Foto: Jaélcio Santana

O último suspiro dos sindicatos no Brasil

Entidades recorrem a artimanhas para fazer com que trabalhadores que não gostariam de contribuir continuem financiando suas atividades
11.08.23

No dia 28 de julho, filas quilométricas eram vistas em torno do quarteirão onde fica o Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Serviços de Saúde de São Paulo (SinSaudeSP), no centro da capital paulista. Quando os portões do sindicato foram fechados, sem que todas as pessoas fossem atendidas, houve confusão e a Polícia Militar chegou a ser acionada.

Tinha poucas pessoas para passar informação”, disse à Crusoé uma enfermeira que não quis se identificar. “Começaram a  entregar senhas e não tinha horário para terminar, mas aí fecharam a porta e quem estava do lado de fora chamou a polícia. Lá dentro, ficou todo mundo jogado pelo chão, dentro de um salão grande. Não tinha banheiro, não tinha água para beber, o lugar estava muito quente. Havia pessoas com problemas de locomoção, mas o elevador não podia ser utilizado. As pessoas precisavam ficar circulando pelas escadas. Fiquei cinco horas esperando para ser atendida.

Em 28 de julho, faltavam três dias para o fim do período de entrega da carta de oposição” — o documento por meio do qual os profissionais exerceriam o direito de não pagar a contribuição sindical definida pelo SinSaudeSP.

O prazo havia começado a contar dez dias antes, em 18 de julho. Quem quisesse protocolar a carta de oposição precisava comparecer pessoalmente ao SinSaudeSP, que interrompia o atendimento na hora do almoço. 

Desde que a reforma trabalhista foi aprovada, em 2017, boa parte dos sindicatos brasileiros recorre a esse tipo de artifício. Antes da reforma, as organizações recebiam, anualmente, um dia de salário dos trabalhadores, sem que os contribuintes pudessem se opor ao desconto. Com as mudanças, a  “contribuição sindical” foi substituída pela “contribuição assistencial” (também chamada “negocial”), que é facultativa. Uma convenção coletiva de trabalho (CCT) define a porcentagem a ser descontada do salário, a data em que ocorrerá o desconto e a data de início e encerramento da entrega da carta de oposição. Na prática, as decisões da convenção coletiva são tomadas pela fração dos trabalhadores que se engaja no movimento sindical. Os colegas que ignoram essas votações não costumam ter facilitada a possibilidade de fugir ao pagamento da contribuição assistencial.

A secretária-geral do Sindicato dos Enfermeiros do Estado de São Paulo, Solange Caetano, disse à Crusoé que “a reforma trabalhista foi bastante dura com os sindicatos porque terminou com a contribuição sindical, e é óbvio que eles tiveram de se adaptar, buscar formas de sobrevivência.”

Segundo ela, a arrecadação anual dos sindicatos de sua categoria caiu de R$ 4 milhões para menos de R$ 100 mil. Metaforicamente, a reforma trabalhista deixou os sindicatos “respirando por aparelhos”.

Uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) poderia desligar até mesmo essa UTI. No início da tramitação desse processo, em 2017, o ministro Gilmar Mendes, relator, afirmou a seguinte tese: “É inconstitucional a instituição, por acordo, convenção coletiva ou sentença normativa, de contribuições que se imponham compulsoriamente a empregados da categoria não sindicalizados”. Mas o risco parece ter sido afastado. Recentemente, Gilmar mudou seu voto, acatando argumentos do Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Curitiba (SMC) e do ministro Luís Roberto Barroso. Com isso, há agora no STF cinco votos pela constitucionalidade da contribuição assistencial (Barroso, Cármen Lúcia, Gilmar, Edson Fachin e Dias Toffoli), faltando apenas um para que ela seja sacramentada. A tramitação está paralisada devido a um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.

Questionada sobre a obrigatoriedade da entrega presencial da carta de contestação, Solange Caetano disse que o Sindicato dos Enfermeiros do Estado de São Paulo adota essa medida há anos, mas reconheceu que existem  alternativas. “Há convenções coletivas que autorizam a entrega por correio ou por e-mail”, diz ela. A gente utiliza esse período da entrega para tentar dialogar com os trabalhadores e explicar o que é convenção coletiva, para eles conheceram o sindicato e a nossa luta.” A secretária-geral alega que a entrega da carta é um momento em que se tenta sindicalizar os trabalhadores.

Segundo o advogado trabalhista Marcelo Sanchez Salvadore, é possível comprar briga com os sindicatos e proibir o desconto da contribuição assistencial por outros meios, mesmo quando a entrega presencial da carta de oposição está prevista. “Eles criam uma dificuldade porque, se você não manifestar a sua vontade, o valor será descontado”, diz ele. “Mas, se a oposição foi manifestada por qualquer caminho e houve um desconto, é legítimo pedir o dinheiro de volta.”

Antes da reforma trabalhista, a contribuição sindical alimentava estruturas bilionárias e poderosas. Esse tempo passou, felizmente. Mas a relação entre sindicatos e trabalhadores não se alterou na essência. Em vez de convencer os interessados de sua real utilidade, essas organizações agora recorrem a artimanhas para garantir que sua conta na UTI continuará sendo paga. 

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  1. Essa canalhada, essa cambada de vadios parasitas que pu-lula nesses guetos marginais institucionalizados do sindicalismo, deveria ser presa e devolver tudo o que roubaram dos espoliados, né mesmo????

  2. ACABOU A MAMATA. SINDICALISTAS SUGADORES DOS POBRES TRABALHADORES. SÓ ESTÃO LÁ PARA DEFENDER O POÓPRIO BOLSO.

  3. Paguei sindicato por muito tempo. Fui mais um iludido pela narrativa de defesa dos interesses dos trabalhadores contra empresas opressoras. Felizmente esse tempo acabou, mas restam alguns ajustes a serem feitos

  4. De "contribuição" obrigatória bastam os impostos. Já se sustenta vagabundos que cheguem com eles, não se pode obrigar a sustentar os vagabundos sindicalistas também

  5. Cambada de espertalhões que resistem e insistem em permanecer na vida fácil e luxuosa às custas do suado dinheiro dos trabalhadores… xô urubus!

  6. O sindicalismo é um câncer social. Sindicalista não vale o que defeca. Gente que não trabalha, não gosta de trabalhar e vive de engabelar os trabalhadores de suas bases.

  7. E pensar que um desses sindicalistas enganadores de gente humilde e trabalhadora está comandando o Brasil novamente

    1. Pior, um sindicalista que "vendia" greve para a indústria. Ou pagam ou eu libero a greve. "Assassinato de Reputações. Um Crime de Estado I e II" Romeu Tuma Jr. e Claudio Tognolli

  8. Bando de salafrários: não trabalham, dizem representar quem trabalha, e ainda metiam a mão e desviavam o dinheiro suado do trabalhador que nem era filiado! Por causa disso é que um vagabundo da pior espécie manda no país. Esses sindicatos já deveriam ter sido extintos há muito!

  9. O sindicato dos Jornalistas, por exemplo, não me representa. As opiniões deles sempre foram contrárias às minhas e, ainda assim, "roubavam" um dia de trabalho meu. Prefiro não contribuir.

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