Lula Marques / Agência BrasilO presidente da Câmara, Arthur Lira, em coletiva de imprensa no salão verde

Quem manda mesmo é Lira

Em teoria, Lula foi eleito para governar o país, mas o todo-poderoso não é o presidente eleito e, sim, o chefão do Centrão, ás do baralho de Bolsonaro
31.03.23

Alguns ingênuos, entre os quais o autor destas linhas, conviveram com a ilusão, não propriamente doce, mas na certa digna, de que a passagem da faixa presidencial em 1.º de janeiro de 2023 significaria a substituição no volante da República da direita negacionista pela esquerda voraz. O ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema, hoje do ABC, bateu o recorde de ocupação de pastas ministeriais na esplanada de Lúcio Costa, mas isso não quer dizer muita coisa nos primeiros três meses de sua gestão assumida para durar quatro, quiçá oito Páscoas. Um péssimo exemplo que poderia negar essa afirmação decerto a confirma. Um desses serelepes ocupantes dos prédios envidraçados desenhados por Oscar Niemeyer, o ex-governador do Maranhão Flávio Dino, acaba de aparecer como a primeira vítima da arapuca do falso empoderamento da burocracia da nebulosa fantasia socializante. Ele informou à plebe que a Polícia Federal (PF) sob ordens de sua jurisdição, desbaratou um plano para sequestrar e matar dois inimigos na cúpula do Judiciário, encarregados de combater o crime organizado, o promotor paulista Lincoln Gakiya e o juiz paranaense Sergio Moro.

O desconhecimento do político nordestino a respeito das atividades do grupo criminoso paulista permitiu ao membro do venturoso e adiposo primeiro comando federal misturar alhos com bugalhos. O membro do Ministério Público é inimigo figadal da referida quadrilha, pois a combate há 20 anos, sendo o principal responsável pelas derrocadas que lhe foram impostas pelo trabalho da promotoria. Aprisioná-lo para depois executá-lo seria um feito memorável para os primeiros mandatários do sistema prisional nacional e valeria o investimento milionário necessário para o êxito da operação mortífera. Político de baixa envergadura, o conterrâneo de Gonçalves Dias (“viver é lutar”), contudo, não seria capaz de responder à crítica que o ex-presidente do Tribunal de Justiça do Trabalho Almir Pazzianotto disparou no programa Dois Dedos de Prosa do canal de YouTube deste jornalista de ofício. “O PCC não teria por que matar Sergio Moro”, disse o brilhante advogado, que, exerceu, entre outros cargos, os de advogado do mesmo sindicato que o atual chefe do Executivo presidiu nos anos 1970 no ABC e também secretário paulista e ministro do Trabalho. De fato, Moro foi ministro da Justiça no desgoverno Bolsonaro e, na ocasião, assinou portarias transferindo chefões do grupo criminoso para presídios federais de segurança máxima. Com a prática conseguida em anos de convívio em celas, os comandantes e comandados do PCC aprenderam o suficiente para saber que o magistrado paranaense sempre foi e é ainda o inimigo preferencial do número um de nossa triste República. Mas nada fez, pessoalmente, de tão grave, para justificar o dispêndio milionário do resultado de seus furtos financeiros num seqüestro seguido de morte, de complicadíssima e, sobretudo, vultuosíssima execução. A prática de Pazzianotto em júris permitiu-lhe, porém, encontrar, a exceção que confere a regra: só se alguém com muito dinheiro financiasse a operação. Batata!

Lula da Silva, que dificilmente terá lido Aristóteles, Santo Agostinho ou Santo Tomás de Aquino, dedica-se atualmente, já que seu Corinthians nem sequer chegou à final do paulistinha contra o Palmeiras, a atropelar os anúncios comemorativos da vitória da PF sob gestão de seu ministro da Justiça e, lembre-se, da Segurança Pública. E apregoou aos fiéis na porta dos sindicatos tornados igrejas pelo PT à época da Teologia da Libertação, que tudo não passava de uma “armação” de Moro, um dos nove magistrados que o condenaram por excesso de provas. Assim como por excesso de provas foi absolvido pelos seus apadrinhados da cúpula judicial.

Nesse ínterim, o chefão do Centrão, ocupa-se em esclarecer para o ocupante do outro lado da Praça dos Três Poderes que na vida real manda o Legislativo, ou melhor os nobilésimos senhores deputados federais. De saída, usou a aritmética simplória de papel de bodega para provar ao salvador da democracia do amor que chefia o ódio a Moro, esquecendo os outros oito que o sentenciaram, que Sua Excelência Excelentíssima, glória, glória amém, não tem votos para aprovar uma coisinha corriqueira alguma que dependa de metade dos presentes no plenário de sua corte mais um.

Depois, para mostrar que não estava para brincadeiras de amarelinha, pulou direto para o céu, pisando no poder da Constituição para reduzir o Senado, representante das unidades da Federação, a sua condição corriqueira de banco de reserva da Casa Legislativa com mais membros. Em vez de direitos, algarismos. Carta Magna, uma ova de esturjão! Sob o controle do Centrão de Lira, Valdemar e Ciro, quem obedece ao coroné das Alagoas tem o prato cheio dos orçamentos secretos do tratoraço a seu dispor, seguindo a ordem arquitetônica do comunista Oscar Niemeyer. O Senado não é a cumbuca virada? Apois! Ao sair de alguma sessão deliberativa, o filho do ex-senador João Lira, aproveitou para submeter o livro sagrado da democracia de ordem e progresso, exaltado pelo Dr. Ulysses Guimarães e outros resistentes contra a ditadura que o capitão-terrorista venera, a um picotador de papel e ao poder ígneo de seu isqueiro de ouro. Este o ex-presidente trouxe da Arábia dos oásis e dos metais apreciadíssimos.

Lula está para Lira, o ele do ele, assim como Dino está para o próprio Lula. E, por isso mesmo, o Lula do Lira aproveitou para queimar com a Constituição aqueles pactos de frente amplíssima com os quais preencheu ministérios sem poder e ministros que, em vez de força, têm pompa. O notável José Guimarães, líder do governo da democracia da paz e do amor ao metal reluzente e vil, não conduziu o rebanho para restaurar os princípios democraticíssimos da nobreza do Senado, herdada das conquistas romanas que construíram a unidade do Velho Continente, avô do Novo. E a contagem de votos para a vitória que o conterrâneo do marechal Floriano, inspiração dos tiranetes em cujo breviário a direita estúpida reza venerando o bezerro de ouro nas barbas de Moisés e evita o castigo da chibata do Cristo nos mercadores do templo. O resto é lorota simplória para ser transformada por Fred Wassef e Tacla Duran em dinheiro vivo e leis mortas sem penas a punir.

 

José Nêumanne Pinto é jornalista, poeta e escritor

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  1. *Direita negacionista = muitas coisas "científicas" hoje estão sendo revistas, desmascaradas ou rejeitadas * esquerda voraz = ladrões de dinheiro público (e futuro privado)

  2. Eu acho que Lula não termina esse mandato e torço também para que a justiça enquadre o Bolsonaro. Não custa sonhar …

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