O presidente Lula se olha no espelhoLula: apenas o poder pelo poder? - Foto: Reprodução/Redes Sociais

“Haddad, foi mal. Tava doidão”

É difícil encontrar uma explicação racional para a rasteira que Lula deu em seu ministro da Fazenda
02.11.23

O período de Jair Bolsonaro foi um desafio para analistas. Cada parada do ex-presidente no cercadinho era certeza de uma nova “bomba” que mudaria as projeções sobre o caminho que o governo percorreria, criando incerteza desnecessária e impedindo, muitas vezes, que o país tivesse aquela tranquilidade que se tem quando se sabe para onde se está indo. E nesta mesma estrada caminha Lula. Coincidência?

Desde a posse, foram os raros os momentos nos quais declarações fora de tempo ou de lugar não criaram desgastes desnecessários ou verdadeiros terremotos, como foi o caso da última sexta, 27. A fala desastrada sobre a meta fiscal abateu seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de forma quase definitiva e colocou em maus lençóis a pauta arrecadatória da qual o governo tanto precisa que o Congresso aprove.

Pode-se dizer que Lula verbalizou apenas o que todo mundo já sabia. Não há chance de déficit zero em 2024 com o atual estado das contas públicas e o governo não vai fazer corte de gastos em ano eleitoral. Lembrando que 2020 foi traumático para o PT, não tendo feito prefeito em capitais pela primeira vez desde a democratização. Mas a questão é: a declaração tinha que ser feita agora?

Assim como ocorria com Bolsonaro, observadores profissionais do processo político correram atrás das explicações. Qual teria sido o objetivo estratégico por detrás da fala de Lula sobre o não cumprimento da meta? Qual o grande movimento de xadrez que ninguém está vendo, apenas Lula? Estaria ele, generosamente, poupando Haddad do constrangimento de ter que dizer que não será desta vez que as contas fecharão no azul, como sugeriu a deputada Gleisi Hoffmann?

No caso do ex-presidente, em um determinado momento, os analistas perceberam que não havia necessariamente racionalidade em muitas de suas falas diárias. Percebeu-se que quem conferia sentido e estratégia ao que se passava era quem narrava o jogo, e não quem estava em campo. Tudo que Bolsonaro falava, de fato, o deixava 100% do tempo na mídia, mas não  necessariamente com uma mensagem para patrocinar uma política pública ou empurrar um plano. A narrativa quem construiu, de fato, foi a mídia.

Com a imagem de infalibilidade que Lula tem entre seus seguidores, vê-se uma verdadeira corrida para justificar uma fala que pode ter sido nada menos do que erro. Para onde se olha, não se vê um mísero ganho político do comentário infeliz. Pelo contrário, a completa desmoralização de Haddad obriga Lula a descer do Olimpo e a ter que se encontrar em pessoa com líderes partidários para negociar a pauta arrecadatória. Com o episódio, Lula também teve que assumir a cadeira de Haddad. Não foi ele que rasgou a meta? Então, só ele pode colocar outra no lugar.

Manuais de comunicação corporativa sempre consideram uma temeridade quando o presidente desce da montanha para frequentar a planície. O problema é a perda da institucionalidade do cargo e a retirada de anteparos que protegem Lula dos solavancos cotidianos da política e da economia. Eles foram bastante úteis, por exemplo, para o presidente por ocasião do mensalão, quando foi possível encontrar culpados no seu entorno. Imagine se o ex-deputado Roberto Jefferson, naquela oportunidade, tivesse dito que teria negociado o ingresso do PTB na base diretamente com o petista? A história do Brasil teria sido outra.

Por isso, sabe-se que, em política, falar é uma forma de agir e requer cuidado. Nesse sentido, é valioso o ensinamento do ex-presidente Michel Temer, quase um professor de etiqueta em assuntos institucionais, no qual “um presidente não fala, se pronuncia”. Se todo cuidado é pouco, portanto, por que, então, Lula não se emenda?

Aí vem à mente a famosa citação da ex-primeira ministra britânica, Margaret Thatcher, segundo a qual “estar no poder é como ser uma dama. Se tiver que lembrar às pessoas que você é, você não é”. Nesse sentido, o falatório tem o objetivo de lembrar constantemente quem Lula é e quem Bolsonaro era, não deixando espaço de dúvidas sobre onde o poder está. Nesse sentido, e essa é uma outra lição para analistas, uma maneira de ler o fato é esquecer a intenção e ver o resultado. E, no caso em questão da meta fiscal, ele é inequívoco: no seu melhor momento, Haddad foi destronado e não terá qualquer chance de sombrear Lula em 2026.

O objetivo de Lula teria sido colocar seu ministro no seu devido lugar? A confusão, então, visou apenas o poder pelo poder, mesmo que o efeito colateral tenha sido a perda de credibilidade da política econômica? É isso? Ou essa leitura está dando sentido ao que não tem? Dando conotação estratégica a uma simples barbeiragem? É difícil saber. Mas, talvez, no dia seguinte, Lula pudesse ter consertado tudo caso não tivesse se calado. Muita oscilação do dólar e da bolsa poderia ter sido economizada se ele tivesse colocado uma faixa na frente do prédio da Fazenda dizendo: “Haddad: foi mal, tava doidão”.

 

Leonardo Barreto é cientista político e diretor VectorRelgov.com.br

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  1. A cachaça durante décadas tem um preço. Luladrão não é só um degenerado moral. O pouco que resta da massa cinzenta está atrofiada e acha que um jogo de damas com copinhos de pinga e conhaque de alcatrão se joga xadrez 4 D. Pelo menos bolsonaro e a sua burrice eram mais inofensivos

  2. Para mim, são barbeiragens sim. Mas não sei até quando os escudeiros serão fiéis ao seu rei. Ou são tão "bananões" que irão engolir? Aí, arrisco dizer que a hora que Lula foi encontrar com dna. Marisa, o PT acaba.

  3. O Lula parece gagá, ou doidão, como queira. Assumiu a pauta econômica da Dilma e tá performando igual a ela

  4. Parece mesmo doidão, ou até gagá. Já tem um tempo que o Lula parece ter assumindo a pauta econômica da Dilma

  5. Concordo com a tese do 'doidão'. Tem muito tempo que o Lula parece estar gagá e até assumindo a pauta econômica da Dilma

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