Reprodução"Acho que Estatística, como Escolástica, é nome de tia velha"

Os institutos de pesquisa são ‘de humanas’?

07.10.22

Eu sou paulistano, estatura mediana, gosto muito de fulana e com ela me casei. E voto no bairro velho do Brás, onde nasci e me criei. Passando por lá, domingo agora, me espantei com duas coisas: a tranquilidade geral e a diminuição visível da imundície eleitoral. Por “imundície eleitoral” me refiro não ao caráter geral dos candidatos todos, cujo cascão resiste até a banho com soda cáustica; falo antes das ruas, muito pouco atapetadas de santinhos, faixas e plásticos em geral. Para quem se prepara nesses dias para caminhar com as canelas atoladas em papelório, foi uma novidade bacana.

Outra coisa: quase não vi a sempre muito mal disfarçada propaganda de boca de urna. Entre a estação Roosevelt e o colégio em que voto medeiam uns quatro ou cinco quarteirões; em nenhum havia gente de boné, camiseta, bandeira ou faixa oferecendo cola, santinho, imagem, nada. Me senti estranho, quase desprezado: serei eu tão insignificante que esses rapinantes todos decidiram que não precisam me aliciar?! Às muitas mágoas que a política me trouxe, virá ainda mais essa?!

Mas, é claro, tirei disso, da situação desse microcosmo, dessa bolha chamada “eu e o bairro do Brás”, a conclusão de que a tal da “polarização” está menos polarizada do que se apregoa. Até porque, no bar que há na mesma calçada do colégio, se fazia churrasco e se bebia à larga, e camisetas vermelhas e verde-amarelas se misturavam irmãmente.

Pode ser também que, apesar do fundão eleitoral, essa entidade mais generosa do que caixeiro bêbado, o dinheiro para a militância tenha estado mais curto. Eu me lembro de amigos, nos anos 80, que se dispunham a entregar santinhos nas ruas em troca de um dinheirinho razoável que lhes pagava cinema, lanchonete e, com sorte, uma garrafa de vodca vagabunda. Pelo visto, até isso escasseou.

Dei a impressão de estar reclamando, amigo? Pois fique com meu pronunciamento oficial: estou é achando bom, ótimo mesmo, e confundindo esse marasmo todo, de modo muito intencional, com um início de civilização. Porque, quero crer, no Canadá, a limpeza das ruas pode ser maior, mas o marasmo cívico é o mesmo – e o Canadá, convenhamos, é mais civilizado do que a Vila da Penha. Ou do que o meu velho Brás.

* * *

Há uma brincadeira por aí, usada por alunos de letras, geografia, história, etc., explicando que essas pessoas todas são ruins de matemática porque são “de humanas”. Ora, eu também sou de humanas, e sempre fui ruim de matemática – inclusive eu acho que Estatística, como Escolástica, é nome de tia velha. Isso faz com que eu abomine todos os empregos que lidam com números, desde analista de sistemas até professor de matemática, passando por contabilidade, caixa de mercearia, bookmaker, agiota, etc.

Bem, agora força é eu reconhecer que toda a minha inaptidão aí confessada talvez me qualifique e muito para dirigir algum desses “institutos” de pesquisas. Porque, se eu sou ruim de contas – e sou –, sou também bom de chute, razoável de lábia e, modéstia às favas, sei produzir uns gráficos bem bonitinhos, coloridos e tal.

Porque no que interessa, que é a precisão dos números, eu sou tão ruim, tão inepto quanto os que lá estão exercendo seu mister. E, olha, cá entre nós: não sei quanto eles cobram, mas eu garanto ao amigo que precise de umas pesquisas que meus erros custarão bem mais barato. Porque, sendo ruim de números, sou ruim de precificação (ui!) – coisa que os “institutos”, aposto e ganho, não são.

Sim, já paguei um contador (um cara idôneo, foi tesoureiro de um partido) para criar o DataLandão. Nosso lema: erramos com perícia, falhamos com donaire, mentimos com simpatia. Solicite já seu orçamento: estou apontando o lápis.

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  1. Pesquisas eleitorais fajutas são pagas de verdade ou as notas fiscais são fajutadas também ? Será que Tarcísio virou o percentual do sábado para domingo? kkk muita cara de pau...

  2. Li em algum lugar que o datafalha cobrou meio milhão, para 1 pesquisa feita por telefone com 2mil entrevistados!!! olha que grana boa e fácil!!!

  3. O mais impressionante (além da constatação óbvia de que o Canadá é um lugar civilizado) é saber que, segundo consta, a grande e sábia "vox populi (aliás um desses tais institutos que sumiu da área ou mudou de nome) vox dei" é a favor da "intuição", do "sentimento", da "fé", mas se preocupa tanto com pesquisa eleitoral, que não é (e nunca foi) maneira sábia de decidir voto, a ponto de fazer essa fumaceira que não levará a lugar algum. Em tempo: Landão lembra do nome da estação Roosevelt!

  4. Identificação total com o autor do texto. Também fui da área de Humanas e a matemática era a causa dos meus pesadelos e desespero nos tempos escolares! Mas o “ chute” funcionava, de vez em quando, muito bem em certas questões e me salvou inúmeras vezes! Os pesquisadores dessas eleições calculavam mal e, pelo visto, chutavam pior ainda!

  5. A minha sessão estava "tensa": filas, pouquíssimas conversas, a turma votava e ia pra casa. Td protocolar, nenhuma animação... *** Minha solidariedade: péssima com cálculos 🙄 (aliás, o último concurso q prestei tinha 5 questões de matemática em q os enunciados só tinham letras e as opções só tinham número😒! Cadê a lógica?!(😜). Sucesso! Sua ideia tem td pra dar certo!😜

  6. Gostei dos antecedentes citados como demonstração da idoneidade do seu pretenso contador, kkkk! Afinal, ninguém conhece tesoureiro de partido que tenha tido problemas com a Justiça, não é?😂😂 😂😂😂😂

  7. Acho eu, os institutos de pesquisa não erram, a não ser um erro proposital, na pretensão de induzir o eleitor a um certo voto. Se errassem, erro crasso mesmo, estariam ainda no mercado e teriam tantos "jornalistas" a analisarem suas informações?

  8. Nào há negócio, eu escrevi NEGÓCIO, mais lambusado, hipócrita e desonesto no BR do que os tais institutos de Pesquisas. São quadrilhas organizadas com uma falsa aparência de honestidade e precisão do que essas trapizongas, que a cada eleição fsturam horrores. Claro que quem paga será sempre o(s) vencedor (es). Entra ano e sai ano, os donos dessas arapucas ganham rios de dinheiro graças a sua ingenuidade. Isso tem que acabar. JÁ.

  9. Texto que dá um imenso prazer em ler e uma tristeza de pensar que, se as ruas estão vazias de todo o lixo eleitoreiro (material), as contas bancárias de alguns candidatos estão bem cheias.

  10. Tosetto foi uma boa aquisição da Crusoé. Tudo o que escreveu até agora me agradou muito. Revela um humor refinado e um estilo de linguagem muito agradável de ler.

  11. Na mosca o seu sarcasmo, Orlando. Divertido. Agora falando sério; a desmocratização brasileira (a redemocratização, da tal "novarepública", piorou a Democracia brasileira, agora apimentada com a autocracia dos supremacistas-juristas e de um maluco e um ex-presidiário, com sonhos de ditador- à Chaplin) tem parcela imensa da pesquisa política (juntaram o joio com o joio). Bom já disse: a estatística, muito bem casada com políticos, é a mulher de todos. Bata ser bem precificada

    1. Orlando, como representante da Moóca, digo a você: Tamu junto Bello!!!

    2. Muito obrigado, Suzana! Vindo de uma Mulher- o top da criação da genial Natureza- sinto-me desafiado a melhorar e me divertir como médico do SUS. Não ria; é possível! , sim, só basta ter gratidão aa Sociedade Brasileira que sustentou as Escolas Públicas em que estudei.

    3. seja colunista de Crusoé, Eduardo. precisamos de seu sarcasmo brilhante.

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