PetrobrasUnidade da Petrobras: estatal está saudável e militância deve avançar

Crédito, PIB modesto e austeridade fingida

Jogamos os búzios para ver o que este ano reserva para a economia brasileira e mundial. E como isso afeta você
12.01.24

Poucas coisas tornaram-se tão banais quanto previsões erradas na economia. No Brasil dos últimos anos, prever com exatidão o que irá ocorrer tem sido ainda mais difícil. E existem algumas razões para isso.

A primeira e mais óbvia delas reside no fato de que o país adotou uma série de reformas. Essas reformas vão desde a reformulação da legislação trabalhista, que já mostra seus impactos na queda expressiva do desemprego pós-pandemia, aos marcos regulatórios, que destravaram dezenas de bilhões em investimentos.

Outras reformas são silenciosas, mas tão ou mais expressivas. Uma delas reside nos chamados CRAs, os Certificados de Recebíveis Agrícolas. Os CRAs, somados aos Fiagros e LCAs, que financiam o agro, saíram de 145 bilhões de reais em 2020 para 512 bilhões de reais em 2023. Na prática, este resultado joga centenas de bilhões em um setor altamente produtivo e que, sem surpresa, colaborou para o crescimento do PIB em 2023.

Antes de entender o que se vislumbra para 2024, porém, convém relembrar as previsões que fiz aqui em dezembro de 2022, com Erros e Acertos. Segue:

 

A economia deve crescer menos, não só no Brasil. (Errado)
Aqui, eu imaginava um cenário onde a recessão americana finalmente se concretizaria. Não rolou. Os EUA impulsionados por gastos públicos, e o Brasil pelo agro, cresceram bem.

A inflação ainda será um desafio (Errado)
Pode-se dizer que a inflação é sempre um desafio, mas os bons resultados na balança comercial, com mais exportações do agro e menos importações (preocupante), derrubaram o dólar, tornando a inflação algo tranquilo neste ano.

Aumento de impostos pelo governo federal e pelos governadores (Certo)
2024 mal começou e o seu ICMS possivelmente já subiu. O último ano foi marcado por imposto atrás de imposto, em uma tentativa desesperada de manter a arrecadação extraordinária de 2021 e 2022.

Um cabo de guerra entre o governo e o Banco Central (Certo)
Pode-se dizer que era previsível. Temos os maiores juros do mundo e um governo que acredita que podemos ficar ricos gastando, e não poupando. Era uma guerra óbvia.

Por fim, a mais óbvia:

Mudança de rumo nas estatais (Certo)
De volta ao déficit e a pressão para que estatais aumentem investimentos. Também algo previsível.

Como você pode ver, o contexto ajuda, mas as boas safras não são lá tão previsíveis.

Como dizem os economistas, o problema é sempre das “externalidades”, ou em resumo: algo que não estava previsto.

Mas sem mais enrolação, segue um breve resumo do que você pode esperar para a economia brasileira em 2024:

 

1. Crédito, crédito e mais crédito
Em um modelo desenvolvimentista, como o defendido pelo atual governo, o crédito é a “alma do negócio”. Em suma, o Partido dos Trabalhadores defende que estimulando o consumo, teremos em seguida um estímulo à produção.

Trata-se de algo politicamente fantástico. Qualquer ser humano prefere o prazer de consumir do que o esforço de poupar.

Na prática, porém, isto seria o mesmo que um nutricionista lhe recomendar uma dieta para emagrecer que inclua pizza no café da manhã: desenvolver um país através do gasto é como emagrecer comendo. Não é assim que as coisas funcionam.

Por um tempo, entretanto, o efeito do crédito estimula o crescimento. E o crescimento da economia é a melhor forma de o governo provar que o modelo de reformas e austeridade não era bom para o país.

Isso nos leva a uma expansão ainda maior do crédito em bancos como Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e BNDES em 2024.

 

2. Um PIB modesto e investimento ainda preocupante
Um estudo ainda em construção no Ministério do Planejamento (comandado por Simone Tebet), aponta que o Brasil passou por uma mudança estrutural nos últimos anos.

Segundo este estudo, e o que se sabe preliminarmente, o Brasil saiu de um crescimento estrutural de 1% para algo entre 2 e 2,5% ao ano. Pode parecer pouco, mas convém lembrar que um PIB de 2% dobra a cada 36 anos, enquanto um PIB de 1% ao ano leva 7 décadas para dobrar. Como o Brasil precisa quadruplicar seu PIB para chegar em resultados mínimos em termos de bem-estar, este avanço em poucos anos é bem-vindo.

Segundo o Ministério, em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, o aumento no PIB estrutural se deve às sucessivas reformas. É irônico, portanto, que inúmeros ministros do atual governo atuem para demonizar tais reformas.

Dependemos cada vez mais de confiança para garantir investimentos, que estão na casa de 16% do PIB. Como o ponto 1 sugere, o governo forçará um aumento do crédito.

Se isto será suficiente para compensar o pessimismo dos investidores, é difícil dizer. O mais provável é que o investimento siga modesto.

E como já vimos acontecer com Dilma, o crédito abundante resultado em investimentos pouco produtivos, que por sua vez decepcionam no PIB.

 

3. O governo finge que pratica austeridade e o mercado finge que acredita
A tabelinha Haddad-Lindbergh Farias já se mostrou ativa nas últimas semanas do último ano. O parlamentar militante foi à imprensa denunciar que ele, e o partido, não vêem com bons olhos a ideia de Haddad de perseguir um déficit zero em 2024. Na prática, Lindbergh fortalece Haddad ao mostrar que há coisa muito pior em termos de responsabilidade no Partido dos Trabalhadores.

A luta por um déficit zero faz sentido, tendo em vista que o governo possui dívidas de 7,3 trilhões de reais, o equivalente a 30% da riqueza nacional (o “total wealth”). Isto significa que o Brasil precisa despender anualmente uma porção relevante da sua poupança, hoje na casa de 16% do PIB, para que o governo continue a rolar sua dívida. Ao promover um déficit zero, o governo indica que irá demandar menos recursos para se financiar no futuro, e é premiado com uma redução dos juros, o preço do dinheiro.

Em 2024, a expectativa é de que ao ver o governo gastando, categorias do funcionalismo devem pressionar por aumentos. Será difícil promover cortes em universidades enquanto se destina 25 bilhões de reais para emendas parlamentares “não transparentes” (o novo orçamento secreto).

Para chegar a um déficit zero em 2024, o governo precisa encontrar renda extra de R$168 bilhões. Ele de fato pode apostar no jogo do tigrinho, com taxação, mas é difícil que se consiga obter estes recursos uma vez que isto implicaria, por exemplo, forçar aumentos de dividendos de estatais. O que nos leva ao próximo ponto.

 

4. A volta dos que não foram: as estatais continuam saudáveis e isso anima a militância para avançar
Muito se falou em 2023 sobre o retorno dos déficits em estatais, com gráficos apontando que as chamadas “estatais dependentes” voltaram ao vermelho. O problema, claro, é que essas estatais são bem pouco representativas do total geral.

Na prática, a Petrobras continua saudável, e a estatal, que representa 10% do PIB nacional, gera em lucros valores dezenas de vezes maiores que os eventuais prejuízos de empresas como Valec e companhia.

Em 2024, é a vez de os sindicatos retomarem seu protagonismo. A FUP, Federação dos Petroleiros, já se movimenta para questionar privatizações e desinvestimentos passados. É provável que a gestão de Jean Paul Prates vá segurar e manter as vendas de casos como o da RLAM, na Bahia, estado governado pelo PT. O motivo, claro, é político. A RLAM foi comprada pela Mubadala, a gestora de Abu Dhabi. Reestatizar a empresa seria um tiro no pé, diplomático e de sinalização aos investidores. O ganho potencial, de aumentar a margem da Petrobras em 1 ou 2%, é irrelevante.

Ter uma refinaria privatizada, porém, mantém viva a narrativa da militância. Comparações entre o preço do botijão de gás na Bahia e no resto do Brasil, continuarão a poluir as discussões, como prova cabal de que o modelo estatal é melhor do que o privado.

O ano de 2024 marcará, sem sombra de dúvidas, um aumento da pressão de alas ideológicas sobre as estatais.

Convém ficar de olho especialmente em Itaipu. Em 2023, a empresa zerou a dívida de construção, que durou 50 anos, e agora está com US$2 bilhões por ano para “gastar”, ou investir.

Felipe Hermes é jornalista

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  1. A mesma política que fracassou no primeiro ciclo do PT fracassará agora também, obvia e infelizmente PS: não foi Itaipu que financiou uma palestra ridícula descendo a lenha na lava-jato?

  2. Acho que só dá para prever exatamente é que sempre que entra um presidente populista, mais as maquiagens podem servir para manter a beleza externa, e esconder os remendos que não levam a lugar algum. Sempre prontos para esgarçar e estourar.

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