Foto: Reprodução/InstagramO craque argentino Lionel Messi com o uniforme do Inter Miami, time para o qual se transferiu nos EUA

O reinado americano de Lionel Messi

Ida do argentino para o Inter Miami, nos Estados Unidos, após ganhar a Copa do Mundo o aproxima ainda mais de Pelé, que foi para lá aos 34 anos
11.08.23

Os Estados Unidos da América foram criados para ser uma nação sem rei. “Nos primeiros tempos do mundo, de acordo com a cronologia das escrituras, não havia reis; e por isso não havia guerras; é o orgulho dos reis que confunde a humanidade”, escreve o pai fundador Thomas Paine em seu panfleto emancipatório Common Sense. Para não deixar dúvidas sobre a convicção de Paine acerca da importância da independência dos Estados Unidos da América, segue mais um trecho, sobre a distinção entre uma república e uma monarquia: “Assim como um homem que está ligado a uma prostituta é incapaz de escolher ou julgar uma esposa, qualquer preconceito em favor de uma constituição podre de governo nos impedirá de discernir uma boa”.

Ironicamente, foi nesse país que, há quase 50 anos, desembarcou Pelé, para estender seu reinado futebolístico e dar o pontapé inicial do futebol americano — ou dos EUA, para não confundir com a National Football League (NFL). Falecido no fim do ano passado, o Rei mostrou aos americanos o tamanho do futebol e, agora, cinco décadas depois, os herdeiros de Paine podem admirar com um pouco mais de noção do que está acontecendo os feitos de um novo monarca da bola.

Lionel Messi chegou com tudo nos Estados Unidos. É um aposentado exuberante na Flórida, estado-símbolo do descanso no país. Marcou sete gols em quatro jogos, e seu Inter Miami, que não ganhava havia seis partidas, não perdeu as últimas quatro, exatamente aquelas em que contou com o argentino em campo. É um início melhor do que ele teve no Barcelona e no PSG, o que não quer dizer muita coisa — a não ser que é impossível medir Messi pelos parâmetros normais.

A estreia do argentino reuniu num mesmo estádio David Beckham, que é um dos donos do Inter Miami, a ex-tenista Serena Williams e outro rei, LeBron James. Também compareceu Kim Kardashian, que disse ter jogado bola como goleira e atacante quando jovem. O destino de Messi é virar longa-metragem e, depois, seriado. Talvez uma série documental e, menos provável para o tímido atacante, um reality show.

Enfim, deixando a cera de lado: o fato é que a ida de Messi, aos 36 anos, para os Estados Unidos o aproxima ainda mais de Pelé, que foi aos 34. O maior jogador deste século já tinha dado um passo à frente de Cristiano Ronaldo ao liderar sua seleção ao título da Copa do Mundo — e também ultrapassou Maradona na competição argentina de melhor jogador, pela longevidade e regularidade de sua carreira. Não me parece possível igualá-lo a Pelé, que considero o melhor jogador para além da história, mas entendo quem hoje diz que Messi é o melhor de todos os tempos.

Não ter ido parar no futebol árabe ou chinês pode ser determinante para deixar essa impressão. Cada gol de Messi é exibido em alta definição por todos os ângulos imagináveis. Difícil é imaginar que isso tenha sido calculado. É muito mais fácil pensar que o argentino optou pela tranquilidade da família em detrimento dos petrodólares dos quais obviamente não precisa — Cristiano Ronaldo e Karim Benzema também não precisam, mas cada um sabe o tamanho do próprio bolso.

Aos americanos que porventura se incomodem com a figura de um rei, ainda que do futebol, fica o consolo de que nesse ambiente muito dificilmente a destreza futebolística — e consequentemente, o reinado — passam de pai para filho. “Uma das provas naturais mais fortes da loucura do direito hereditário nos reis é que a natureza o desaprova, caso contrário, ela não o transformaria em ridículo com tanta frequência, dando à humanidade um burro por um leão”, critica Paine. O histórico mostra que o mesmo se aplica ao que ocorre dentro do gramado. Que o diga o ex-goleiro Edinho, o herdeiro de Pelé que tentou em vão jogar bola

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  1. ...não sei como a instituição sueca nunca distinguiu Pelé com o premio Nobel da Paz. o Rei do Futebol foi para os EUA há 50 anos com a MISSÃO IMPOSSÍVEL, junto com Carlos Alberto Torres e Beckenbauer, de instalar lá o nosso futebol, esporte que derruba o significado pior das fronteiras entre países!

  2. Ótimo texto mas um País que se orgulha de ter tido 2 Reis, do Rock e do Pop, acha um canto para dividir o reinado do nosso Pelé com um gênio como o Messi, merece.

  3. Verdade pura. Moro aqui na FL e ele já é rei. Aliás, após a última copa os americaninhos descobriram o futebol e já lotam campinhos de treino, assim como já é há décadas no futebol feminino. Não duvidem que sejam campeões do mundo num futuro bem próximo.

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