O divórcio do PIB
30.12.21Há dois anos escrevi uma coluna chamada Natal na miséria. Era sobre como a recuperação do PIB desde a recessão anterior não havia chegado aos mais pobres. Havia otimismo com o PIB para 2020, mas naquele contexto o PIB era uma medida falha: seu crescimento escondia a ausência de crescimento da renda dos mais pobres. Essa invisibilidade é da natureza do cálculo: o PIB é como uma média de todas as rendas, mas como uma média ponderada. Pesa mais quem ganha mais. Se os pobres vão mal, mas os ricos vão bem, o PIB vai apontar para cima.
É claro que o otimismo com o PIB para 2020 não se manteve: um pouco depois da virada daquele ano passamos a conhecer o horror do coronavírus. Mas a sensação agora é parecida. Há um divórcio do PIB. Grosso modo, pelo que chamamos de “ótica da renda”, há dois PIBs para analisarmos agora. O PIB dos ricos se recuperou bem, temos novos bilionários e até já se cogita aumento para a elite do funcionalismo. Mesmo o emprego com carteira assinada teve uma evolução bem melhor do que a da crise anterior. Mas o PIB dos pobres foi severamente impactado pela pandemia.
Se de um lado tivemos a exuberância de um Nubank, com IPO estrondoso em Nova York – resultado do melhor do empreendedorismo brasileiro –, de outro vivemos o inferno da pobreza provocada pela pandemia e agravada pela inflação mundial.
A taxa de pobreza teria subido de 25% no pré-pandemia para quase 30% em 2021, depois de uma queda a 20% em 2020, quando o auxílio emergencial cheio foi pago. Mais grave, a taxa de extrema pobreza teria partido de 7% em 2019 para 10% em 2021, depois de chegar a 2% em 2020. Essa montanha-russa na renda dos pobres foi estimada pelas pesquisadoras Luiza Nassif-Pires, Luísa Cardoso e Ana Luíza Matos, e pode até ter subestimado a piora ocorrida em 2021 pela aceleração da inflação.
Minha preocupação é que se optarmos por manter o foco em PIB nas análises em 2022, vamos perder de vista a situação material dos brasileiros que são tão desvalidos que mal contam para o cômputo do Produto Interno Bruto. Há, ainda, outro divórcio que podemos ver no PIB. Como mostrou Carlos Góes, o nível da ocupação dos homens já está próximo do nível pré-crise. Mas o das mulheres, que tombou muito mais, ainda está bem abaixo. Podemos dizer, simplificadamente, que o PIB feminino ainda precisa voltar.
Temos alguma razão para otimismo. O Brasil avançou bem na vacinação e é possível que a pandemia esteja acabando por aqui. Seria possível, assim, uma recuperação gradual do emprego informal, importante para a renda dos mais pobres (pense no ambulante, na diarista). O fechamento das escolas parece ter ficado para trás, o que é importante tanto para a alimentação das crianças quanto para a ocupação das mães.
Se ainda há dúvidas sobre o Auxílio Brasil, que ainda não foi sancionado pelo presidente, já sabemos que há aspectos positivos no novo benefício social, resultado de um esforço do Congresso. É verdade que ele não distribuirá tantos recursos quanto o auxílio emergencial, mesmo em sua versão mais minguada, mas talvez não desse para esperar isso com os atuais números da pandemia.
Na comparação com o Bolsa Família, está certo que o Auxílio Brasil será mais generoso, pagando valores bem superiores em 2022. Para os anos seguintes, com a promulgação da etapa final da PEC dos Precatórios, é plausível que o orçamento do programa seja bastante robusto e que uma das principais fragilidades do Bolsa seja superada – a formação das filas de pobres, que agora seria inconstitucional.
Salvo veto, o Auxílio Brasil também será acompanhado de um regime de metas de pobreza, que forçará governo e sociedade a debaterem anualmente como mobilizar recursos para que a pobreza e a extrema pobreza estejam sempre em queda no país. Uma lacuna, porém, se mantém, e ficará para novo governante: o reajuste dos benefícios e linhas de pobreza segundo a inflação.
Também podemos ver algo de positivo para o PIB de cima, que ajuda a puxar o PIB de baixo. O copo meio cheio são os marcos regulatórios de vários setores aprovados nos últimos anos e pouco discutidos. O grande obstáculo, porém, devem ser os juros altos, revertendo a queda obtida desde o impeachment, impactados pela inflação alta e pelas incertezas fiscais.
Em 2022, discutiremos não apenas o PIB de 2022, mas o dos próximos anos: é ano de eleição. Será mais uma eleição em que será possível prometer ou rechaçar a reforma tributária e a reforma administrativa – porque elas não foram e não serão feitas pelo atual governo. Outras reformas, importantes tanto para o combate à desigualdade quanto para o crescimento do PIB, incluem a abertura comercial, a esquecida reforma bancária e uma atualização vigorosa das políticas de emprego. Idealmente, uma expansão do Auxílio Brasil deveria ser considerada, para aproximá-lo do modelo de países desenvolvidos, em que há cobertura generosa quando há famílias com crianças (desenvolvimento infantil hoje é desenvolvimento do PIB amanhã). Seja pela pandemia ou por incompetência, são pautas que a atual gestão não conseguiu avançar.
O Brasil vai decolar no próximo ano? Parece que vai, mas de Itapemirim – piada que roubo do economista Gustavo A. Gonzaga.
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O artigo é muito bom, mas essa piadinha ácida no final podia ter ficado de fora... A quantidade de pessoas sofrendo com a miséria deveria despertar compaixão, solidariedade e não esse sarcasmo...
Sr Pedro escuto isso e muito mais desde os tempos da faculdade, o PIB dos ricos sempre foram bons ao contrario dos pobres basta ver as diferenças de renda, mas quando chega os populistas no poder, para diminuir a pobreza aplicam uns medicamentos paliativos e pronto o nivel de pobreza caem, produção esquecem,reformas estruturais esquecem,reforma adm nem pensar,mais municipios,mais tribunais e a forra começa, como aumentar o PIB verdadeiro? uma coisa que os mandantes(politiqueiros) não tem, Ética.
O primeiro passo é enxotar Lula e Bolsonaro de vez. O segundo é fazer uma limpa no Congresso.
Podemos esperar que o agronegócio contribua regularmente pro pib de cima. A reforma tributária poderia contribuir pra geração de empregos. Infelizmente esse governo capturado não tem perspectiva de avanços e sim de retrocessos como vimos no combate à corrupção e na lei dos transportes rodoviários. O fim da reeleição e do foro privilegiado ajudariam. A prisão em 2a instância também. Temos que melhorar o perfil do Congresso e conseguir um presidente não populista. Não está fácil, mas bom ano novo.
Igualmente. A reforma da previdencia saiu, igualmente a Independencia do BCB. Reforma do câmbio idem.
Penso da mesma forma’
Com este congresso atual somente fara uma reforma tributaria e bancaria, sobretudo com a taxacao das grandes fortunas e menores taxas para o trabalho e consumo caso haja pressao muito forte por parte da sociedade civil e das instituicoes que a representam. Esperamos que isso aconteca para o bem de todos.
Estados e municípios fecham tudo, quem se ferra? PIB se esse cara não sabe é sobre a renda de todos. FOLHETIM MORO ATACANDO. HIPÓCRITAS.
Esse desgoverno que está aí, só criou crises em todos setores!!!
.. texto que aplaudo de joelhos .. vamos ao que fazer em vez de chorar .. simples chegou a hora de promovermos una reestruturação da economia nacional com foco no mercado interno e óbvia elevação da renda das camadas menos favorecidas como medida prima .. os custos seriam pagos internando parte das reservas internacionais mantendo-as em níveis adequados com uma reforma tributária isentando o trabalho e taxando de forma equilibrada o consumo .. em 5 anos dobrariamos o PIB e seriamos imbatíveis.
um líder serve para conduzir algo a algum lugar e seu estilo é irrelevante pois o objetivo é mais importante . pensar com o estômago pode dar diarreia.
COM UM FALASTRÃO NO PODER , O PAIS FICARÁ ETERNAMENTE NA DERIVA. PAÍS DE FAZ DE CONTA.
Deus sendo brasileiro.........