Ministério da FazendaBernard Appy: documento tem frases de efeito como “o IVA vai melhorar a vida das pessoas e das empresas”

O marketing da reforma

Ministério da Fazenda manda aos parlamentares um plano de comunicação para ajudar os defensores a propagar a palavra, mas dúvidas sobre tributos persistem
10.03.23

A grande aposta do governo Lula para ajudar a equilibrar as contas públicas vai precisar mais do que um bom plano de marketing para emplacar no Congresso Nacional. Parlamentares reclamam que a ideia da reforma tributária ainda é de difícil entendimento, porque não há um texto consolidando as PECs 45 e 110, que são a base da proposta. Além disso, crescem as reclamações de que há muito barulho sobre os possíveis benefícios das propostas, mas os detalhes não foram explicados e o debate está longe de produtivo.

Nesta semana, o Ministério da Fazenda fez chegar aos parlamentares um plano de comunicação para ajudar os defensores a propagar a palavra. No documento, que traz a marca de Bernard Appy, secretário extraordinário da reforma tributária, frases de efeito como “o IVA vai melhorar a vida das pessoas e das empresas” e “o IVA vai simplificar e dar transparência ao sistema tributário” fazem parte do arsenal que deve ser repetido à exaustão para vencer os opositores da proposta (que, ressalte-se, poucos verdadeiramente entendem).

A confusão é tamanha que começam a ganhar força teorias de favorecimento de setores específicos e até o ressurgimento de propostas concorrentes, como a PEC 46. No plano do governo, a ideia seria promover um IVA (Imposto sobre Valor Agregado) único que aglutinaria uma miríade de tributos federais, estaduais e municipais, como está desenhado nas PECs 45 e 110. No entanto, essa proposta já encontra resistências, e o governo está batendo cabeça para viabilizar uma nova forma que atenda à pretensão dos estados – que defendem um IVA estadual – e municípios – que, é claro, gostariam de um IVA municipal.

Por enquanto, o governo trabalha com a ideia de uma IVA dual, que atenderia União e estados. Para os municípios, a arrecadação ficaria incluída no IVA estadual. Ninguém sabe como ou com que tamanho. Mas além dos entes federados, setores econômicos já se movimentam para evitar que as mudanças prejudiquem os negócios.

Uma carta encaminhada a Lira por entidades representantes do setor de serviços, por exemplo, alerta que “a proposta de unificação de impostos de consumo sobre bens e serviços, com alíquota única, oferece sérios riscos à sobrevivência de muitas empresas e à manutenção do emprego no setor”. O documento diz ainda que “a preocupação se justifica porque a alíquota que se anuncia para o novo imposto, o IBS, da ordem de 25%, seria uma das mais altas dos países que adotam o IVA”.

Além disso, “ao contrário da projeção de crescimento, a proposta não se afigura adequada para contribuir com o dinamismo da economia, sendo mais provável que resulte em recessão”, argumenta Marcel Solimeo, economista-chefe da Associação Comercial de São Paulo (ACSP). Quem está certo nessa história ainda não está claro, porque não há nitidez sobre a proposta quando se tenta avançar além do marketing ostensivo do governo.

Assim, opções alternativas começam a ganhar corpo e a complicar o debate, dividindo ainda mais opiniões e votos. A PEC 46, por exemplo, de autoria do senador Oriovisto Guimarães é uma das que buscam retornar à lista de possíveis soluções. Em entrevista a Crusoé, o parlamentar defendeu que, além de prejudiciais a um setor de serviços, responsável por grande parte dos empregos no país, as PECs 45 e 110 ferem a autonomia dos entes federativos ao unificar impostos, como ICMS (estaduais) e ISS (municipais). “Mais de 60% das receitas das prefeituras dependem do ISS. Isso cria uma situação que é contra a ideia de Federação, é contra autonomia dos Estados e contra autonomia dos Municípios, já que não existe autonomia quando não há independência financeira”, diz.

A proposta de Oriovisto é simplificar os tributos brasileiros ao estabelecer uma legislação única para o ICMS (que hoje tem 27, uma em cada estado e no Distrito Federal), e outra para o ISS (que tem mais de 5 mil normas vigentes no momento, uma para cada município). “Uma empresa, por exemplo como a Netflix, que atua em todo o Brasil tem que conhecer essas 27 legislações. Sem contar que o ICMS é um IVA (Imposto sobre valor agregado). Então, isso de dizer que a PEC 45 e a 110 vão criar o IVA e que isso é moderno, isso é uma bobagem porque nós já temos o IVA”, diz o parlamentar.

E isso é só o começo das discussões sobre o assunto. Difícil acreditar que o plano do governo de aprovar a reforma ainda no primeiro semestre se concretize, mesmo sob a batuta da criativa equipe de marketing de Haddad.

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  1. Uma reforma tributária é extremamente necessária. Mas duvido da capacidade de um governo como o atual formular uma que faça sentido e, depois, aprová-la, que será muito custoso ante os grupos económicos que fatalmente Irão perder seus benefícios fiscais.

  2. Consta que não tivemos crescimento econômico nos últimos 20 anos, 16 deles sob o governo do PT. Agora, o que podemos esperar? De onde menos se espera é que não sai nada mesmo.

  3. Independentemente do governo ser petralha, bolsominion, isentão ou qq outra coisa, uma reforma tributária que simplifique e racionalize a insana cobrança de impostos será uma vitória para o país. É a ÚNICA expectativa positiva em relação a este governo. Se conseguir uma boa reforma, racional, razoavelmente neutra e sem aumento da carga tributária total já terá feito muito além das minhas nulas expectativas.

  4. O que se vê, que ninguém quer qualquer mudança. Tudo pelo que está ai, já que com certeza tem muitos desvios e não pagamento do que deve ser pago. Sabe aquele negócio de sempre que vai prejudicar este ou aquele setor. Neste mato tem muita serpente, que preferem que tudo fique como sempre ficou, é mais fácil sonegar do que pagar o que deve.

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