ReproduçãoJosé Dirceu e o advogado Kakay "fazem o L" em Paris: cadê a revolta?

O sono do gigante

Como os brasileiros podem retomar a força das ruas de junho de 2013, mesmo após o 8 de janeiro
08.06.23

O presidente Lula indicou seu advogado na Lava Jato para o Supremo Tribunal Federal (STF). Deltan Dallagnol, que comandou a maior operação contra a corrupção do país, teve o mandato de deputado cassado pelo TSE em decisão controversa, para a festa pública de José Dirceu e do advogado anti-Lava Jato Kakay. Os dois gravaram um vídeo “fazendo o L“, de Paris. A Lei das Estatais, uma das conquistas práticas da investigação, foi rasgada para que políticos possam ocupar cargos administrativos livremente e aquilo que ainda resta da Lava Jato está sob risco em seu nascedouro, com as revisões pretendidas pelo juiz Eduardo Appio, hoje afastado sob suspeita de intimidar o filho de um desembargador. Ainda assim, não há ninguém nas ruas. Se, ao longo dos últimos 10 anos, desde as Jornadas de Junho de 2013, os brasileiros tomaram  avenidas inteiras por muito menos, o que explica a apatia atual?

Boa parte da resposta vem do Supremo Tribunal Federal (STF). No início do ano, as pessoas que ainda permaneciam nas ruas, acampadas em frente a quartéis, foram retiradas por ordens judiciais após a invasão das sedes dos Três Poderes, em 8 de janeiro. Desde então, manifestantes pacíficos foram julgados com vândalos, sem distinção entre eles. Seus advogados e os defensores públicos, que se apresentaram para ajudar os réus carentes, reclamam da falta de transparência e do tempo exíguo para realizar as defesas. Com isso, muitos titubeiam na hora de voltar a gritar em público.

Mas o imobilismo se explica também por uma disputa política mais complexa. Surgiram fraturas entre a parcela da sociedade civil que se organizou após as Jornadas de Junho de 2013. O Movimento Brasil Livre (MBL), grande herdeiro dessas manifestações, chegou a aderir a um protesto em defesa do mandato de Deltan Dallagnol, agendado para o último fim de semana, mas se retirou após ameaça de boicote de grupos políticos que, até outro dia, compartilhavam a mesma trincheira. “Fomos chamados a participar dessa manifestação por Deltan Dallagnol, deputado que foi cassado em um ato de arbítrio do TSE. Prontamente, nos dispusemos a participar, a convocar participantes e a ajudar na organização. Infelizmente, a manifestação tem sido sabotada por algumas alas do bolsonarismo e nos rendido ataques”, explicou-se o MBL em nota, na qual atribui os ataques que recebeu ao medo do STF e ódio ao grupo.

O MBL termina a nota dizendo que “a luta contra o PT vai perdurar ainda por muito tempo, e teremos novas oportunidades para nos engajarmos na mobilização de rua”. Em entrevista a Crusoé, o deputado Kim Kataguiri (União-SP), a figura de maior destaque do MBL, disse que devem surgir nos próximos meses grandes manifestações de direita. “O governo Lula é um desastre politica e economicamente, e isso é receita para uma tempestade perfeita, para grandes manifestações contra o governo devido à insatisfação com política, economia e escândalos corrupção”, prevê. Após anos de atrito com o grupo de Jair Bolsonaro e dos desentendimentos entre a direita que emergiu após as Jornadas de Junho de 2013, a força do MBL nas ruas ainda está por ser testada.

Essa heterogeneidade e falta de sincronia que se verifica entre os vários movimentos da direita não se encontra na esquerda. Isso porque o PT sempre exerceu uma forte influência sobre sindicatos, movimentos sociais, ONGs e partidos satélites. Uma vez instalados no Palácio do Planalto, os petistas exerceram uma relação de simbiose com os demais, em que eles foram beneficiados em troca de manter a militância ativa. Esse método, que certamente não é republicano, foi bem-sucedido na maior parte do tempo. “A relação entre Estado e partido político, sobretudo quando o PT esteve no poder, era muito misturada. Você não conseguia ver onde a sociedade civil organizada começava e onde o partido político acabava, isso estava muito entrelaçado”, analisa Pablo Ortellado, professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (USP). “Não era uma relação muito saudável, porque a sociedade civil perdeu a independência. Ela estava muito  amarrada a um ator político institucional.” Jair Bolsonaro, por outro lado, não chegou a organizar e comandar toda a direita, pulando de partido várias vezes e brigando com vários aliados, que passavam a ser condenados como traidores. Esses desentendimentos agora cobram o seu preço.

Mas hoje, tanto a direita quanto a esquerda parecem cansados. “A esquerda perdeu um dos grandes capitais que tinha, que era o poder de mobilização”, pontua Leandro Gabiati, diretor da Dominium Consultoria. “Durante o impeachment da Dilma, vimos que quem tinha o poder de mobilização era a centro-direita, era a turma do verde e amarelo.”

Ao longo dos anos de Michel Temer e Jair Bolsonaro à frente do Palácio do Planalto, nem esquerda nem direita lograram promover grandes mobilizações como as de 2013. Bolsonaro conseguiu reunir apoiadores em datas cívicas, como o 7 de Setembro, e a eleição de Lula desencadeou a revolta que levaria milhares de pessoas a recorrerem aos militares como último recurso. O desgaste foi inevitável. “O poder de mobilização que Bolsonaro tinha não parece ser o mesmo hoje”, continua Gabiati. “Depois de todo esse processo, há uma frustação, tanto do lado de Lula quanto do lado de Bolsonaro, que precisou ceder à política tradicional.”

Como ficou claro, contudo, a alternativa de voltar ao passado em que a sociedade aceitava tudo o que vinha de Brasília não existe mais. O que seria necessário para que os protestos voltassem?

O deputado Kim Kataguiri (União-SP) diz que duvida que um barril de pólvora como aquele de dez anos atrás venha a explodir novamente — ao menos em um futuro próximo. “As pessoas agora têm posições políticas mais firmes, então um protesto tão disperso e amplo como foi o de 2013 eu acho difícil”, ponderou. Ele, no entanto, afirma que grandes manifestações de direita ainda estão no radar.

A aposta do deputado é que o grupo irá se renovar após as manifestações de 8 de janeiro deste ano, que descambaram na invasão e destruição às sedes da República. Organizados por redes sociais, dispostos a mudar a sua realidade com as próprias mãos, as cenas do início do ano são consequências diretas de 2013.

Para que essa recomposição ocorra, sem os excessos que levaram mais de 1.200 pessoas à prisão e à instalação de duas CPIs no Congresso e no Distrito Federal, é necessário, segundo parlamentares bolsonaristas, o sentimento de que a mera ida às ruas não será punida e um estímulo capaz de unir grupos que se dispersaram.

“Neste cenário jurídico incerto, em que a lei foi substituída pela vontade de alguns soberanos, é natural e perfeitamente compreensível que o temor tome lugar da bravura de ir às ruas”, diz o deputado Gustavo Gayer (PL-GO), que integra a base bolsonarista no Congresso Nacional.

Mas vamos voltar às ruas da forma como sempre fizemos: com famílias. Idosos, adultos, jovens e crianças com suas bandeiras do Brasil“, afirma o parlamentar. “Não podemos nos curvar.”

Para outros deputados do PL, só mesmo uma ordem de Jair Bolsonaro poderia fazê-los voltar a protestar. O ex-presidente tem, no entanto, procurado se afastar dos manifestantes que invadiram a Praça dos Três Poderes, chamando-os de “marginais“.

A gente só vai ter segurança para voltar às ruas no momento em que vier um chamado do Bolsonaro. Só isso traria a legitimidade necessária, pois ele é o presidente do partido“, diz o deputado Paulo Bilynskyj (PL-SP). “Sem isso, eu não me sentiria seguro. Dá até um gostinho de Venezuela na boca ao falar isso.”

O Brasil precisa hoje que as pessoas voltem a se manifestar, para que a democracia não seja totalmente solapada pelo antilavajatismo, por lobbies poderosos, por ideologias arcaicas ou pelo ativismo jurídico do STF.  Fazer isso de uma maneira que não coloque a democracia em xeque, instigando um golpe de Estado, é o grande desafio dos grupos e políticos que emergiram das Jornadas de Junho de 2013.

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  1. O BRASIL SE VENDEU AO CRIME ORGANIZADO EM TODAS AS ESFERAS DE PODER. PARA OS PODEROSOS BRASILEIROS O CRIME COMPENSOU.

  2. O atual cenario politico-policial deve-se a aliança bolsopetista de 2020. Vou para a rua, desde que não associem o protesto com qualquer coisa próxima a Bolsonaro.

  3. Bolsolulismo. Os dois lados se nutrem mutuamente, se autoestimulam, se completam no ódio recíproco, se justificam no outro. Não interessa jamais aos petistas a prisão de Bolsonaro, mas seria uma meia limpa para essa política sem luz no fim.

  4. Não concordo com que essa mobilização seja comandada por bolsonaristas, que covardemente nada fizeram para defender Dallagnol e a Lava Jato. Ou seja, os bolsonaristas não têm moral para comandar essa mobilização, por defenderem corruptos.

    1. Aloísio aterrise e responda .. O que os tais "bolsonaristas" fariam no caso? invadiam o TSE e trucidavam os ministros? Comprariam a corte pagando o triplo? Suicidariam em haraquiris em massa na praça dos pôdres poderes? Qual é mano?

  5. Sem dúvida que sem a pressão popular esse projeto de venezuelização do país, por parte dos ptralhas ancorados num congresso delinquente e num judiciário contaminado e promiscuído, será levado a efeito.

  6. Vamos esquecer Bolsonaro, o responsável pela volta do Lula . Que seja tornado inelegível para o bem do Brasil. Espero voltar às ruas pra tirar essa corja de vagabundos do governo e com pautas descentes e assertivas. Logo , logo o Brasil acorda . O Lula está trabalhando direitinho pra enfurecer o Brasileiro correto, descente .

  7. O q ocorre é q a parte equivocada da SOCIEDADE BRASILEIRA está ainda digerindo e metabolizando o fato de q inexistem """esquerda e direita""". Está digerindo a duríssima e desorientadora realidade de q marginais são sempre e p/ sempre marginais e, como tal, mercenários absolutamente incondicionais, q atuam apenas em proveito próprio, Ñ importando a vertente dessa subespécie. Quando terminar essa ""indigesta digestão"", haverá c/ a maior certeza uma reação c/ desdobramentos q ninguém pode prever.

    1. Que foto absolutamente interpretativa do cinismo de dois asquerosos maus elementos, de 2 repugnantes marginais à solta, tripudiando e debochando do POVO BRASILEIRO... a chocante realidade dessa subespécie à solta, deve-se à estúpida leniência, corrupção, desvario e prostituição do judiciário.

  8. Falta de habilidade política de Bolsonaro, direita rachada com intolerância dos radicais ignorantes, Suprema corte aparelhada, e temos todos os ingredientes para uma ditadura que já está acontecendo e que, como qualquer outra ditadura, se impõe na base do medo.

  9. Concordo com Kim. Acho que será necessário reorganizar a direita. Reunir todos os pontos em comum. Mas, enquanto Bolsonaro puder influenciar, esqueçamos. Ele é um cava.lo xuc.ro que quer se sobrepor a todos. Por outro lado, enquanto o povo der mais valor para seus heróis do que pela causa continuará sendo difícil. A maioria dos eleitores ainda se move por um populista.

  10. A foto que ilustra esta reportagem mostra como os que se locupletam com o nosso dinheiro estão sorridentes e felizes. É indecente, pornografica até. É intolerável ver o amante de Lenin (e seus mandamentos p/ tomar e manter o poder) e o puxa saco advogado dos poderosos, q compra todos, se divertindo na cidade luz. Não merecem, pois são engrenagens importantes do imenso sistema corruptor das nossas instituições. Nunca foram competentes p promover o crescimento, o progresso e o bem do nosso país!

  11. Precisamos de uma nova Constituição. Precisamos de voto distrital. Precisamos de "Performance Bond" nas contratações de obras públicas e sobretudo, precisamos legislações modificadas, tal que valham condenções em 2ªs instâncias, a nomeação de juízes p/ o STF tem que ser por notório saber, postura ilibada, sem indicação d presidentes, e os políticos corruptos têm q ser julgados, condenados e presos e não podem ser soltos por firulinhas jurídicas e desculpas esfarrapadas! Viva a Lava Jato!

  12. Se o bando no poder tornar o tolo Bolsonaro inelegível, se nomear o tal Zanin prá KGB digo STF aos manés caberá apenas pagar pelo triplo o preço que Lira, CAPACHeco e o Centrão nos venderão e rapidamente esta escória revoga de vez a Lei Áurea que já vem sendo revogada a conta gotas .. eu que tenho câncer que venço duramente não sofrerei basta interromper o tratamento pois com toda certeza o inferno será melhor que o chiqueiro que isto se tornará . viva a libertadora eutanásia !!!

    1. Sem dúvida ODETE o que escrevi de forma dura é para mostrar a cruel realidade de uma nação dividida mas ajoelhada a ditadores cruéis, assassinos e ladrões ... idoso e com problema grave que venço duramente se preciso ainda tenho coragem e força para em armas libertar o meu país de tanta opressão e um guerreiro morre lutando na cama nunca ... abraço.

    2. Eutanásia não é pra VOCÊ, COMPATRIOTA BRASILEIRO GUERREIRO LUTADOR E VENCEDOR!!! É para todos eles, quando já estiverem entrando pelas portas da cadeia que agora se abrem escancaradamente, embora não o percebamos com a desejada nitidez. O BRASIL ainda cumprirá sua ORDEM e seu PROGRESSO e NÓS OS DECENTES AINDA VEREMOS UMA BOA PARTE DESSA PREDESTINAÇÃO SE CUMPRIR. Segure firme, VOCÊ ainda combaterá por um tempo o NOSSO BOM COMBATE e colherá o EDIFICANTE, o ÓTIMO RESULTADO com muita alegria!!!

    3. Não faça isso, viva para ver e comemorar a reviravolta. Melhoras!

  13. ... o importante é que as ações e atitudes dos brasileiros a partir de agora, culminem com um posicionamento estruturado e forte para as eleições de 2026 onde deveremos focar a extirpação para sempre dos piores canceres que a sociedade brasileira produziu em seus anos de escuridão: Lula e Bolsonaro, dois incompetentes, corruptos e manipuladores não republicanos.

  14. Acabou gente, eleições serão uma farsa, a Venezuela chegou. Para apear esses bandidos do poder vai ter que ser na bomba e bala

  15. Manifestar-se para quê? 10 anos após 2013 o que sonhamos virou pó e os avanços se destruíram. O objetivo de vergar o povo foi conseguido.

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    2. E a mudança só seria possível com um engajamento e pressão popular constantes por largo período de tempo. O que, convenhamos, num país em que grande parte da população tem que matar um leão por dia, é completamente inviável.

    3. “O Sistema é foda, companheiro”. O Brasil é uma república psicopata onde os mais pobres pagam o luxo da burocracia famélica e voraz

  16. Fazer o L na direção errada não tem preço. Ou alguém sacaneou e inverteu a foto. L ao contrário é o L que "Loosers" fazem. Só que estes não perdem nunca por razões que sabemos.

  17. Prezados jornalistas. Por quê os brasileiros não se manifestam nas urnas? Por quê elegemos influenciadores digitais, celebridades instantâneas, personagens bizarros de toda sorte, lacradores , corruptos condenados, usuários de tornozeleira, milicianos , militantes travestidos de pastores evangélicos e tantos outros desprovidos de qualquer capacitação para o cargo? Esta é a grande pauta. As ruas? Ou as urnas? Nada senhores. Nada. Somos o que merecemos ser. O quê escolhemos ser. O quê votamos ser

    1. Dá vontade de chorar quando percebemos que o eleitor é apenas massa de manobra usada para validar o jogo do poder. Partidos endinheirados a serviço dos corruptos de sempre.

    2. Infelizmente, com o atual sistema eleitoral, os candidatos a deputado que se elegem não são os mais votados. Alguns, realmente eleitos, carregam a maioria dos sem voto que povoa as Câmaras Federal e Estadual. Sem o voto impresso não é possível auditar, verdadeiramente, o resultado. Hoje, me pergunto: Votar para quê, se o que vale é a vontade de uma casta de políticos profissionais com valores nada republicanos e democráticos?

    3. Exatamente assim !!! seremos o eterno país do "futuro" e que nunca virá sem a educação e civilidade de seu povo.

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