A cracolândia em São PauloA cracolândia em São Paulo: é preciso combinar os direitos dos usuários com os dos moradores da região - Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Uma segunda chance para o centro das grandes cidades

É preciso prestar assistência aos indivíduos em situação de rua, mas sem ignorar os moradores, comerciantes e turistas que frequentam essas áreas
24.08.23

São Paulo é não apenas a cidade mais rica do país, mas o maior PIB da América Latina em termos municipais. A capital paulista, que vai além de ser um centro econômico, gastronômico e cultural, famosa por sua diversidade em termos de migração nacional e internacional, todavia está com a reputação cada vez mais desgastada, dado o número crescente de moradores de rua e o alastramento das cracolândias.

Quem visita o centro histórico da cidade não tem como evitar o sentimento de insegurança devido ao número assustador de cerca de 50 mil moradores de rua abrigados pela capital. Isso afasta diversas atividades econômicas, sobretudo o turismo. Porém, é certo que esse não é um problema exclusivo da capital mais rica do país. As cidades mais promissoras da Califórnia como São Francisco e Los Angeles, até pouco tempo atrás as queridinhas da costa Oeste americana também sofrem com a mesma degradação e mancha reputacional.

Comparar o Brasil com outros países é sempre um campo minado. Porém, é preciso entender que, mesmo quando se compara maçãs e laranjas, é possível encontrar similitudes que se aplicam à complexa questão que São Paulo enfrenta com o número crescente de moradores de rua e a cracolândia. É certo que as cidades californianas representam metrópoles globais, mas em níveis regionais, São Paulo tem a mesma força. As áreas que em São Paulo são chamadas de cracolândia, no centro de Los Angeles são o skid row.

Quem já visitou o centro de Los Angeles e o centro de São Paulo sabe que, para além da diferença linguística, há apenas a diferença geográfica – já que a insegurança impera em ambos os locais.

E se é possível encontrar razões semelhantes para a realidade das cidades mencionadas, para além da dependência química dos habitantes das zonas em degradação, é possível entender que o abandono tornou os locais chamarizes para pessoas em situação de rua.

No centro histórico de São Paulo, o engessamento decorrente dos tombamentos torna as ruas pouco atraentes para o comércio, que acaba buscando outras regiões. A grande quantidade de prédios públicos, que logicamente não funcionam aos finais de semana, torna a situação ainda mais insalubre para os moradores e comerciantes que restam.

Interessante que o mesmo engessamento ocorre no centro de Los Angeles, mas não necessariamente por tombamentos de natureza histórica. Grande parte do centro de LA está sujeito ao chamado controle de preços de aluguéis. Apesar de esta prática ser um dos poucos consensos do que não se deve fazer dentro da ciência econômica, os principais bairros da cidade estão sujeitos às amarras dessa regulamentação.

O resultado é que há desinteresse generalizado dos proprietários por alugar seus imóveis por um valor aquém do que lhes convém e com isso uma drástica redução da ocupação. Com menos moradores há menos comércio, que atrai menos moradores… fechando-se dessa maneira um ciclo vicioso.

Em LA, assim como em São Paulo, o abandono gradual e espontâneo leva ao povoamento por moradores de rua e usuários de drogas. É certo que a esses devem ser garantidos todos os direitos assistenciais mesmo que a situação em que se encontram seja com grande frequência resultado de escolhas pessoais. Ao mesmo tempo, é preciso combater com rigor aqueles que traficam drogras e praticam outros crimes nas mesmas áreas.

No livro San Fransicko: Why Progressives Ruin Cities (San Fransicko: Por que progressistas destroem cidades), o ativista ambiental Michael Shellenberger observa que advogados de direito civis nos EUA deixam sua tarefa pela metade ao procurar garantir os direitos constitucionais de moradores de ruas, sem no entanto criarem estratégias para que saiam da situação em que se encontram. “San Fransicko”, a expressão que ele usa em seu título, é um trocadilho que enxerta a gíria “sicko”, algo como “doente” ou “nóia”, no nome de uma das mais importantes cidades da Califórnia.

É certo que quem quer que esteja povoando as cracolândias precisa ter seus direitos à integridade física e moral resguardados. Isso não quer dizer que o problema não deva ser endereçado de uma forma que enfoque não apenas os indivíduos em situação de miserabilidade, mas também os cada vez mais raros moradores, comerciantes e turistas. Em suma, a cidade.

O importante também é que os embaraços regulatórios que impedem a presença de moradores, comerciantes e segurança privada advindos de tombamentos e regulamentações paralisantes sejam removidos para dar a essas regiões degradadas, mas cheias de história, uma segunda chance.

Os comentários não representam a opinião do site. A responsabilidade é do autor da mensagem. Em respeito a todos os leitores, não são publicados comentários que contenham palavras ou conteúdos ofensivos.

500
  1. Verticalização e adensamento podem ter custo menor e ganho ambiental maior, mas q qualidade de vida tem-se morando no meio do barulho, em prédios colados sem privacidade, sem verde e sem bater sol?

  2. EU TENHO A SOLUÇÃO PARA A CRACOLÂNDIA: O GOVERNO ESTADUAL FORNECER GRATUITAMENTE AS PEDRAS DE CRACK PARA OS USUÁRIOS. ASSIM SE ACABA A VIOLÊNCIA (ROUBOS E FURTOS) OS VICIADOS NÃO PRECISARÃO MAIS ROUBAR/FURTAR PARA COMPRAR A DROGA. SIMPLES.

  3. Morador de rua, de desajustados e desesperados a drogados zumbís, são seres humanos que existem em todas as democracias e precisam de ajuda...Nas ditaduras e autocracias, o problema também não é resolvido, é eliminado. Não cabe ao STF, através de decretos ilegais legislar sobre os problemas relacionados à essa tragédia. Devem ajudar a solucioná-los sem impor regras e pseudo-soluções. Uma delas é não soltar bandidos ligados ao tráfico de drogas como fez Marco Aurélio Mello com André do Val.

Mais notícias
Assine agora
TOPO