Howard Chandler Christy via Wikimedia CommonsMesmo após a guerra civil —que acabou com a escravidão, mas não com a segregação — os Estados Unidos continuavam se jactando de ser uma democracia plena

Democracia americana: uma farsa

Os EUA nunca foram uma democracia plena e ultimamente esse status vem se agravando
15.03.24

Os EUA nunca foram uma democracia plena e ultimamente esse status vem se agravando.

Quando os americanos se libertaram dos ingleses, em 1776, George Washington não quis ser rei. O país tornou-se uma república, tendo Washington como primeiro presidente.

Os chamados “pais da pátria”, Benjamin Franklin, Alexander Hamilton, Thomas Jefferson, George Washington, além de outros, promulgaram a Constituição americana, que se tornou um modelo de democracia.

Nada mais falso. Só podiam votar homens brancos, que fossem proprietários. A escravidão dos negros, subtraídos da África, permaneceu, assim como os índios (povos originais) eram combatidos pelo Exército e dizimados.

Coube ao presidente Andrew Jackson, que governou o país entre 1829 e 1837, deslocar a maioria das tribos de suas pradarias férteis para terras infecundas, onde elas foram se extinguindo.

Pouco mais tarde, de 1861 a 1865, estourou a Guerra Civil, que deixou mais de 600 mil soldados, de ambos os lados (União – norte – e Confederados – sul) mortos nos campos de batalha.

Tendo o Norte vencido, realmente terminou a escravatura. Mas os negros passaram a ser altamente discriminados pelos brancos, com vários estados criando leis segregacionistas.

Foi a época da Ku Klux Klan e dos linchamentos dos negros (por qualquer pretexto que os brancos alegassem).

Os Estados Unidos continuavam se jactando de ser uma democracia plena.

O fim da segregação só veio no governo Lyndon Johnson (1963-1969), quando houve, entre outros avanços, a integração dos alunos negros nas escolas do Sul, não sem sofrerem humilhações as mais diversas dos colegas brancos e a presença de soldados da Guarda Nacional para garantir-lhes a entrada em sala de aula.

Com o passar do tempo, as coisas pareciam estar melhorando e mesmo chegando ao fim. A eleição de um mestiço, Barack Hussein Obama (filho de um muçulmano africano e de uma mãe americana branca), para a Casa Branca, sucedendo a democratas (não no sentido partidário mas no sentido etimológico da palavra) do porte de Bill Clinton e George W. Bush, parecia que os Estados Unidos, finalmente, haviam se tornado uma democracia.

Mas eis que, na sucessão de Obama, em 2016, surge, no Partido Republicano, um candidato raivoso de direita populista, xenófobo, de nome Donald Trump, que derrotou Hillary Clinton por 304 a 227 votos no Colégio Eleitoral.

Provavelmente por causa de seu comportamento negacionista durante a pandemia de Covid, o certo é que, nas eleições de 2020, Trump foi derrotado pelo atual presidente, o democrata Joe Biden, mas não aceitou o resultado das urnas.

Sem apresentar nenhuma prova, disse que as eleições haviam sido fraudadas. Não reconheceu a derrota e não compareceu à posse do sucessor.

Nessa ocasião, houve um acontecimento gravíssimo mas pouco comentado.

Temeroso de que Donald Trump, em profunda depressão na Casa Branca, no período entre a eleição e a entrada de Biden, pudesse dar uma ordem de ataque atômico contra a China, o general Mark Milley, chefe do Estado Maior Conjunto das Forças Armadas, telefonou para seu equivalente chinês, general Li Zuocheng, e garantiu que, se tal ordem fosse emitida, ela não seria executada.

Diversos episódios demonstraram o caráter antidemocrático de Donald Trump.

Entre eles, destaco dois.

Durante a apuração dos votos, Trump telefonou para o secretário de Estado da Georgia, Brad Raffensperger (nos Estados Unidos, cada estado é responsável pela apuração dos votos em seu território), solicitando-lhe que “transformasse” 11.780 votos democratas em republicanos.

Raffensperger não só se negou a cumprir a “proposta indecente” como gravou toda a conversa.

No incidente mais grave, em 6 de janeiro de 2021, Donald Trump se acercou do gradil da Casa Branca e incitou um grupo de seguidores fanáticos a marchar contra o Capitólio e impedir que o vice-presidente Mike Pence proclamasse o resultado da votação no Colégio Eleitoral, proclamação essa que é o ato de reconhecimento do resultado das urnas.

Tanto o Senado como a Câmara dos Representantes foram vandalizados, resultando em seis mortes e grande destruição, inclusive o púlpito no qual a speaker Nancy Pelosi se dirigia aos deputados.

Pois bem, esse político republicano não só será o candidato de seu partido às eleições presidenciais de novembro deste ano, como é favorito numa disputa com Joe Biden.

Se isso acontecer, resta estimar como os Estados Unidos se comportarão perante o Brasil.

É bem possível que Trump, de volta à Casa Branca, nos ignore.

Creio que ele encontrará “inimigos” mais importantes: China, França, etc.

Basta que Lula reconheça a vitória do republicano, sem repetir o comportamento de Jair Bolsonaro com Joe Biden (levou mais de um mês para fazê-lo), e as coisas seguirão seu rumo sem maiores incidentes.

Para Donald Trump, o Brasil não existe.

 

Ivan Sant’Anna

[email protected]

 

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  1. O texto ignora aspectos históricos da sociedade americana vividos na época dos fatos. Não se pode opinar sobre fatos de 200 anos atrás usando os valores de justiça e igualdade de hoje. Texto tendencioso e desonesto intelectualmente.

  2. O histórico das lutas e articulacoes que construiram a democracia americana só mostra que deve ser ela valorizada, mesmo tendo soluços pelo caminho, como foi o Trump. Aqui temos nossas mazelas com mo são o Bolsonaro e o Lula, dois fraudadores da democracia com instrumentos próprios pra buscar se manter no poder.

  3. Fiquei surpresi com a abordagem do artuculista. Fazer leitura de acontecimentos pretéritos, com mais de 1 século de sua ocorrência, usando entendimentos atuais, é no mínimo absurdo! A raça humana nunca foi homogênea, acrdito que ele saiba disso. Aliás, o processo evolutivo deixa isso bem claro.

  4. Excelente texto!! Parabéns pela coragem de expor algumas faces daquela democracia, onde a louvável liberdade sempre foi seletiva!

  5. EUA foram fundados como uma República, ser uma democracia liberal "perfeita" nunca foi ambição. Quanto à organização do estado pretendido criado, foi um triunfo absoluto.

  6. A justiça americana foi decepcionante em permitir que esse suíno Trump continue apto como candidato. Um cara que insuflou a invasão do Capitólio que resultou em mortes, um cara que tentou fraudar o resultado da eleição.

  7. Sem palavras com o raciocínio do articulista. Passa pelos seus devaneios que democracia é o governo da maioria ? que necessita de aprimoramentos ? e de que não deve ser um fim, mas um meio para que se assegure os direitos fundamentais do ser humano: vida , liberdade e propriedade? e que foram os republicanos , não os democratas, que defenderam a votação dos negros nos tempos de segregação? já leu algo sobre Zeitgeist - espírito de tempo? Acorda, Pedrinho.

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