Ricardo Stuckert / PR via FlickrMaduro não foi sequer citado no discurso de Lula, que seria ridículo se não fosse tão sórdido

Silêncio e ofensas a serviço de Lula

O presidente vai à Guiana, ameaçada pelo parceiro venezuelano, cala sobre Putin, Hamas e Maduro e lança vitupérios contra filhos de Judá
01.03.24

Há mais de 100 anos a Venezuela, respeitável (em termos mercantis apenas) vendedora de óleo cru ao mundo, mercê de seus riquíssimos poços de Maracaibo, na fronteira com a Colômbia, cobiça como um predador infatigável o mesmo produto, que na prática sustenta o país vizinho, a Guiana. Com aproximadamente 160 mil km², pouco maior que o Estado do Ceará, o território de Essequibo representa 70% do território guianês. É uma região rica em minerais como ouro, cobre, diamantes e, recentemente, lá também foram descobertos enormes depósitos de petróleo e outros hidrocarbonetos, o que aguçou ainda mais a volúpia dos ditadores venezuelanos. Recentemente, os temores dos vizinhos ameaçados aumentaram com a convocação pelo ditador Nicolás Maduro de um plebiscito sobre o apoio que a tirania inaugurada por Hugo Chávez cobiça sem descanso. Segundo o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) daquele país, 10,5 milhões de eleitores participaram do referendo, realizado em 3 de dezembro, entre os quais 95,93% aceitaram incorporar oficialmente Essequibo ao mapa do país e conceder cidadania e documento de identidade aos mais de 120 mil guianenses que nele vivem.

Nesse panorama violento acaba de entrar em cena aquele que se considera o pai da “democracia do amor” no vizinho ao sul dos dois países, o imenso e poderoso Brasil. Sempre apto a embarcar no primeiro voo que o livre da incômoda realidade que ele herdou em seu terceiro mandato, sem incluir os quarto e quinto, originalmente ocupados por sua militante tatibitate Dilma Rousseff, Luiz Inácio Lula da Silva viajou. Os 14 anos de mando petista no Brasil não bastam para arrancar de seu chefão de meio desgoverno uma palavra de reconhecimento de seu monumental fiasco. Em texto mal lido, Sua Excelência não teve a decência sequer de reconhecer sua influência majoritária nos erros que apontou transferindo-os para o que chamou de “países ricos” das agruras econômicas sofridas por seus anfitriões. E em nenhum instante apropriou-se da grandeza exigida da ocasião para, no mínimo, reconhecer a origem da reunião ao qual foi convocado como se fosse um pedido de socorro para atenuar a maldade do aliado com pretensões a assaltar um território que nunca lhe pertenceu.

Maduro não foi sequer citado no discurso, que seria ridículo se não fosse tão sórdido. Sempre pronto para proclamar sua corrida pela liderança do chamado Sul global, mesmo não sendo por ninguém mais reconhecido, o ex-sindicalista do ABC, que não domina o beabá da elegância diplomática, teve o desplante de também evitar se referir a Vladimir Putin, o policial de carreira que ocupa o trono de czar contemporâneo da herança depauperada, mas pesada, da gestão soviética de um Estado poderoso. Num discurso que talvez merecesse o Prêmio Nobel (que ele chamou de Nóbel na péssima leitura) do cinismo, ele fez questão de ignorar a desgraça, a miséria, a fome e a dor de um povo que nunca nada fez para merecer sua inimizade com faixa presidencial. A brutal, desigual e injustificável invasão da Ucrânia livre pelas tropas do segundo maior exército do mundo teve seus efeitos por ele reduzidos à carestia produzida nos países que compram defensivos agrícolas e alimentos da ex-colônia de Lênin, Stalin e agora do citado malfeitor. O exército, mas também idosos, mulheres e crianças eslavas do país invadido foram ignorados com a mesma ausência de caráter e caridade que caracteriza sua mudez unilateral, ofensiva e ostensiva.

O declarado admirador de Adolf Hitler e Ruhollah Khomeini na desprezada, maldosamente, e desprezível, ao pé da letra, entrevista à revista masculina Playboy em 1979, não podia deixar de esclarecer melhor sobre a seleção maligna de seu desprezo. O Brasil não é um intruso num encontro de países banhados pelo mar do Caribe, já que o chefe deste nosso (sim) meio desgoverno foi convidado. Mas ele poderia ter respeitado quem o honrou com o convite sem desprezar soldados idosos, crianças e mulheres brutal e covardemente trucidados pelo Hamas num projeto, este sim, genocida, pois ninguém precisa ser especialista em Oriente Médio para ignorar que a extinção da raça israelita é o projeto geopolítico primordial dos fundamentalistas islâmicos. Eles não atacaram o festival de música para ouvir canções, mesmo que fossem de ódio e de guerra, e não de amor.

Como lembrou, e muito bem, Roberto Freire, que já foi seu aliado, Lula não é parvo o bastante para voltar ao assunto do “holocausto” tão longe de Gaza, alegando que não usara o termo egresso do grego, seguindo o palpite infeliz de algum imbeciloide de sua corte imperial.

Em Georgetown, o hóspede do grupo caribenho voltou ao tema do combate à fome, mesmo após a descoberta de que a população de rua nas grandes cidades brasileiras aumentou 20 vezes nos últimos 12 anos. E ainda sem saber que a mortandade dos “suspeitos” pelas PMs do Rio e de São Paulo, enquanto os chefões do crime escapam à sombra dos fuzis, faz de sua proposta de usar esses carniceiros para dar aulas sobre evitar mortes no miserável Haiti caribenho a mais sórdida anedota de boteco de beco malcheiroso. O discurso às margens do Caribe é glorioso para seus centuriões e uma vergonha para os cidadãos de bem que acreditaram na lorota da restauração da democracia amorosa contra o capitão desvairado.
José Nêumanne Pinto é jornalista, poeta e escritor

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  1. Concordo plenamente com sua avaliação sobre nosso atual presidente. Temo muito pelo futuro do Brasil. O Consórcio Formado pelo Governo Federal, Grande Imprensa e STF, poderá levar nosso país ao Socialismo.

  2. Parabens Neumanne...Sempre Brilhante. Erudito. Didático , Obrigada por suas análises cirurgicas que sempre me encantam e me representam ...

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