Divulgação/STF

STF retoma julgamento que pode gerar indenização bilionária da União a usinas

11.08.20 20:31

O Supremo Tribunal Federal retomou o julgamento virtual de um recurso que pode provocar um impacto bilionário aos cofres públicos. O processo, que tramita na corte há cinco anos, discute se a União pode ser responsabilizada por prejuízos nas contas do setor sucroalcooleiro devido à fixação de preços em valores inferiores ao custo de produção. O placar está apertado: 3 a 3.

Devido ao caráter de repercussão geral do processo, movido pela Usina Matary, o entendimento da corte vai afetar ações similares de centenas de empresas do ramo. A Advocacia-Geral da União diz que, se reconhecida a responsabilidade do Estado, o impacto provocado pelo pagamento de indenizações seria de 72,4 bilhões de reais. Um parecer técnico da consultoria Tendências, encomendado pela União da Indústria de Cana-de-Açúcar, entretanto, indica que o valor ficaria em 8,1 bilhão de reais. 

A deliberação sobre o recurso, interrompida em abril por um pedido de vista de Alexandre de Moraes, foi reaberta na última sexta-feira, 7, e deve terminar na próxima segunda-feira, 17. O ministro devolveu os autos para julgamento virtual em junho, quatro dias após receber, em São Paulo, o núcleo jurídico da gestão Jair Bolsonaro.

Na ação original, a Usina Matary pede indenização pelos prejuízos. A empresa argumenta que, entre as décadas de 1980 e 1990, o Instituto do Açúcar e do Álcool, IAA, contratou a Fundação Getúlio Vargas, FGV, para fazer um levantamento técnico e identificar valores adequados ao setor a partir de pesquisa de mercado. Os números, contudo, teriam sido ignorados pelo governo, que fixou os preços dos produtos abaixo do custo de produção. 

Para compensar as perdas, a Matary quer que a União pague a diferença entre os valores do estudo da FGV e os praticados pelo IAA. O pedido foi negado pelo juiz de primeira instância, pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região e pelo Superior Tribunal de Justiça.

No STF, o relator do processo, Edson Fachin, se posicionou contra o pleito da Matary e defendeu que seja estabelecida a tese de que, para a responsabilização do Estado, é “imprescindível a comprovação de efetivo prejuízo econômico, mediante perícia técnica em cada caso concreto“.

Alexandre de Moraes acompanhou Fachin. No voto, ele entendeu que, devido às “peculiaridades” do cenário econômico da época, de hiperinflação, a opção do governo em estabelecer uma política de preços “encontrou amparo constitucional e legal”.

De acordo com Moraes, o parecer emitido pela FGV não vinculava o IAA. Além disso, o ministro observou que um parecer técnico da AGU anexado ao processo mostra que a Usina obteve lucro e, não, perdas, tanto que “aumentou seu parque industrial em mais de 100%”. 

“A indenização por danos emergentes e lucros cessantes, portanto, demanda a efetiva comprovação do dano. Enfim, incabível a indenização em decorrência de ato estatal, quando na verdade se verifica superávit contábil”, escreveu.

O magistrado também destacou que, mesmo que pudesse haver a responsabilização da União pela redução na margem de lucro da empresa, ela não poderia ser vinculada necessariamente à política de preços. “Vários outros fatores poderiam ter levado à diminuição dos ganhos — como, por exemplo, a redução da demanda”. A ministra Rosa Weber também seguiu o relator, mas seu voto ainda não foi publicado.

Do outro lado, os ministros Ricardo Lewandowski, Luiz Fux e Marco Aurélio Mello concluíram que o setor sucroalcooleiro precisa ser indenizado. Lewandowski alega que, em julgamentos anteriores, o STF já entendeu que a União tem de pagar pelos danos causados ao setor em decorrência da fixação de preços em valores abaixo daqueles praticados no mercado e na contramão da legislação.

“Embora a intervenção no domínio econômico seja uma possibilidade consagrada na Constituição Federal, o exercício dessa prerrogativa estatal deve respeitar os princípios e fundamentos da ordem econômica, de modo a não malferir a livre iniciativa e, por consequência, o Estado Democrático de Direito”, indicou.

Na mesma linha, Marco Aurélio Mello considerou que “a intervenção estatal na economia não pode ser potencializada de tal forma a violar garantias constitucionais”. O ministro avaliou que o valor do dano causado pela União deve ser quantificado por meio de perícia.

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