Foto: Adriano Machado/CrusoéLira e Lula: a caminho de uma composição

Do petrolão ao orçamento secreto

Para pagar dívida de Bolsonaro a amigos, Lula manda doar R$ 9 bilhões em emendas do relator
11.05.23

Na política brasileira, promessa nunca foi, não é nem nunca será sinônimo de dívida. O governo Lula, em marcha batida para repetir o antecessor pela necessidade da precisão e da clareza de acrescentar o prefixo des, que sinaliza negação, ou seja, desgoverno, confirma tal constatação como era esperada, mas com uma acelerada pressa de decepcionar. Confirma-o notícia, dada pelo Estadão, de que sua excelência insolentíssima, na chefia do Executivo, mandou ao ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (vulgo “vai pra casa”), descumprir sua ordem anterior de congelar o pagamento das emendas do relator do infame orçamento secreto. Para não haver dúvida determinou que o próprio e o chefe da pasta das Cidades tirassem do congelador R$ 9 bilhões de infâmias herdadas do desgoverno anterior. A desordem atropela determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), para cujos membros na República (coisa pública) só se desembolsa erário com transparência de origem e destino. Orçamento secreto nega, conforme quaisquer lógica e vergonha, o princípio mais fundamental para todos quantos administrem os cofres da viúva.

No caso, como diria o ex-sindicalista do alto de seu vernáculo de vocábulos exatos e com pudor (sqn), o buraco é bem mais embaixo, no subsolo. Para vencer a disputa nas urnas eletrônicas contra o mau militar que se habilitou ao cargo Luiz Inácio prometeu pôr fim à desordem institucional e à violência brutal do regime negacionista. Nesse, vacinas matam em vez de salvar e orçamentos devem ser públicos para esconder e proteger os desgovernantes que se habilitam a embolsá-lo. Contra a tirania do ódio foi prometida a democracia do amor. E essa está violando o princípio fundamental da igualdade, que é o de garantir ao pagador a entrega do produto prometido em troca do dispêndio. Com o perdão da imagem desaforada, o orçamento secreto agrava o estupro da transparência orçamentária com o cinismo de que nem todo ditador abusa. E tudo foi praticado na base do cochicho, do fuxico fiscal. A ordem de congelar foi secreta e a de honrar a dívida com o contribuinte, ou melhor, pagante, não foi publicada no Diário Oficial, mas em mais um furo da imprensa alerta.

Pública mesmo foi a ameaça que levou o chefinho do PT a jogar no lixo o vitupério lançado (e merecido) para a prática. O chefão da câmara dos líderes de bancadas partidárias, às quais o pobre cidadão não tem acesso, avisou que o desgoverno não teria como se livrar do sufixo se não rezasse na cartilha do Centrão dos cambalachos. Esse se deslocou para o sertão das Alagoas. Arthur Lira, o profeta dos fatos previsíveis, avisou que o congelamento secreto derreteria as pretensões governistas em votações de plenário, nos quais o desgoverno tem minoria de votos parlamentares: a tentativa de desfazer o pacote sanitário e se desviar as intenções desgovernistas para o combate ao lorotário das fake news. O desmanche da vontade de el Rey e seus súditos foi acachapante. E, mesmo sem superar os bilhões do petrolão, por ele próprio dito “o maior caso de corrupção da História”, recebeu, ora, vejam, a unção papal.

De super, o desgoverno da falsa democracia do desamor só tem mesmo a ocupação da Esplanada dos Ministérios com suas 32 pastas (ou seja, 64 patas dos bípedes na chefia). E a gula desmesurada de teúdos e manteúdos dos saldos da derrama fiscal, que faz parecer os quintos que despertaram a indignação dos mineradores das Gerais abaixo de “ouro de tolo” e virar “mina de tolo”. A presença displicente do general com nome de poeta e barriga de chope na invasão dos golpistas fracassados da direita estúpida em 8 de janeiro último (que assim seja) está à espera de boas explicações a serem dadas pela plena divulgação dos vídeos da desordem. Que, grazie Dio, não caiu no sigilo (olhe-o aí de novo, gente boa) tentado pelas pretensas vítimas, mas felizmente não obtido, de cinco anos.

Num cenário de horror desses, aliás, somente uma mentalidade colonizada e desinformada poderia atender ao convite de coroação de um monarca, deixando desempregados à matroca do lado de cá do grande mar. O cafona e apagado coroado (Carlos Terceiro, para quem não chama Henrique Oitavo de Henry the Eighth). Isso aconteceu, quem sabe, por cobiçar o cargo do coroado no silêncio compartilhado com Janja. Sem se tocar que o Reino de fato desunido não passa de um império decadente. Mas ainda assim conhecido como a “pérfida Albion”, denominação clássica de Grã Bretanha desde os tempos da hoje pequena Grécia. Poucos comensais das visitas, pagas pela massa iludida ou não às ditaduras fascistas e escravocrata da China e dos Emirados Árabes Unidos, não terão sequer um dicionário à mão para explicar ao cara que subiu a rampa que “pérfida”, apesar de ser proparoxítona, não abriga nenhum elogio. O capitão-terrorista diria que o casal real, coitadinho, é feinho. Mas feio mesmo é cruzar o Atlântico para ver um diamante, do qual a África do Sul reclama a posse, na cabeça de um desgovernante incapaz até de esclarecer que não pode dar as esmolas pedidas de mão estendida.

 

José Nêumanne Pinto é jornalista, poeta e escritor

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  1. Texto excelente ao qual respeitosamente coloco meu pequeno reparo: o uso de termos mais eruditos e menos coloquiais pode impedir que o oportuno recado seja compreendido pelos indigitados inseridos no contexto…

  2. Pegou bem Nêumanne. Ainda não tinha lido nada sobre a coroação de Charles, the Third. Já sobre as barbaridades da nossa comitiva de orangotangos li e ouvi bastante. E me senti envergonhada. Enfim, "God save the Janjo".

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