Adriano Machado/CrusoéRicardo Lewandowski: o ministro aposentado trabalha para indicar o sucessor

Da fornalha ao roque

Coibir as fake news sem extirpar os podres dos poderes da República insana e cega é enxugar gelo sob o sol a pino
04.05.23

Meus amigos, meus inimigos, a mentira é uma velha inimiga da civilização desde priscas eras sob barbárie. Não foi inventada pelo gabinete do ódio nem pelas fake news de cada átimo. O que não quer dizer que essa herança bruta deva ser preservada, como se fosse patrimônio histórico, peça de museu, ou testemunho sórdido da maldade desumana. Bem fez a Europa, que gerou Dante, Shakespeare e Churchill, mas deu força e poder a Hitler, Stalin e Mussolini. Seus descendentes resolveram, de bom grado, combater, não para destruir, que é impossível, mas reduzir seus dejetos malignos identificando-a e banindo-a da banalidade. Para uma pandemia mais atroz transformar de vez o gênero humano num bando de ratos de esgoto. O combate à banalidade do mal da mentira como arma política e discurso de propagação do negacionismo, do racismo e de outros gêneros satânicos há de ser permanente e sem trégua. Um compromisso civilizatório. Para tanto urge que a falsidade deixe de promover a propagação da irrealidade.

O Brasil precisa, sim, formatar um sistema jurídico capaz de punir os loroteiros de forma implacável. Na lei. A experiência maligna do predomínio da malquerença e da desinteligência, durante o ex-desgoverno Bolsonaro, não deve servir de pretexto para fantasiar o pecado com capa de virtude. O Brasil ficou sob o domínio de um bando de vândalos, que venderam venenos letais como a carocha da vacina matadora, que abateu 700 mil irmãos. A vingança instintiva precisa ser abolida, nunca esquecida. No século XXI, a ordem leiga do judiciário tenta, até agora com sucesso, evitar a investigação da venda de sentenças a traficantes pelo desembargador Cândido Artur Medeiros Ribeiro Filho com sua aposentadoria por invalidez por uma doença não designada em lei alguma. Essa patranha, lavrada em privilégio indesculpável, não resulta de fake news, mas merecia denúncia noticiada e criticada, como o anonimato criminoso dos pregadores do preconceito nos algoritmos da cibernética.

Urge punir os crimes cometidos contra a honra alheia por ganância ou ignorância. E os legisladores que conseguirem fazê-lo merecerão lugar de honra no panteão dos heróis da democracia. Mas não se pode aceitar tudo de homens públicos interessados apenas em assegurar suas vantagens e garantir a própria impunidade em nome da lei, da ordem e do progresso. Na calada da noite, os pais da pátria idolatrada, salve, salve, tornaram a lei contra a improbidade na gestão pública uma espécie de código permissivo que admite abusos escatológicos como o orçamento secreto e as vantagens imorais gozadas pela casta das cúpulas partidárias, dos governantes desonestos e dos magnatas marajás do desserviço público. Depois dos quatro anos do terrorista das bombas em quartéis e adutora na ponte de comando estes quatro meses e quatro dias se perderam em vingança, que, às vezes, chega a ser burlesca, do ex-sindicalista. Dilma Rousseff na presidência do Banco dos Brics, João Pedro Stédile numa comitiva de visita à ditadura fascista e escravocrata chinesa e as invasões do Movimento dos Sem Terra danificando laboratórios da Embrapa, orgulho da ciência de produzir alimentos num país de famintos, são evidências do desmazelo.

A regulamentação de hightechs por analfabetos, funcionais ou não, pode até vir a ser, e tomara que seja, um plantio de alvíssaras em terreno bem preparado para o cultivo. Ou a manutenção da tradição nacional do uso da metamorfose de um rei mítico, Sadim, Midas ao contrário, transformando ouro em fezes. Isso só veremos depois. Quando a votação houver terminado e seus efeitos se iniciarem. Mas se se mantiver a direção do perdão às devoluções bilionárias dos furtos frutos da corrupção, só empreiteiros corrupteiros se salvarão.

Há ainda a lembrar que nada será capaz de salvar o Brasil do desastre e da desonra se não for encontrada a poção milagrosa capaz de dar vergonha na cara a quem não tem, como lembrou o historiador Capistrano de Abreu, colega de seminário do padre Cícero Romão Batista. A ocupação da cadeira de Ricardo Lewandowski no Supremo Tribunal Federal é o retrato de que estamos cada vez mais longe disso. O aposentado, que rasurou a Constituição para beneficiar uma devota, dedica o tempo livre a indicar o substituto. Esse deverá ser o advogado do presidente, que, mesmo não sendo propriamente um herdeiro do saber de Ruy Barbosa, conseguiu o que nem juristas como Pontes de Miranda sequer tentaram. Pois levou o patrão de volta à poltrona de diretor, transportando-o da cela ao trono num piscar de olhos. Tal indicação, inscrita na fornalha do inferno, contudo, não se compara ao roque proposto por Dias Toffoli, que pretende obter de Rosa Weber vaga na Segunda Turma para ganhar do chefinho o perdão pela maldade de ter negado seu comparecimento ao enterro do irmão. Na ditadura, foi permitido a Lula sair do Dops para ir ao sepultamento da mãe. Resta questionar se os filhos da pátria, madrasta malvada, a seguirão no trajeto ao pó final.

 

José Nêumanne Pinto é jornalista, poeta e escritor

 

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  1. Artigo irretocável e ainda publicável. Com essa gente que levamos, ou foi levada, aos poderes (minúsculas propositais e proporcionais às suas estaturas), com essas gente, dizia eu, até quando nossas insatisfações e nossos sentimentos de vergonha poderão ser trazidos à tona?

  2. Dias Toffoli deixou um rastro de dejetos na AGU, era próximo aos Odebrecht, no TSE, acusado por Sérgio Cabral por ter vendido voto em julgamento para livrar 2 prefeitos de municípios de RJ e no STF (aceitou reforma em sua casa oferecida pela OAS, paralisou processos por 6 meses por uso de dados fornecidos pelo COAF). No julgamento do Mensalão e do Petrolão fez de tudo para livrar os acusados. Lula Ladrão deveria ser mais grato com este que sempre foi capacho dele e de todos os poderosos.

    1. Estamos encurralados, cercados de bandidos por todos os lados. Isso aqui é o fim do mundo. Salve-se quem puder.

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