Foto: Adriano Machado/CrusoéLira e Lula: a caminho de uma composição

Naufraga primeira tentativa de aproximação entre Lula e Lira

PL das Fake News mostra que o governo não pode tudo, que Lira não pode tudo e que ambos devem ser mais criteriosos ao definir as pautas do parlamento
04.05.23

Maquiavel ensinou que, em política, não importa a intenção, mas os resultados. Nesse sentido, não há como virar o rosto para o que a primeira aproximação entre Arthur Lira e Lula conseguiu: reenergizar a militância de direita e bolsonarista (são coisas diferentes) às vésperas da CPI de 8 de Janeiro.

Além de comprovar a hipótese do presidencialismo de “trincheiras” que temos discutido no qual, hoje, nem Lula tem base, nem Lira consegue avançar uma agenda autônoma ,  o caso sugere que a exclusão das Emendas do Relator (Orçamento Secreto) do arsenal dos presidentes da Câmara e do Senado pelo STF mais enfraqueceu o Legislativo que devolveu poder de iniciativa ao Executivo. Assim, se criou uma situação semelhante à guerra de trincheiras vivida na Europa na 1ª Guerra Mundial, entre 1914 e 1918, em que o vencedor foi quem se exauriu por último.

Há boas perguntas a serem feitas quanto aos eventos de 2 de Maio, que podemos colocar na mesma categoria de importância de 8 de Janeiro do ponto de vista político.

A primeira é por que trazer uma pauta dessa natureza agora e com pouca discussão? Mesmo que a questão das Fake News seja uma agenda de primeira importância, ela é grande e polêmica demais, como se viu. Além disso, não era um tema declaradamente prioritário de Lula ou Lira e não altera o panorama macroeconômico de geração de empregos e renda, que o presidente pontua corretamente como seu grande objetivo.

Há pelo menos cinco hipóteses que não se excluem:

1.      A aprovação ajudaria a inibir a atuação bolsonarista (principalmente) nas redes sociais e permitiria que a CPMI de 8 de Janeiro ocorresse em clima mais tranquilo;

2.      Embora não fosse uma agenda prioritária, a promessa da regulação foi feita a estratos políticos, burocráticos (o STF) e sociais que apoiaram o presidente nas eleições de 2022;

3.      Lula foi induzido ao erro pelo clima político gerado após o atentado contra crianças em uma creche em Santa Catarina, que despertou a solidariedade entre adversários partidários. Em entrevista coletiva no Planalto na tarde da não votação, o presidente, no entanto, já demonstrava que tinha dúvidas quanto ao processo, dizendo que não queria interferir no que a Câmara decidisse. Apesar do discurso, o Planalto liberou verbas de emendas como uma maneira de auxiliar Lira;

4.      Nesse sentido, o presidente da Câmara subestimou a pressão dos eleitores sobre deputados de direita. Além disso, pode ter superestimado o valor das emendas já que, hoje, cada parlamentar tem R$ 60 milhões à sua disposição, independente de como votar. Lira, com o objetivo de cumprir acordo firmado com o governo, deu o primeiro passo de aproximação para a construção de uma aliança e escolheu um tema capaz de mostrar, na sua avaliação, o seu poder de entrega;

5.      Por último, mas muito importante, alguns dos maiores veículos de mídia pressionaram claramente em favor da medida. Mostraram parceria com o governo não apenas porque o projeto prevê que a imprensa tradicional seja remunerada pelas plataformas digitais, como também porque o PL abre a perspectiva de concentração do universo de notícias, reduzindo a competição com indivíduos e grupos recém-chegados, que abalou o modelo financeiro das empresas tradicionais.

O fato, no entanto, é que todos os envolvidos perderam. Lula mostrou que não tem base (embora haja disposição entre deputados e senadores para colaborarem em outros temas). Lira viu risco em cumprir o acordo e tentou, em um último movimento, demonstrar governar a Câmara coletivamente, deixando as decisões para os líderes e fazendo um reposicionamento de imagem. As TVs perderam e até mostraram um certo desespero ao fazerem um movimento coordenado com tom de chantagem ao final do dia dizendo que se o Congresso não votasse a lei, o STF faria algo mais rígido por sua conta. Perderam Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação), Flávio Dino (Ministério da Justiça), Wadih Damous (Secretaria Nacional do Consumidor) e Randolfe Rodrigues (líder do governo no Congresso). As plataformas também perderam porque ficaram expostas e esgotaram o que restava de interlocução com o governo.

Embora o cenário seja ruim, o governo e o Congresso terão outras chances de fazer uma aproximação. Os veículos de mídia que entraram na campanha podem fazer mea culpa da cobertura nacional parcial que deram ao tema ou podem tentar formas de financiamento estatal para se levantar. Lira pode ser pressionado a respeitar mais os ritos da Casa, de modo que alguns itens do PL podem ser aprovados separadamente ou mesmo regulados pelo STF, sob artilharia das redes bolsonaristas e de deputados de direita.

Ainda assim, olhando para o futuro, o principal ensinamento para políticos e para a sociedade que acompanha o processo decisório é que o governo não pode tudo, que Lira não pode tudo (grande novidade, sem ironia), e que ambos devem ser mais criteriosos ao definir as pautas do parlamento. Para hoje, no entanto, precisarão lidar com a colheita do que plantaram, isto é, um cenário político muito ruim, com muitas redes militantes reativadas, para a CPMI do 8 de Janeiro.

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  1. Por trás de todo esse esquema, giram, pelo menos 25 bilhões de reais que os sedentos veículos de comunicação, pressionam para que Lula, finalmente, abra os cofres do tesouro e das estatais, para irrigar os cofres das grandes redes de rádio, jornais e TVs, após 4 longos anos de infortúnio financeiro. Lula já deu às ordens: pague-se tudo a todos, e logicamente, aquinhoem-se os veículos da família Marinho, com prioridade e benevolência. Esse é o Brasil que a mídia ansiava por voltar.

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