Anna Rye/PexelsBrasil quer dar às redes sociais um poder de controle que elas não sabem como exercer

Você será censurado!

PL das Fake News pode não ser votado, mas seu espírito está muito vivo num país onde a liberdade de expressão rapidamente vai virando exceção
06.07.23

Na semana que passou, uma reportagem da Crusoé noticiou que foi suspensa a conta no Instagram da Associação das Emissoras de Rádio e Televisão do Estado de São Paulo (AESP). Tudo leva a crer que a plataforma tenha suspendido a conta em razão de uma simples nota em favor da liberdade de expressão. Parece esquisito, leitor? E é esquisito mesmo.

Acontece que em decorrência do recente pedido do Ministério Público Federal para que concessões da emissora Jovem Pan fossem canceladas, diversas entidades dos setores de rádio e TV, dentre as quais a AESP, demonstraram preocupação com o perigoso precedente. A nota da associação não trazia juízo de valor, adjetivações, nada. Mesmo assim, a Meta, dona do Instagram, entendeu que a entidade compartilhou conteúdo que violava sua política.

Walter Ceneviva, advogado da AESP, e a quem não apenas conheço como também prezo e admiro, foi ao ponto: “As redes sociais não têm mecanismos eficientes para separar o que seria um abuso de algo que é mera liberdade de opinião e expressão”.

Pois é, temos visto com frequência redes sociais trocarem os pés pelas mãos no gerenciamento do conteúdo de seus usuários. Se o grande receio do setor de comunicação é o avanço estatal sobre as escolhas editoriais de veículos, o grande receio dos usuários é o avanço das plataformas sobre sua liberdade de expressão. E se hoje é assim, imagine então com o PL2630/20, alcunhado como Projeto de Lei das Fake News, que pretende delegar às plataformas justamente o gerenciamento que demonstram todo dia serem incapazes de fazer.

Dou um exemplo: o artigo 11 e seguintes do PL 2630/20 atribui às plataformas o chamado “dever de cuidado”, transferindo a elas a obrigação de impedir a exposição de discursos que atentem contra o Estado democrático. Se o que é atentar contra o Estado democrático já é uma abstração e tanto na cabeça de nossos doutos juízes, imagine então na cabeça de lata dos robôs das plataformas.

De acordo com o PL, quando as plataformas permitirem a circulação de conteúdo considerado problemático serão severamente punidas, o que estimula, por óbvio, que optem por banir ou nem sequer distribuir conteúdos relacionados a temas potencialmente polêmicos, mesmo que lícitos, como no caso da nota da AESP.

Mesmo com o PL2630/20 fora da pauta do Congresso, a Folha de S.Paulo noticiou há alguns dias que o governo discute nos bastidores um plano B para regulação da internet antes da eleição de 2024. Segundo o jornal, o plano seria recuperar a proposta de regulação apresentada em outubro do ano passado pelo Tribunal Superior Eleitoral.

À época, analisei a proposta e tudo de problemático que mostrei existir no PL das Fake News aparece potencializado na proposta do TSE. Expressões abertas e passíveis de interpretação dúbia como “grave ameaça”, “conduta antidemocrática”, “fatos inverídicos”, abundam e são base para os ilícitos a serem expurgados pelas plataformas. De quebra, claro, se não retirarem ou não distribuírem conteúdos corretamente, as empresas serão punidas com severidade.

Com as opções que temos na mão, não há o que fazer: se correr o bicho pega, se ficar o bicho come.

Acostume-se, caro leitor, pois a censura moderna funciona assim: se você se expressar, será censurado. Faça o que fizer, escreva o que escrever, tenha o cuidado que tiver. Nada importa, nada basta. Censura virou a regra, deixou de ser exceção. Se o censor errar o alvo e acertar um dardo na sua testa, você que corra atrás para mostrar que focinho de porco não é tomada.

 

André Marsiglia Santos é advogado constitucionalista e professor. Pesquisa e atua em casos de censura judicial.

@marsiglia_andre

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  1. A VERDADE É QUE O COMUNISMO ESTÁ ESTENDENDO AS SUAS GARRAS E DESTRUINDO A DEMOCRACIA. É O COMEÇO DO FIM DA DEMOCRACIA E O COMEÇO DA DITADURA DE ESQUERDA. O QUE ME SURPREENDE É A POSIÇÃO DO MPF.

  2. E se não for censurado pela justiça será apedrejado pelos “puros” da nossa sociedade. Censura. Censura. Censura.

  3. O Governo se acha com direitos que não tem. Que tal se começarmos uma campanha pra os brasileiros sonegarem impostos? Não pode, é crime. Mas se o Governo faz o que quer nos dá o direito de fazer tb. Eu queria só saber o que eles fariam sem a entrada de grana, ninguém paga nada, nadinha de imposto. E aí? André, não dá pra escrever uma reportagem só com esse cenário, só no faz-de-conta? Estou curiosa. Ou mandariam te prender?

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