Adriano Machado/Crusoé

Quebra de sigilo de Ricardo Salles revela depósitos fracionados de dinheiro vivo

10.06.20 08:15

Há duas semanas, Crusoé revelou que o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (foto), fez transferências milionárias da conta de seu escritório de advocacia para sua conta pessoal no período em que acumulou dois cargos públicos no governo de São Paulo, intercalados pela atuação como advogado na iniciativa privada. Foram 2,75 milhões de reais, em 54 transações realizadas entre 2014 e 2017. Agora a íntegra dos extratos bancários de Salles, cujo sigilo foi quebrado a pedido do Ministério Público paulista, mostra que, consideradas outras transações, os créditos em seu favor somam duas vezes e meia mais do que isso no mesmo período. Com um detalhe adicional: o material, obtido com exclusividade, revela que a conta do ministro recebeu depósitos fracionados de dinheiro.

Os dados da quebra de sigilo bancário trazem, ao todo, seis depósitos de 9,9 mil reais — o valor costuma chamar atenção do Coaf, o bureau federal que monitora indícios de lavagem de dinheiro, por indicarem possível tentativa de burla ao sistema de fiscalização, já que transações a partir de 10 mil têm que ser obrigatoriamente comunicadas ao órgão pelos bancos.

Três dos depósitos de 9,9 mil reais em espécie foram feitos no dia 15 de julho de 2016, véspera da posse de Salles como secretário do Meio Ambiente da gestão de Geraldo Alckmin, do PSDB, em sua primeira passagem pelo governo. As outras três operações fracionadas, também de 9,9 mil reais cada, ocorreram no dia 22 do mesmo mês, quando ele já ocupava o cargo público.

Entre os anos de 2013 e 2017, a conta bancária de Ricardo Salles registrou créditos de 7 milhões de reais. Desse valor, ao menos 332 mil reais são provenientes de depósitos em dinheiro.

A Crusoé, o ministro disse que foi ele próprio quem fez os depósitos fracionados. Salles sustenta que optou por esse tipo de operação para evitar o preenchimento de formulários do banco, obrigatórios para valores acima de 10 mil. Ele afirma que o dinheiro tem origem em pagamentos em espécie recebidos de uma construtora para a qual prestava serviços advocatícios antes de voltar para o governo. Os repasses foram feitos em cash, diz, porque a empresa estava com as contas bloqueadas no período.

Entre os 7 milhões de reais creditados na conta de Salles no período estão as transferências de 2,75 milhões feitas por seu escritório de advocacia, que Crusoé revelou na última semana de maio.

A quebra dos sigilos bancário e fiscal de Ricardo Salles foi autorizada pela Justiça a pedido do Ministério Público de São Paulo no curso de um inquérito que investiga o ministro por suspeita de enriquecimento ilícito. Entre 2012 e 2018, o patrimônio declarado por ele saltou de 1,4 milhão de reais para 8,8 milhões de reais.

O inquérito tramita em segredo de Justiça, mas os extratos bancários foram juntados a um outro processo, que envolve uma disputa judicial entre a construtora para a qual o ministro advogou e um engenheiro. Nesse segundo caso, Salles é investigado por suspeita de tráfico de influência e advocacia administrativa em favor da empresa, da qual foi coordenador jurídico durante os 20 meses entre suas duas passagens pelo governo de São Paulo.

O ministro diz que enriqueceu durante o período em que foi advogado na iniciativa privada e não enquanto ocupou cargos públicos. Ele afirma que recebia 100 mil reais por mês de honorários advocatícios da construtora.

Salles assegura que uma parte dos 7 milhões de reais transferidos para sua conta no período da quebra de sigilo já pertencia a ele e estavam em investimentos que foram resgatados. Um desses créditos a que o ministro se refere é de 1 milhão de reais e foi efetuado no dia 10 de dezembro de 2015. Além desse, de acordo com os extratos, a conta do ministro recebeu, aproximadamente, mais 850 mil reais relacionados a resgates de aplicações.

“Eu tenho 45 anos de idade, sou advogado, fui secretário de estado, fui secretário particular do governador e agora sou ministro. Você queria que eu tivesse 30 mil reais? É ridículo, não tem nada contra mim. Tanto que mexeram e mexeram e não acharam nada”, afirmou o ministro sobre a investigação do MP paulista sobre enriquecimento ilícito. De acordo com Salles, as investigações têm origem em denúncias feitas por um engenheiro que trava uma disputa judicial com a construtora para a qual ele advogou. “Ele é conhecido pela litigância de má fé”, afirmou o ministro.

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