Foto: Amanda Oliveira/Governo da BahiaAline Peixoto, a ex-primeira-dama da Bahia foi escolhida para cargo vitalício em tribunal de contas

Lula engole mosca e mulher de Rui chora

O PT não faz cerimônia; obedece ao Centrão, ocupa cargos de interesse público pelo critério da união conjugal e usa o próprio mau exemplo
10.03.23

O deputado Juscelino Filho (União Brasil/Maranhão) foi pilhado em vôo oficial da Força Aérea Brasileira (a fabulosa FAB) tomado para o cumprimento de duas horas de compromissos oficiais em assuntos da telefonia pública, dos quais não entende bulhufas. Depois, dedicou-se a participar de leilões de compra e venda de cavalos de raça, sua atividade privada. Por publicação no jornal O Estado de S. Paulo, o presidente Lula, pretenso superior hierárquico do ministro traquinas, foi avisado da ocorrência. E resolveu que o dito cujo teria de se defender em público, sob pena de perder a sinecura. Falta espaço nesta coluna para reproduzir as picaretagens das quais o moço tem sido acusado publicamente.

E ganha uma passagem sem volta aos rios povoados por crocodilos na filmagem de Apocalypse Now nas Filipinas quem citar qualquer dote que permita ao acusado tomar decisões milionárias no saque ao erário para adquirir a sofisticadíssima tecnologia das telecomunicações no obscuro universo da cibernética. Mas nem o mais rígido cronista de atividades políticas e administrativas pode negar que não lhe falta massa cinzenta mínima para manter o traseiro apoiado no fofo sofá do gabinete de gestor de telefonia e computação: um padrinho forte na voragem da Esplanada.

À véspera do encontro marcado para a eventual defenestração do trêfego autor de projeto único na Câmara — o Dia do Cavalo —, o multiempoderado chefão do Centrão, Arthur Lira, presidente de direito da Câmara e de fato de muito mais, interveio em seu favor. Do Olimpo de concreto de Niemeyer avisou publicamente ao chefe do Poder Executivo, no outro lado da praça, que este não tinha número de “apoiamentos” (como se usa na trôpega gíria parlamentar) suficiente para aprovar o mais insignificante projeto no Congresso Nacional por maioria simples, ou seja, metade dos presentes à sessão mais um voto. O bravo metalúrgico, que liderou greves e paralisou a produção de automóveis nos velhos tempos da ditadura, recebeu o faltoso e mandou que se defendesse. O moço fê-lo sem pestanejar. Afinal, o próprio chefe do Executivo lhe deu a chave para o “abre-te, Sésamo”: o péssimo exemplo de sua própria autonomia. Ou seja: “jamais faria com ele o que fizeram comigo”. Sentença que o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Herman Benjamin definiu como “absolvido por excesso de provas”. Em suma: Juscelininho, que nada entende do tema da pasta, mas navega na primeira viagem com desenvoltura na crocodilagem congressual, defendeu-se como o mestre pontificou: “Sou inocente, fui injustiçado”.

Ninguém está aqui bestando com a possibilidade de Lira ter blefado no pôquer pesado do dia a dia da praça dos Três Poderes. Para não deixar dúvidas, apresentará suas credenciais de padrinho de crisma do moço sôfrego em toda votação corriqueira e sem importância que o governo perder por dispor de uma base reduzida de 130 votantes, no máximo um terço do estritamente necessário. O filho de seu Juscelino pode ter dificuldade para distinguir código Morse de algoritmo, mas dificilmente faria tanto sucesso nos haras da vida se não percebesse a diferença entre um pangaré e um quarto de milha. Sem deixar de anotar que deve ainda saber o quanto vale em reais o quinto de um milhão de dólares. As aulas de física quântica que gazeteou nos bancos escolares não lhe fazem falta para perceber que sua crença no bolsonarismo cavalar já basta para identificar nos parceiros do pretenso sumo-sacerdote da Esplanada dos Ministérios os defeitos de que é acusado nos processos em curso e nos meios de comunicação da hora.

Longe do discurso moralista professado aos microfones dos plenários por seus colegas de equipe ministerial, com sua volúpia de apropriação do público pelo privado, não teria sequer de confessá-lo ao amoroso pai, de quem herdou o prenome presidencial. Exemplos pululam naquelas redondezas.

Como se sabe, o PT em geral e Lula pessoalmente usam certo “tribunal particular”, título apropriadíssimo do artigo de autoria de Claudio Dantas na Crusoé e em O Antagonista. O chefe da Casa Civil, Rui Costa, indicou em nome do combativo PT a enfermeira Aline Peixoto, sua quarta mulher, para o Tribunal de Contas dos Municípios do Estado da Bahia —estado por ele governado em dose dupla. Na Assembleia, onde foi aprovada por 40 a 19 votos na quarta-feira (8), Aline chorou e disse que tentaram desqualificá-la para o cargo “apenas por ser casada com o ex-governador da Bahia e atual ministro-chefe da Casa Civil”. Machismo? Não seria o contrário? Um mimo festejando o Dia Internacional da Mulher? Ou nepotismo, vulgo compadrio? Que imparcialidade teria ela para julgar contas do próprio marido ex? Rui mora em imóvel funcional em Brasília, e o novo governador, Jerônimo Rodrigues —ou Jeromo, como se nomeia o próprio—, em casa no Caminho das Árvores, à espera da conclusão das reformas em Ondina. O vencedor do pleito passado continua sendo um “sem-gabinete”, pois a governadoria, em ruínas, não funciona e só estará apta para receber o governador em oito meses. Quem sabe a GloboNews poderia mostrar o estado em que o chefe da Casa Civil a abandonou.

Ou seja, meus amigos, meus inimigos, como diria o poeta Bandeira, a mistureba de privado e público não é exclusiva da direita extremada. A esquerda extremosa de Zé Dirceu e Gleisi Hoffmann também tem seus pecadilhos. O exemplo da xará da musa do cantor francês Christophe está longe de ser único: Wellington e Rejane Dias, dos mesmos professores de moralismo em cafezinho de plenário do aguerrido PT, praticaram idêntica filustria no Piauí. O aliado Renan Filho nomeou a consorte, e ponha sorte nisso, Renata Calheiros, para o mesmo emprego público vitalício pelo MDB do estado de Alagoas, onde se iniciaram três presidentes da malfadada República que os pobres financiam com fome, desemprego e miséria. O fantasma de Leonel Brizola não assustou o PDT do Amapá, e a cônjuge Marília de Waldez Góes goza de sinecura similar.

Encerrada a lista copiada do artigo de Claudio Dantas, resta-me relembrar que os tribunais de contas são órgãos fiscalizadores de atividades do Executivo. E cumprem uma das funções que o Legislativo, como de hábito, se nega a exercer nestes tristes trópicos. A lei exige dos indicados para eles idoneidade moral e reputação ilibada. Além de notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros, com pelo menos dez anos de exercício em função pública em União, estados ou municípios. Mas quem vai ligar mesmo para isso nesta Pindorama devastada a essas alturas do campeonato, hein?

 

José Nêumanne Pinto é jornalista, poeta e escritor

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  1. Bom dia Nêumanne. Nenhuma surpresa dos "arranjos" do PT. Sabíamos que pagaríamos um preço muito alto pra retirar o "celerado criminoso", amante das joias.Vivemos nas últimas décadas de heranças malditas. O "Sapo Barbudo" não vive sem o "Bozo" e a recíproca é verdadeira.

  2. lembrança de Brizola foi extremamente infeliz. Aquele finado, fi lho de uma P U T A, foi o responsável pela destrição do estado do Rio de Janeiro. Infelizmente um estado que abriga o maior contingente de eleitores estú pidos do mundo!

  3. Essa gente aproveitadora e usurpadora dos bens e direitos do povo miserável e espoliado, também vai morrer e já tem vaga reservada nas profundezas do inferno… deve servir de consolo para os brazucas que nem se rebelar conseguem…

  4. Queríamos o quê? Trouxemos essa quadrilha de volta para quê? Estranhar o quê? Aliás o autor do texto conhece bem o chefe da gang. Não foi ele quem escreveu algo como " O que sei de Mula" (Algo assim...).

  5. Vergonhoso e lamentável! Não importa a ideologia - esquerda ou direita - as velhas práticas de nepotismo continuam, despudoradamente! A lei é ignorada - e quem quiser que conte outra…

  6. Nojentos. Infames. Ladrões. A ex posa Ciro Gomes é conselheira do do tc-ce indicada pelo irmão Cid. Com todo respeito, só faz um "0" quando senta na goma, como se fala por aqui.

  7. O Brasil não é m país sério. Que país é esse? Esse é um país cuja sociedade é constituída de pessoas sem valores morais. O resultado é o óbvio ululante.

  8. Nêumanne, só posso compartilhar dessa triste constatação que você coloca em seu brilhante texto. Mas é desanimador, não? Acho que essa coisa de parentada ganhando cargos tem tudo a ver com a incapacidade do povo de votar em quem propõe o viável, mas em quem promete absurdos. Poucos meses se passam e ninguém mais lembra em quem votou.

  9. Muito bom seu artigo. Mas isso está impregnado em todos os estados.. filhos de políticos também são indicados para esses cargos. Vocês já viram algum prefeito preso, caem, mas tudo vira pizza. Governador preso? Cabral, algum outro? Richa ficou preso? Aécio ficou preso? Enfim a lei passa muito longe para essa classe política.

  10. Não há esperança.....os políticos são os assassinos do Brasil...para onde se olha é corrupção..podridão..descalabro...o Brasil está morto

    1. Mas os candidatos são sempre os mesmos! Saem sempre do grande grupo oligárquico que domina o país. Os partidos tem "donos" e só apresentam lixos políticos como candidatos. NÃO É QUESTÃO DE APRENDER VOTAR, É QUESTÃO DE TER CANDIDATOS QUE VALHAM A PENA VOTAR.

    2. Viva a Democracia! Fazuéli ! 523 anos de moral Macunaíma; a desgraça brasileira ..... BBB, Pablo Vitar, MC Pipokinha, grandes "celibridades", são nossa "esperança "de que seremos eternamente o pais do futuro....

    3. Você acha que os políticos vieram de onde? De Marte? Pois é, a única forma de resolvermos isso é aprendermos a votar e não reconduzir aos cargos eletivos, aqueles que já demostraram de forma descabida que não mereciam estar onde estão.

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