Ricardo Stuckert/PRLula e Fernández, em Brasília: Fernando Haddad vai ajudar o vizinho nas negociações com o FMI

Caridade com o chapéu do contribuinte

Lula se reuniu com o presidente da Argentina, Alberto Fernández, para discutir o financiamento às exportações brasileiras. Seria a volta do fantasma do BNDES?
04.05.23

Lula se reuniu com o presidente da Argentina, Alberto Fernández, nesta semana. Sob um colapso econômico que o fez cancelar sua tentativa de reeleição em outubro, Fernández veio ao Brasil para conseguir empréstimos mensais de no mínimo 1,5 bilhão de dólares por um semestre, mas voltou sem dinheiro. Lula apenas prometeu que “fará todo e qualquer sacrifício para ajudar a Argentina” e, assim, fez ressurgir o fantasma do BNDES.

O que o governo discute é a liberação de linhas de crédito para a exportação. Bancos estatais, como o BNDES, mas também o BB e mesmo o New Development Bank, dos Brics, podem conceder empréstimos a empresas brasileiras para que comercializem seus produtos na Argentina. Quem pagaria essas operações financeiras seriam os importadores argentinos ou a Casa Rosada, a depender dos termos do financiamento.

A Argentina precisa desses empréstimos devido à sua situação econômica. O governo registrou uma inflação de 104,3% ao ano em março, a maior dos últimos 32 anos. Na cotação oficial, um real valia 23 pesos argentinos há um ano e, hoje, vale 45. No mercado informal, o real ultrapassa os 90 pesos — uma divergência alta, ou spread, entre a cotação oficial e a paralela não é um bom indicativo.

O país não possui quase nenhuma reserva internacional em moeda forte, como o dólar, para conter a inflação. Em tentativas desesperadas de evitar evasão, o governo criou mais de 15 cotações diferentes para usos específicos da moeda americana, como o “dólar Netflix“, para a assinatura de serviços de streaming. Não bastasse a carência estrutural, uma seca na safra de 2022-2023 custou 20 bilhões de dólares.

Sem dólares, os importadores argentinos têm acesso restrito ao mercado internacional. Portanto, as exportações brasileiras fomentadas seriam provavelmente comercializadas em pesos. E aí está o primeiro grande problema. Se a carência de reservas internacionais é motivo para a necessidade argentina de financiamento às exportações brasileiras, a decorrente volatilidade do peso é o principal impasse para essa operação.

Afinal, o uso da moeda argentina compromete a segurança do pagamento dos empréstimos. “É um risco adicional, porque o peso tende à desvalorização frente a qualquer moeda forte”, explica Renan Silva, professor de economia do Ibmec em Brasília. Ou seja, os exportadores brasileiros e o governo acumulariam uma moeda muito rejeitada, de pouca utilidade no comércio internacional e que poderia se desvalorizar em suas contas bancárias.

Atualmente, o BNDES já tem linhas de crédito para exportadores, em dólares. Os argentinos compram principalmente bens manufaturados, de maior valor agregado, principalmente do setor automotivo. De fato, o país foi o segundo que mais usufruiu das operações externas do BNDES na série histórica, entre 1998 e 2018. Atrás apenas dos americanos, os argentinos compraram exportações brasileiras que contaram com 3,5 bilhões de dólares em financiamento.

Mas esse tipo de operação carrega alguns traumas. O primeiro é com a possibilidade de corrupção, como a que envolveu a exportação de serviços de engenharia pelas empreiteiras, revelada pela Lava Jato. Além disso, existe sempre o risco de calote. A maior caloteira do BNDES é a Venezuela, que deixou de pagar 722 milhões de dólares. Mesmo com os indícios de que a economia chavista iria para o buraco, o banco seguiu sendo generoso com o governo bolivariano, que tinha boas relações com o PT. Ao final, a proximidade política acabou custando caro.

Outro erro, também relacionado à politização do banco, foi a negligência com as garantias, que deveriam servir para assegurar o risco desses investimentos. O BNDES aceitou charutos como garantia para o porto de Mariel em Cuba, segundo maior caloteiro do banco, com 250 milhões de dólares em inadimplência.

Essas operações acabam sendo ineficientes quando envolvem governos que gerem mal os recursos”, explica Silva. Então, como recomenda o economista, o ideal para a eventual linha de crédito é minimizar a participação da Casa Rosada nesses empréstimos, visto que, assim como outros governos na região, incluindo o brasileiro, ela tem pouca credibilidade em honrar suas dívidas.

O jornalista Diogo Schelp, que pesquisou os empréstimos à Venezuela, afirma que o financiamento público não é isento da lógica de mercado. “Não se pode fomentar a exportação pensando na amizade com Argentina. Mais importante seria prestar atenção na saúde financeira dos exportadores brasileiros e dos bancos estatais“, diz Schelp. “Tudo vai depender das garantias que o Brasil vai exigir”, acrescenta. Na Argentina, uma garantia segura usada por investidores estrangeiros, e mesmo pelos próprios argentinos, tem sido imóveis e terras.

A longo prazo, o sucesso desses eventuais investimentos estará sujeito à recuperação da economia da Argentina, que está em declínio desde 1920. A inflação e a escassez de reservas internacionais são apenas sintomas de má-gestão de diversos governos argentinos, com alto déficit nas contas públicas e incompetência no desenvolvimento da produtividade da economia formal do país. Lula precisa exigir de Fernández um plano de recuperação econômica. “Se a Argentina continuar nessa crise, o risco é elevado demais para esses empréstimos valerem a pena”, diz Silva.

Na tentativa de ajudar o amigo Fernández, o petista encarregou Fernando Haddad de articular uma negociação do país com os Brics e, sim, com o Fundo Monetário Internacional, o FMI, historicamente demonizado pelos peronistas. Acreditar que tudo isso vai dar certo seria muita ingenuidade ou miopia ideológica. O melhor seria ter prudência e priorizar os interesses nacionais, em vez de fazer caridade com o chapéu dos contribuintes brasileiros.

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  1. Um país com tantas carências econômicas e sociais como o Brasil, vem esse presidente chamado Lula, querer ajudar, mais uma vez, esses países vizinhos que não respeitam as regras das políticas fiscais dos seus países. Gastam sem critérios o dinheiro público com planos populistas.

  2. A incapacidade técnica, somada à ideologia esquerdista, dos argentinos levaram o país à bancarrota. Os dois defeitos são orientadores da corja ptralha que está no poder colocando nosso país rumo ao abismo.

  3. Ao PT não basta ser uma quadrilha incompetente, tem que ser burro também, já que insiste em repetir políticas que resultaram em descalabro no passado recente

  4. Cristina Kirchener tem um maravilhoso Hotel em El Calafate, por que ela não vende o imóvel e doa p/ os pobres? Eva Perón pegava o q era dos outros e fazia caridade. Cristina poderia inovar fazendo caridade com o "próprio" dinheiro roubado do povo argentino...Lula, vc não pode e não deve emprestar nosso dinheiro p/ os argentinos. Gostaria q fosse possível ajudar, mas nós também não temos! Lula, contrate o Malan + Arida + Gustavo Franco + alguns econom. brasileiros p resolverem a dívida argentina!

  5. A PICA RETA DA KICHNER SAQUEOU O PAÍS ,é dona- muitas propriedades ,A ARGENTINA ESTÁ NO BURACO ,o Brasil tem centenas de brasileiros sem teto ,sem comida e sem educação .O DINHEIRO DE NOSSOS IMPOSTOS NÃO DEVEM IR PARA COBRIR A FARRA DE KICHNER 🤮🤮

  6. Esse pilantra vai liberar de novo dinheiro do bndes pra os 'países amigos' (leia-se: comparsas)? Vagabundo, não é do salário dele que sai, aí ele vende até a mãe morta.

  7. Todo cuidado é pouco. Lula e sua megalomaníaca improvável ambição de ser agraciado com um prêmio Nobel antes de morrer cresce cada vez mais. O cara jura pra si próprio que é merecedor dessa distinção há décadas. Vai lá se sabe dos porquês dessa “viagem na maionese”. É um maluco de pedra. Por conta disso, voltar a ser um “meliante” solto sem estribeiras. O país pensante tem de ficar de olho nesse irresponsável.

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