Ricardo Stuckert / PR via FlickrO que está sendo testado não é o lendário “toque de Midas” de Lula, mas o que a sociedade aprendeu coletivamente nos últimos anos

Lula ruge muito porque manda pouco?

O presidente não será Dilma 3 porque seus limites de ação estão mais bem desenhados, como um Congresso conservador e dono de mais de 20% do Orçamento
15.03.24

Em discussões transcendentes sobre a marcha da vida, uma das principais questões é a existência ou não de um sentido, palavra que se refere duplamente a significado e direção, dos eventos que vão se sucedendo. Afinal, a trajetória das pessoas, se dá de forma circular e repetitiva? Ou avança de forma linear e progressiva? Ou é simplesmente caótica?

É inevitável trazer esta dúvida existencial para pensar a trajetória política dos países, fazendo a mudança do destino dos indivíduos para a sorte das civilizações. Ainda mais quando o Brasil se depara com a realização de escolhas hoje que eram amplamente condenadas até ontem, dando a impressão de estarmos assistindo a um filme repetido e levando analistas a comparar o governo Lula com o da ex-presidente Dilma Rousseff.

A questão da intervenção do governo na Petrobras, na Vale, as críticas ao Banco Central, quase ataques pessoais ao seu presidente, Roberto Campos Neto, a reedição de programas de gastos públicos e, principalmente, a autossuficiência demonstrada por Lula no seu processo de tomada de decisões trazem debates que, apesar de repetidos, claramente não estão superados, considerando o nível de apoio que essas ideias intervencionistas ainda têm na sociedade. É fácil encontrar quem afirme que esse arcabouço de medidas só deu errado lá atrás por causa da Lava-Jato e da inabilidade política da ex-presidente: “Lula não é Dilma”, dizem.

Para análise política, se Lula é ou não é Dilma é algo que importa menos. O conjunto das ideias e a oposição que será feita a elas é o verdadeiro pulo do gato. O que está sendo testado não é o lendário “toque de Midas” de Lula, coisa para militante apaixonado, mas o que a sociedade aprendeu coletivamente nos últimos anos e como ela reagirá diante dessas receitas repetidas. Ou, em outras palavras, as instituições permitirão que Lula faça, na sua integralidade, o que quer fazer?

Há condições estruturais que sugerem que, nesse sentido, Lula não será Dilma 3 porque seus limites de ação estão mais bem desenhados. Há barreiras visíveis, como um Congresso conservador e dono de mais de 20% do Orçamento, e há outras relativas ao contexto, como a desconfiança em relação às intenções e à capacidade do governo.

A ex-presidente tinha um estoque e confiança construído ao longo de 12 anos e encontrou caminho livre para propor a “nova matriz econômica” e fazer suas experiências. Lula, inversamente, não tem nem popularidade suficiente, nem Congresso, nem recursos e nem confiança dos agentes econômicos para propor a retomada das “inovações”.

Uma simples passada de olho nos editoriais dos jornais consegue indicar o tamanho da oposição que ele enfrenta. Mesmo os veículos mais condescendentes, que temem o retorno do bolsonarismo, estampam nesta semana editoriais que dizem que “Lula mina a confiança no Brasil”.

Uma corrente do pensamento institucionalista chamada “path dependency”, ou dependência da trilha, numa tradução livre e ruim, diz que as escolhas que podemos fazer no futuro dependem da bagagem que acumulamos no passado, inclusive a confiança. E, embora Lula pareça o mesmo de outras temporadas, a novidade é que as barreiras que ele tem que escalar são maiores. É correta a percepção de que Lula ruge bastante porque percebe que manda pouco.

E daí nasce outra pergunta. Se Lula não será um Dilma 3, o que vai ser? O que pode surgir dessa condição de líder limitado? A história tem exemplos mil com vários desfechos possíveis que variam desde o melancólico José Sarney até os dramáticos Getúlio Vargas e Jânio Quadros.

Mas, como já foi sugerido, não é um bom conselho buscar no passado uma receita para prever o futuro. Talvez seja mais prudente entender a vida, e a política, como uma espiral, na qual, olhando de cima, os desafios vividos até parecem os mesmos. Mas, olhando em perspectiva lateral, percebe-se que a trajetória é diferente. Assim, para problemas novos, mesmo que pareçam velhos, prognósticos novos, mesmo que os analistas possam parecer cansados.

 

Leonardo Barreto é cientista político e diretor da VectorRelgov.com.br

 

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  1. Não sei se é paranoia ou desejo, mas a volta de luladrão arquitetada pelo sistema parece um cavalo de Tróia para por Alckmin e s pusilânimes do psdb de volta ao tabuleiro. Luladrão está velho, continua o mesmo bêbado de sempre, fala as mesmas bobagens, as mesmas mentiras, com aquela cara de doente e não vai para os braços do capeta. Geraldo deve estar aflito

  2. O movimento do Lula sempre apoiando ditadores e autocratas, associado ao passado nada democrático desvendado pela Lava Jato, mostra que ele quer muito o poder, infelizmente só para atender interesses (não republicanos?) de se grupo

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