Ricardo StuckertLula com sindicalistas: a campanha de 2022 não terminou, e a de 2026 já começou

A esperança está por um fio

Ou se articula agora uma oposição democrática — mesmo que pequena — ou nem em 2030 será possível ter esperanças de um governo não populista
27.01.23

Não há democracia sem oposição democrática. Nenhuma democracia do mundo chegou a ser uma democracia liberal (ou uma democracia plena) sem oposição democrática. Eis o nosso problema. Onde está nossa oposição democrática? Quem a representa neste momento (em que muitos democratas foram engolidos pela grande baleia governista)?

Por certo, oposição não se faz apenas no parlamento, mas se uma oposição democrática liberal (quer dizer, não populista) — que se diferencie da oposição antidemocrática bolsonarista — não conseguir se articular no Congresso, a situação ficará ainda mais difícil para a democracia no Brasil.

Apenas para dar um exemplo. O governo Lula prepara um projeto de lei, PL, para flexibilizar a Lei das Estatais, abrindo espaço para a indicação de aliados aos conselhos e a cargos nas diretorias. Se ninguém gritar, vai fazer o mesmo contra os marcos legais do saneamento, da responsabilidade fiscal e das agências reguladoras. Mas quem vai gritar? Se não houver uma oposição democrática não populista, praticamente ninguém.

Ou se articula agora uma oposição democrática não populista — mesmo que pequena para começar, não importa — ou nem em 2030 será possível ter esperanças de um governo não populista.

Haverá, entretanto, alguma dificuldade para fazer isso. Parte do chamado mundo político, inclusive grandes meios de comunicação que viraram veículos chapa-branca, difunde a ideia de que todos devem se juntar à Lula, do contrário não será possível limpar as instituições do bolsonarismo, evitar novos movimentos golpistas e reprimir o terrorismo. Segundo esse “consenso”, que está sendo forçado diariamente, nossa tarefa seria passar os próximos quatro anos criticando o governo que saiu (e nos abstendo de criticar o que entrou), do contrário o bolsonarismo volta. E qualquer oposição democrática seria inconveniente, pois Lula já representa um governo de união nacional para reconstruir o Brasil e resgatar a democracia.

E o próprio PT, enquanto isso, vem insuflando sua militância – o que inclui seus parlamentares eleitos – com ideias abstrusas: de que o único partido que representa os interesses do povo é o PT, de que Lula é a própria democracia e uma espécie de síntese do nosso povo, de que só a esquerda (quando hegemonizada pelo PT) está certa e todos os demais atores políticos são agentes das elites ou golpistas (a menos que tenham sido alugados para fazer maioria no Câmara e no Senado, aprovar projetos de lei de interesse do governo e, em última instância, é claro, impedir um impeachment).

Aos poucos vai ficando claro o significado do que chamam de “governo de transição”. Será uma transição, sim, mas para outro governo do PT (ou da esquerda satelizada pelo PT). Aliás, a campanha de 2022 não terminou (pois Lula ainda não desceu do palanque) e a campanha de 2026 já começou (é uma transição: para outro – ou o mesmo – palanque).

Por isso, Lula ainda não desceu do palanque onde exercita seu modo revanche de fazer política, reescrevendo a história em cada declaração, feita no país ou no exterior, para alimentar a guerra. Repete uma conversa ressentida e vingativa de que o PT foi vítima de um golpe de Estado desferido pelas elites. Ainda que essa conversa não vá convencer os que não votaram nele (que vão ficar mais revoltados), nem os que só votaram nele para impedir a reeleição de Bolsonaro, ela esteriliza o ambiente: os que votaram em Lula como veto a Bolsonaro tendem a ficar desiludidos com a política e só vão passar a questionar o governo com mais vigor se houver uma oposição democrática visível, sobretudo no parlamento federal.

É uma hora difícil porque os parlamentares eleitos dispostos a exercer uma oposição democrática são poucos. Nestas circunstâncias, não havendo força para apresentar chapas independentes para disputar a condução das casas legislativas, parece que não há saída a não ser aproveitar a oportunidade da eleição das mesas diretoras da Câmara e do Senado para fazer uma aliança tática com Lira e Pacheco, derrotando e isolando os candidatos alinhados ao bolsonarismo e, com sorte, galgando alguns postos que ajudem a dar maior visibilidade (além de fornecer instrumentos de articulação) a uma proposta democrática não populista.

Uma aliança tática com Lira e Pacheco, entretanto, não pode ser uma aliança com Lula (que, no caso, significa subordinação). Ao que tudo indica Lula ainda não entendeu — e não vai entender facilmente, porque não quer entender — que é presidente do Brasil e não da sua facção. A facção é tudo, a parte predestinada à supremacia substitui o conjunto. O sonho do PT é transformar a população em simpatizante do partido (e a população aqui inclui os seus representantes no parlamento). É assim que o partido entende o conceito de hegemonia: como hegemonismo. Ocioso dizer que esse é um sonho de raiz totalitária, como percebeu Hannah Arendt (1951) estudando a Schutzstaffel, ou SS, a polícia de Estado nazista.

Ainda que o regime brasileiro, sob o domínio do populismo lulopetista, não vá virar um regime totalitário, nem mesmo autoritário, é quase certo que ficará ainda menos liberal do que já é, depois da experiência trágica do populismo iliberal bolsonarista.

Há uma esperança, sempre há uma esperança. Mas ela está por um fio. Neste momento a parcela da sociedade que toma a democracia como valor universal e principal valor da vida pública tem que conversar com seus representantes. Se quem for capaz de entender a situação não se mexer, esse fio se romperá.

 

Augusto de Franco é escritor

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  1. Infelizmente a única oposição que existiu é do PT, que quando não está no governo é contra tudo e todos. Vamos ver se o PL continuará oposição ou se vai se vender por alguns cargos.

  2. Lula, é a única esperança dos brasileiros: estávamos num momento complicado de ter um ditador igual a Venezuela por anos no poder da república. Com a garra de mais de 60 milhões de votos elegemos o nosso presidente Luiz Inácio lula da Silva. Todos tem que ajudar o nosso presidente. Principalmente à imprensa. Que corria risco de ser sessáramos suas opiniões de liberdade 🗽 de expressão. Obrigada Deus , por trazer o Luís Inácio lula da Silva de volta .

    1. Não li isto!! Meu Deus!! Misericórdia de nós!! Meu querido, quem ama a Venezuela é seu presidente, LULA AMA MADURO e o que MADURO faz. Vc precisa ler mais… Saia da Seita Lulopetista antes que seja tarde… POBRE BRASIL!!

  3. Luladrão, o descondenado, nunca desceu do palanque, salvo quando esteve, muito justamente, preso em Curitiba. Durante 14 anos, dia sim e no outro também, foi nauseante assistir ao noticiário. Era o bêbado a deitar falação e grosserias ou Dilma a dar pedradas na lógica, no bom senso e na educação. Mas era tão burra que chegava a ser engraçada. Mas o fio de esperança é a saúde precária do cachaceiro.

  4. A oposição democrática tem de surgir na sociedade - como um valor, uma cultura e uma linguagem - antes de que possa se tornar uma força política. Uma linguagem política, por exemplo, capaz de desmontar a pretensão dos raivosos e ideológicos de enxergar raiva e ideologia em tudo, e com isso reproduzir a polarização. A falsa linguagem política falseia apenas a realidade e o outro. Falseia sobretudo a própria consciência.

  5. Este é provavelmente o pior artigo que Augusto de Franco já escreveu. Raivoso, sectário, ideológico ao extremo. Artigo de direita, de oposição precoce, cega e surda à realidade do governo mais democrático já constituído no Brasil, com a maior representatividade sociopolítica. Jamais houve um governo com tantas mulheres, negros, indigenistas, políticos de todos os matizes, com exceção de extremistas de direita. O artigo é falso do início ao fim. Oposição precoce. Quase uma ejaculação política.

    1. E jamais teve tantos corruptos por metro quadrado nos Ministérios e por consequência nas estatais brasileiras. Triste assim!! 🤮🤮

  6. A política brasileira sempre viveu disso: ficar falando mal do governo que saiu e exaltar quem está chegando. E nesse círculo vicioso, quem perde é o Brasil, como nação e o povo, que fica amarrado em discursos vazios. Ótimo artigo Franco.

    1. Discordo. Qual foi o governo brasileiro que teve a diversidade ideológica dessa Frente Ampla e Democrática? Esse é um governo de reconstrução e união pós-desgoverno de destruição e extremismo negacionista. Discursos meramente ideológicos apenas capturam no noticiário o que lhes serve de apoio, negam a complexidade da realidade. É o caso do artigo de Franco.

  7. Sim existe 1 fio de esperança. Ele precisa ser ampliado, produzindo em larga escala e urdido no meio de toda a população brasileira e trançado p/ formar tecidos q esclareçam a maior parte da população brasileira dos males do populismo e da corrupção e isso precisa ser feito c urgência. Sugiro aos novos candidatos que teçam sistemas de divulgação acessíveis à toda população brasileira: o que escreveu Luiz Felipe D'Ávila em seu livro "Dez mandamentos: do país que somos ao Brasil que queremos".

  8. Mais uma,Guto. Não há saída.. tamos mesmo é fu… Em todo o caso, vc significou até agora, nesta edição praticamente sem quequase ninguém a lêsse, o único artigo digno de nota.. ora viva.. VC TEM TOTAL RAZÃO..

  9. Meu caro Augusto, a oposição, a situação, o mando, a decisão de tudo neste aparvalhado ambiente brasileiro está em duas mãos: a direita e a esquerda do Xandão. E tão-somente.

  10. Me indiquem um político com este perfil democrático ..autêntico.que esteja alerto para apoiar os acertos e denunciar os abusos..me indique..juro que vou apoia.lo.

  11. A oposição democrática e séria, porém pequena, já existe e não para de dar resultados: Kim Kataguiri. Melhor parlamentar do país, oposição ao populismo e à farra dos privilégios de todas as cores, do bolsonarismo ao petismo.

    1. Concordo Anna, Kim é o melhor deputado

    2. Com uns poucos sérios e competentes poderemos mudar a cara desse Congresso! À partir dos seus discursos e pautas é possível conscientizar o povo brasileiro e fazer a opinião pública mudar com relação à muitos políticos desonestos!

    3. Concordo com a Anna. O Kim tem sido uma pedra no sapato desses populistas. Por isso tem sido alvo constante da esquerda e da direita que, na verdade, são dois lados da mesma moeda. Como o Congresso ainda nem reiniciou suas atividades não dá para saber se o Kim e os que pensam igual a ele conseguirão formar um grupo que seja diferente dos que estão lá e faça com que o Brasil pare de ser igual a um cachorro correndo atrás do rabo.

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