Foto: Tomaz Silva/Agência BrasilLula no evento de lançamento do "Novo PAC", no Rio; até agora, o que seu governo apresentou não justifica otimismo

Há razão para ser otimista com o modelo econômico lulista?

Embora a agenda de Lula seja conhecida, há muita intenção para pouca capacidade de execução; risco é repetirmos a experiência Dilma Rousseff
18.08.23

Após um semestre de governo, já é possível montar o mapa de risco do terceiro governo Lula e, consequentemente, definir seus pontos fortes e fracos do ponto de vista do desenvolvimento econômico, além de traçar um roteiro de monitoramento. O modelo aplicado é construído a partir da listagem das principais iniciativas macro apresentadas até aqui e da sua avaliação segundo dois parâmetros: seu potencial de impacto (+ ou – positivo) e seu potencial de execução, que envolve variáveis de suporte político, capacidade de gestão e credibilidade.

A fórmula que está sendo aplicada pelo governo Lula é bem conhecida: (i) plano de investimentos com forte orientação estatal, (ii) estímulo ao consumo por meio de políticas distributivas e subsídios à indústria e (iii) equilíbrio fiscal construído a partir do aumento da arrecadação. A novidade é uma (iv) perspectiva de melhoria do ambiente de negócios via reforma tributária gestada pelo Congresso e (v) um plano de transição ecológica da economia que, segundo declarações do governo, deve reorganizar o processo produtivo, mas que ainda não foi apresentado.

No papel, o potencial de benefício da economia do pacote de investimentos precisa ser analisado sob o prisma do potencial de ganhos de produtividade, algo que o próprio governo não fez. Uma leitura do Novo PAC revela que a preocupação principal foi fazer volume e, para isso, se percebe claramente que o plano foi elaborar de acordo com a fonte de financiamento disponível. As iniciativas que vão contar com recursos efetivos do Orçamento correspondem a 23% do que foi anunciado. O restante (77%) está distribuído entre Parcerias Público-Privadas (36%), estatais (20%) e financiamentos (20%). Nesta última categoria entram, por exemplo, recursos da Caixa que serão emprestados a compradores de imóveis do Minha Casa, Minha Vida.

Passando para a variável “potencial de execução” é que os problemas se tornam mais evidentes. Primeiro, o governo ainda não tem fundos públicos garantidos para bancar sua parte do plano (a questão fiscal será abordada adiante). Segundo, há o clássico gargalo da gestão. De acordo com levantamento feito em 2022 pelo TCU, o país tem cerca de 8,6 mil obras paradas, o que equivale a 38,5% dos contratos pagos com recursos da União (uma taxa de ineficiência absurda). Dessas, 5.344 obras foram herdadas dos PACs 1 e 2. Por último, para que o setor privado cumpra sua parte, é necessário criar um ambiente de negócios favorável, algo pouco estimulado até agora. Pelo contrário, a ameaça de reverter a privatização da Eletrobras, mudanças na Lei do Saneamento para favorecer companhias públicas, a política de preços prejudicial às refinarias privadas exercida pela Petrobras e sinalização de aumento de impostos formam um conjunto de sinais pouco estimulantes.

A questão fiscal, importante para a confiança de investidores e para dar tração aos investimentos públicos, tem uma longa trajetória a percorrer. O governo recebeu um marco fiscal generoso do Congresso, que não obriga Lula a reduzir a relação dívida/PIB nos próximos quatro anos e que está muito perto de ser aprovado. O problema está na busca de equilíbrio exclusivamente pelo aumento de receitas. As metas de curto prazo provavelmente não serão cumpridas porque dependem da criação de impostos que nem sequer foram sugeridos ao Congresso e que devem enfrentar resistência. O governo resiste em falar de contenção de despesas e deve permanecer assim pelo menos durante 2024, quando haverá eleições municipais.

O estímulo ao consumo foi alvo de dois planos bem-sucedidos, a ampliação do Bolsa Família e o Desenrola, de renegociação de dívidas. A recuperação do emprego, o controle da inflação e o bom desempenho do PIB neste ano têm ajudado, mas os juros altos ainda são um tema que muito provavelmente não será solucionado até o Planalto melhorar o fiscal, que enfrenta as dificuldades descritas acima.

Em resumo, embora a agenda seja conhecida (a tal da transição ecológica não foi apresentada ainda), pode-se dizer que há muita intenção para pouca capacidade de execução. Há problema de credibilidade na relação com o setor privado, o que pode comprometer investimentos, os fundos públicos para tanto não estão garantidos e há pouca ou nenhuma disposição para trabalhar a despesa, o que dificulta o cumprimento de metas e, consequentemente, pode atrasar a redução de juros e o aquecimento do consumo. Tentar forçar caminhos sem trabalhar o contexto, como baixar a Selic na marra ou fazer contabilidade criativa, irá aproximar Lula cada vez mais da experiência Dilma Rousseff, que tinha um roteiro de governo muito parecido.

Petistas têm dito que dessa vez será diferente porque Lula tem capacidade política. Mas, na verdade, o que há de distinto entre as duas gestões até agora é a ausência de uma investigação de corrupção contra o governo e um ambiente externo favorável às exportações brasileiras. Ou seja, o bom momento de Lula é mais sorte do que juízo, como se diz. E, por definição, como sorte não entra na contabilidade de riscos políticos, pode-se dizer que ainda não é possível ter boas expectativas quanto aos resultados econômicos futuros do país.

 

Leonardo Barreto é doutor em ciência política pela UnB (Universidade de Brasília)

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  1. Não há evolução sustentável da renda familiar nem da riqueza nacional sem inovação, tecnologia e aumento de produtividade. O vício petista pelo crédito imediato e aposta no consumo como suporte principal do crescimento econômico não resultará nunca, como já vimos na depressão pós 1° mandato do presidiário.

  2. A possibilidade do Descondenado fazer algo de razoável no seu novo desgoverno é nenhuma. Vamos amargar mais uma derrocada com grande esforço para consertar toda a caca que os ptralhas vão fazer.

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