteja apto a voltar para a sociedade.

Segundo a Lei de Execuções Penais, “os condenados que cumprem pena em regime semiaberto poderão obter autorização para saída temporária do estabelecimento, sem vigilância direta“. Existem vários requisitos, como, por exemplo, comportamento adequado e cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena, se o condenado for primário, e 1/4 (um quarto), se reincidente. Vale lembrar que a decisão judicial leva em consideração um parecer do Ministério Público e um da administração penitenciária.

Na teoria, toda política pública pode parecer louvável e efetiva. Entretanto, a adoção e a manutenção de políticas públicas exigem uma análise de resultados, dados e estatísticas, e não meramente uma análise de intenções e projeções.

A saída temporária tornou-se um benefício absolutamente nocivo e cruel para a população, por inúmeros motivos. O primeiro deles diz respeito ao sistema carcerário que, para além da superlotação, é uma escola de criminalidade, já que é dominado por facções criminosas. Não existe ressocialização no Brasil. O que existe é aprimoramento de bandido para cometer novos crimes na primeira oportunidade de se ausentar do sistema prisional. Ser preso é como estar seguro e ainda fazer uma pós-graduação no submundo do crime.

Os casos de bandidos que foram soltos pelo benefício da saída temporária — sem nenhuma vigilância direta — e cometeram crimes horas ou dias depois de serem liberados estão tornando-se cada vez mais recorrentes. Os casos de criminosos que não retornam ao sistema prisional também estão se tornando mais frequentes. É inconcebível que assassinos sejam liberados ao convívio social simplesmente porque progrediram de regime. Ao fazer isso, o Estado está colocando toda a população em risco e sacrificando vidas em prol da liberdade de criminosos condenados. Lugar de condenado é no sistema prisional do início até o fim da pena imposta em sentença condenatória. Essa deve ser a regra.

Infelizmente, o sargento Roger Dias, morto em Belo Horizonte, não foi a única vítima. Em Santa Catarina, um jovem foi assassinado com golpes de madeira na cabeça por um bandido em saída temporária. No Distrito Federal, uma mulher foi executada pelo ex-namorado que havia sido um dos presos beneficiados no Saidão de Natal. Esses são apenas alguns exemplos de vítimas do sistema penal brasileiro, ineficiente e fatal.

Até quando vamos ser reféns dessa prática? Até quando viveremos em pânico e acuados enquanto os bandidos esperam pelas saidinhas para, uma vez mais, cometer crimes e aterrorizar a sociedade? É urgente discutirmos o PL 2253/2022 no Senado Federal, que propõe dar um fim à excrescência que é a saidinha.

 

Letícia Barros é advogada, empreendedora e vice-presidente do LOLA Brasil

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  1. Quem vota as leis não está à mercê do bandido comum, mas vislumbra o dia que, sendo pego, tenha direito as suas próprias saidinhas e às mudanças de regime e evolução de pena. Sempre em benefício próprio, que se dane o cidadão

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