RuyGoiaba

O Brasil estraga tudo

16.04.21

Orson Welles estava no topo do mundo em 1942, aos 27 anos. Aos 21/22, já fizera enorme sucesso no teatro americano como diretor de versões de Shakespeare que marcaram época, como um “Macbeth vodu” — com a ação transferida para uma ilha semelhante ao Haiti e um elenco composto só de atores negros — e uma adaptação de Júlio César cheia de referências ao fascismo. Aos 23, apavorou os EUA com sua transmissão pelo rádio da “invasão marciana” de A Guerra dos Mundos, de H.G. Wells. Aos 25, dirigiu o primeiro filme, Cidadão Kane, reconhecido como um dos melhores de todos os tempos.

Aí Welles resolveu pisar no Brasil — e nunca mais nada funcionou a contento na vida dele. O cineasta veio para cá filmar o documentário It’s All True, como parte da política de boa vizinhança americana na Segunda Guerra (bem-sucedida em evitar, no caso brasileiro, que Getúlio Vargas se alinhasse aos nazistas). Tudo deu tão absolutamente errado que, na tentativa de reencenar para o filme a viagem de quatro pescadores de Fortaleza ao Rio numa jangada, Jacaré, o líder dos jangadeiros, morreu afogado. Para completar a desgraça, a RKO, estúdio de Welles, não só cortou o financiamento do documentário, não concluído, como retalhou Soberba, o filme que ele deixara por editar quando veio ao Bananão, destruindo depois os negativos —o que torna impossível um director’s cut hoje.

O gênio do cinema, que morreu em 1985, passaria as quatro décadas seguintes aceitando papéis de ator em filmes que ele mesmo admitia serem bombas, caçando empréstimos nos lugares mais improváveis, muitas vezes sem sucesso, e começando vários projetos de filmes que não conseguiu terminar. E, sim, tudo por culpa do Brasil, este país tropical abençoado por Deus. Caso isolado? Então meditem no destino de Sarah Bernhardt, a grande diva do teatro no século 19.

Em uma de suas visitas ao Brasil, a atriz ganhou de dom Pedro 2º uma pulseira de ouro com diamantes, roubada do seu hotel pouco depois. Dois atores de sua companhia contraíram febre amarela, e o empresário morreu de ataque cardíaco. Anos mais tarde, em uma encenação de La Tosca no Rio, um colchão mal colocado fez com que Sarah, ao pular de um muro, caísse com força sobre o joelho direito —o que contribuiu para que, em 1915, ela tivesse de amputar a perna (morreu em 1923, aos 78 anos). Querem mais? Podemos citar Louis Moreau Gottschalk, o virtuose americano do piano, que compôs a Grande Fantasia Triunfal sobre o Hino Nacional Brasileiro, também pegou febre amarela por aqui e morreu em 1869 de overdose de quinino, usado para tratar a doença.

Vocês ainda têm alguma dúvida, meus amigos, de que o Brasil estraga tudo? Que as condições sanitárias tenham melhorado do século 19 para cá — embora metade do país ainda seja obrigada a fazer cocô no matinho mais próximo — só significa uma coisa: a febre amarela hoje é mental e atinge inclusive, talvez principalmente, o que por aqui se chama de “elite” e é uma das minorias privilegiadas mais burras do Universo conhecido (se bobear, do desconhecido também). Coisas que dão certo lá fora, como medidas restritivas contra Covid e vacinação, aqui não funcionam; em compensação, qualquer picaretagem importada, como cloroquina via oral e nebulizada, viceja que é uma beleza. Mata gente também, mas e daí? Como sempre: crime ocorre, nada acontece, feijoada.

É claro que um país também é uma paisagem afetiva: o lugar onde estão nossa família, nossos amigos e nossos amores, a língua em que nos expressamos desde pequenos, as comidas com o sabor da nossa infância. É verdade também que tradições, como essa de o Bananão estragar tudo, não são eternas: podem e devem ser derrubadas. Mas o Brasil, hoje, é uma doença degenerativa — e o corpo do país certamente não será regenerado por quem acha tudo lindo ou diz ver a pátria “acima de tudo”. Lembrem-se de Samuel Johnson definindo o patriotismo como “último refúgio dos canalhas”, mas principalmente daquela emenda feita pelo brasileiríssimo Millôr Fernandes: “No Brasil, é o primeiro”.

***

A GOIABICE DA SEMANA

Um certo movimento monarquista brasileiro, mais um exemplar dessa fauna exótica que habita o país nauadeis, expressou condolências pela morte do príncipe Philip do Reino Unido (na sexta-feira passada, 9, aos 99 anos) publicando uma foto do filho de Philip, Charles, ao lado da mãe, a rainha Elizabeth 2º. É mais ou menos como um fiel católico, ou de qualquer outra denominação cristã, chamando Jesus de Genésio — e deveria dar demissão por justa causa. No Brasil, até esse povo que curte um rei leva bomba em Monarquia Britânica 101.

Roger Harris/UK ParliamentRoger Harris/UK ParliamentLegenda para monarquistas brasileiros: príncipe Philip está à direita na foto acima

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  1. Se acham que o Brasil não dá certo, porque ainda estão por aqui? Peguem suas tralhas e vão tentar mentir lá fora, na Europa, na Asia,etc. No mínimo seu goiaba, deves ser um daqueles que mamavam nas tetas da "viúva" que agora secou

  2. Disse uma grande verdade, temos a elite privilegiada mais burra do universo. Tenho simpatia e às vezes até admiração pela sabedoria de vida dos pobres quase analfabetos que conheci,mas meus pares de classe média são insuportavelmente tapados e arrogantes na sua idiotice. Uma tristeza. Tenho muitos amigos europeus, todos pessoas comuns, sensatas e inteligentes. Aqui não há, é sempre decepcionante conversar com qualquer um, só tem imbecil de carro novo.

  3. Charles de Gaulle disse que o Brasil não é um país sério e o Heraldo Pereira ao chamar ao reporter no Rio de Janeiro "Direto da Cidade Maravilhosa" só pode ser brincadeira de mal gosto. Por isso e por outras somos um país predestinado a ser motivo de risos e medo.

  4. Artigo pessimista que vê o lado vazio do copo. Tantos outros vieram para cá e tiveram sucesso, exemplo os imigrantes italianos, alemães e japoneses. Me parece mais um culto ao quanto pior melhor tão desejado pela esquerda. Complexo de vira lata em ação.

    1. Meu Deus, Pangloss está entre nós, reencarnado no melhor dos mundos possíveis chamado Brasil!

    2. É Antônio, dói ver a realidade e enxerga-la em profundidade é ainda pior. Basta para isso fazer uma leve comparação entre o Brasil e outros países nos últimos 50 anos para cá. Desanimador.😧

    3. Muitos descendentes destes imigrantes hoje solicitam a dupla cidadania.

  5. Ruy, o próprio Welles dizia ter sido concebido no Brasil, pais de escolha na lua de mel dos pais. Predestinado.

    1. VITOR, você, por acaso, aceitaria se candidatar na próxima eleição presidencial? Não aguento mais ver gente ignorante sentada naquela cadeira! 🤦

    2. É uma brincadeira do autor com a língua inglesa. Em inglês, "nowadays" quer dizer "atualmente".

    1. Briguei pelo zap com o ex marido (bolsominion) como nunca briguei quando nos divorciamos há 45 anos. Se ainda estivéssemos casados, agora estaríamos nos divorciando. Bolsominion é doença contagiosa e mortal igual ao covid, é uma praga! E eu achava que pior que petista não existia ninguém.

  6. O quadro é assombroso mesmo! Participo de um grupo de cirurgiões dentistas e fico chocada com o nível das discussões ( era para ser só profissional,mas os bolsominions não deixam ) . Vendo como pensa essa “ elite “ que tem curso superior, fico pensando no tamanho do buraco que estamos ,

    1. Prezada Ana, imagino os dissabores que passa- misto de angústia e irrealidade, não é? Um conselho: exercite a solidão e despeça lembranças amargas. Não se torne um robô neste mundo.cibernético. Desculpe a ousadia do conselho...

  7. Para complicar a cabeça dos brasileiros, como lula/PT encheu o saco, acabamos escolhendo um novo herói, formado num ambiente lúdico como a ALERG e criado bem próximo às áreas milicianas cariocas. Mas ACREDITAMOS NESSE HERÓI. Pulamos de cabeça e o levamos à presidência... Lá chegando, volta os filme de antigamente: O Herói vai tirando máscara e se mostrando um esperto anti herói. Anula o xerife que caçava bandidos, mata seu cavalo o deixa no esquecimento e faz acordos com a nata da bandidagem.

  8. Faltou a clássica imagem do bandido e do mocinho...que eram os principais atores nos velhos filmes. Hoje mudou um pouco o bandido é mais poético e o mocinho é HEROI. Aprendemos a torcer sempre pelo mocinho, até no berrros dentro do cinema, mas agora o Brasil inventa o bandido que caça e aniquila o mocinho...Lula vence Moro. Nossas convicções ficam atrapalhadas com celular, tecnologías, etc. mas principalmente por causa das vitórias do bandidos.

    1. Temos o que merecemos, ainda tenho dificuldade de contra argumentar com os extremos.

  9. 👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼💯💯💯💯👌🏼👌🏼👌🏼👌🏼 O país, seu povo, seus líderes, autoridades, empresários estão bem localizados geograficamente no Trópico da Corrupção. A história comprova que quaisquer países e povos nesta localização jamais prosperaram para o status permanente de país de primeiro mundo. A vocação natural é para isto que se vê com espanto diante dos olhos.

  10. Goiabices inteligentes como sempre! É como diz a canção: aqui é o fim do mundo. E no enredo de tantos filmes: bandido se dá bem e se manda para o BRASIL.

    1. Ou será que alguns assinantes são analfabetos funcionais? Também é uma opção, né não?

  11. Na verdade o Brasil perdeu a graça, inclusive do seu mágico futebol, porque polarizaram tudo, sobretudo nestes tempos lulobolsorianos. Felizmente vocês estão tirando leite de pedra para de nos dar um gosto adocicado desta festa amarga que o Brasil celebra já cronicamente. Quanto ao genial Welles ele seria demais para enfrentar o poder estabelecido nos EUA nos anos 50 (bota trampista nisso!) . Enfrentar o império Hearst não era para gênio romântico. Pior que enfrentar Roberto Marinho.

    1. Ah, seria muito injusto (e detesto injustiças, sobretudo do tal Supremo (?) : nao vou deixar o Marinho solitário. Tem-se também, saltitantes: Chateaubriant, o rei do Brasil e Samuel Wainer, o que tornou Getúlio um esquerdo-socialista para nossa historia oficial, chancelada pela filha do próprio Vargas (brincadeira, né?). É mole??

  12. Neste nosso querido BR, qqer um que chegue falando um bom português com sotaque gringo, é promovido imediatamente à celebridade. Subserviência atávica. Síndrome de inferioridade. Tudo dos gringos presta. Já do Br, nada presta..apscosta/df

  13. Sem discordar do diagnóstico sobre o Brasil, Orson Welles sofreu mais porque foi perseguido por Hearst, barão da mídia que ele supostamente retratou em Cidadão Kane.

  14. Acabei de ler a biografia do Churchill publicada pelo jornalista e historiador Andrew Roberts. O Brasil, infelizmente, não tem e nunca teve, em qualquer governo, uma elite realmente preocupada com os interesses da população e por consequência do país. Quando você lê que, em pleno século XIX, um país imperialista como a Inglaterra, já se preocupava com os direitos sociais dos seus cidadãos, como moradia, saúde , trabalho, salário, etc , e compara com o Brasil do século XXI, dá vontade de chorar.

    1. Tem toda razão! Aqui o que viceja é a vontade de se dar bem , nenhuma consciência moral legítima , isso só fica no discurso de campanha... chegou lá é só sugar até o osso

  15. Acho que o câncer do mundo se inicia pela imprensa imoral que se instalou no Globo. Ah, em questão de imoralidade a Crusoe está bem classificada.

    1. Afranio, já estão preparando uma nave espacial para levar turistas para fora do "Globo", como vc mesmo disse. Vai juntando uma grana e compra só passagem de ida que sai mais barato. Ah, bolso-petistas têm desconto. Mande um postal quando chegar seja onde for. Boa viagem

    2. É , Afrânio, vc faz parte dessa turminha que nem desenhando consegue entender nada

    3. Moral mesmo é o SBT, que no governo Lula conseguiu repassar seu banco Panamericano falido para a CEF ou a Record, que vendeu novela para a EBC e depois vai reapresenta-la de graça. Esta paranóia de qualquer governo com a Globo é outra amostra da "zelite" brasileira. E o gado, ontem petista, hoje bolsonarista, compra na hora!

    4. É incrível como os bolsonaristas são limitados intelectualmente e tem tanta deficiência cognitiva.

  16. Goiaba, deixei para ler sua coluna por último; estou triste e está sendo duro acompanhar as notícias. Você tem razão em tudo. O Brasil consegue estragar tudo. Lembrei da frase de um personagem do Jô Soares: "trouxeram a máfia para o Brasil e esculhambaram com a máfia." Infelizmente, o Brasil é o câncer do mundo.

  17. Essa monarquia tupiniquim daqui é tão irrelevante que se não fosse por vc, Goiaba, eu não saberia das "condolenças" pela morte do príncipe errado dadas por ela. Põe goiabice nisso!

  18. Caberia lembrar Bernard Shaw para quem “o patriotismo é a pior forma da idiotice “, ou “era bem estupido mas não chegava a ser um patriota “

    1. Previsível, rsrsrs. Tudo que não presta visceja por aqui. Em compensação, todos que tentam mudar isso são apedrejados. Vide a força tarefa de Curitiba - não duvide que sejam todos condenados. Ou no mínimo desmoralizados. Não é de hoje! Isto não é uma Nação. É um carma!

    1. Nao são exceções, a exemplo de Cesare Battisti, que durante longos anos foi acoitado por quem " não sabia" que era um assassino cruel. É a norma - bandido aqui se cria muito bem. Neste pais os que não dão sorte são os geniais, os bem intencionados e os honestos. Pra estes, o país é implacável em destrui-los.

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