A volta ao mundo no AeroJanja

O assessor para assuntos internacionais da Presidência, Celso Amorim, viaja neste domingo, 11, à Noruega para participar de debates no Fórum de Oslo. A entidade, que recebe a maior parte de sua verba do Ministério de Relações Exteriores da Noruega, participa de negociações de paz em vários lugares do mundo, como na Venezuela e no Afeganistão. Em seu site de apresentação, o Fórum se gaba de ter, entre seus membros, diversos ganhadores do Nobel da Paz, como o ex-presidente americano Jimmy Carter e o colombiano Juan Manuel Santos. Embora não tenha sido divulgado qual seria o objetivo da viagem de Amorim, é bem provável que essa seja mais uma tentativa de Lula pavimentar o seu caminho para o Nobel da Paz — um sonho antigo do presidente que ele tentará alcançar fazendo uso de todos os meios possíveis.

Já em 2003, o primeiro ano de seu governo, petistas anunciaram aos quatro cantos a hipótese de Lula levar o Nobel da Paz. Apesar de o presidente não ter nada para mostrar no campo da paz, seus seguidores defendiam que ele teria condições de levar o galardão pelo esforço em erradicar a fome no Brasil e no mundo. Era a época do Fome Zero, um sucesso de marketing que, em menos de dois anos, seria abandonado por esbarrar na ineficácia administrativa e na corrupção.

A partir daí, ano após ano, a indicação de Lula foi ignorada pelo comitê de cinco especialistas escolhidos pelo Parlamento da Noruega. Mas a torcida não esmoreceu. Em 2019, com Lula preso na carceragem da Polícia Federal em Curitiba, petistas reivindicaram com estridência o Nobel da Paz para o ex-presidente. Eles tinham fé de que o prêmio seria dado a Lula porque ele seria uma vítima do então juiz Sergio Moro. A entrega do Nobel em Oslo, sem a presença do petista, causaria um enorme “constrangimento mundial”. A cena nunca saiu da imaginação dos seus apoiadores.

A partir daí, os clamores de um Nobel para Lula só aumentaram. Ele foi solto após o Supremo Tribunal Federal entender que Curitiba não era o foro correto para seu julgamento. Em 2023, com sua volta para o Palácio do Planalto, vários políticos e ministros passaram a pleitear o prêmio, por razões diferentes. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, insinuou que o fim do desmatamento ilegal poderia cacifar o presidente. As justificativas fornecidas pelos seus apoiadores, assim, sempre podem mudar, como o combate à fome ou ao desmatamento. Mas a verdade nua e crua é que não existe um feito que justifique o Nobel da Paz. O que há é a vontade entre seus apoiadores de que Lula o ganhe, seja por qualquer razão.

Com sua volta ao Palácio do Planalto em janeiro, Lula tentou se colocar como um possível mediador pela paz na invasão da Ucrânia, o que finalmente lhe daria um motivo razoável para que ele levasse o prêmio tão almejado. Para ganhar um Nobel da Paz, afinal, é preciso ir contra as guerras. Mas o presidente trocou os pés pelas mãos ao dizer que os ucranianos desejam o conflito e que a culpa é da Organização do Tratado do Atlântico Norte, a Otan. O fato de que a Noruega é parte da Otan certamente não ajuda, mas como a decisão final cabe unicamente a um comitê limitado de especialistas, qualquer decisão é possível.

Seja como for, os pagadores de impostos brasileiros é que financiarão a ambição do presidente, como já fizeram no passado. Durante os dois primeiros mandatos de Lula, o Itamaraty abriu 68 embaixadas e consulados pelo mundo. O objetivo foi o de projetar influência em várias áreas do globo, mesmo que sem qualquer resultado prático. Além disso, Lula realizou 267 viagens internacionais, cerca de três por mês, passando por 83 países (quase a metade dos 193 membros da ONU).

Para realizar esse périplo mundial, Lula aposentou em 2005 o antigo Sucatão — um Boeing 707 que transportou vários presidentes desde 1986 — e comprou um Airbus A319CJ, logo apelidado de Aerolula. O valor foi de 56,7 milhões de dólares, mas uma reforma de 13,5 milhões de dólares foi necessária para incluir uma suíte presidencial.

Ainda que o Aerolula tenha vida útil de trinta anos, o que lhe garantiria mais dez de atuação, o presidente quer substituí-lo por outro com maior autonomia de voo. O Aerolula só consegue voar 8,5 mil quilômetros sem reabastecer. Por causa disso, na viagem presidencial ao Japão, a comitiva precisou parar em Guadalajara, no México, e no Alasca. Na ida para a China, foi preciso descer em Lisboa e em Abu Dhabi. Lula já reclamava antes que achava isso humilhante e agora, com 77 anos, está menos disposto ainda a ter de encher o tanque pelo caminho.

A vontade de Lula é transformar um dos dois jatos A330 da Força Aérea Brasileira, comprados pelo governo de Jair Bolsonaro no ano passado, para fazer o seu transporte. Lula quer uma suíte com cama de casal, banheiro com chuveiro, um escritório, uma sala de reuniões e 100 poltronas para levar sua comitiva e jornalistas. Com maior autonomia, seria possível ir até Washington sem reabastecer. A aeronave já foi apelidada de AeroJanja, uma vez que a primeira-dama tem acompanhado sempre o presidente no exterior e se mostra muito exigente com conforto, como se constatou nas compras de móveis sem licitação para o Palácio da Alvorada.

A adaptação dos aviões da Força Aérea Brasileira, FAB, ainda não foi decidida. Caso não seja aprovada, ainda existe a possibilidade de se adquirir um avião novinho em folha. A FAB ainda não iniciou o processo de cotação, nem para reformar um dos A330, nem para comprar um avião novo.

De qualquer forma, ao que tudo indica, o sonho de Lula de ganhar o Nobel da Paz continuará sendo pago pelos brasileiros.