Camilo Santana, ministro da Educação. (Foto: Joédson Alves/Agência Brasil)

Ministério da falta de gestão

Professores reclamam da paralisia do governo nas transferências entre instituições de ensino superior e denunciam descaso dos ministros da Educação e da Gestão
01.06.23

Na expectativa de se mudar para Minas Gerais, onde vai assumir o posto de uma professora universitária que morreu, Catarina* colocou sua casa à venda no início de janeiro. O imóvel, localizado numa cidade a 3 mil quilômetros de Minas, foi logo vendido, mas sua transferência para a nova instituição de ensino superior está congelada no Ministério da Educação (MEC) desde então. Nesta semana, a professora se mudou para a casa da mãe, porque não encontrou ninguém disposto a fechar um contrato de aluguel por menos de um ano. “A gente acaba ficando em um limbo, nem lá nem cá”, resume Catarina, que fala sob condição de anonimato, com receio de ser ainda mais prejudicada em um processo que bagunçou sua vida e que está deixando estudantes mineiros sem aula. E seu caso está muito longe de ser uma exceção.

Crusoé conversou nas últimas semanas com sete professores e técnicos que reclamam da paralisia do governo. Assim como Catarina, todos temem perder as vagas que conseguiram caso exponham suas identidades, que serão preservadas. Eles estimam que há cerca de 800 processos parados na administração federal e lamentam o que identificaram como uma nova camada burocrática no processo: o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), comandado por Esther Dweck. “A sensação é de total descaso dos envolvidos, sobretudo do ministro Camilo Santana, que foi considerado destaque na educação, e da ministra Esther Dweck, que é professora de uma instituição federal de ensino superior [IFES]”, diz Fernando*, que aguardava há três anos a vaga que surgiu em uma universidade da região Nordeste e espera pela redistribuição longe da mulher e dos dois filhos menores de idade, que viajaram com antecedência para a cidade de transferência. 

A redistribuição é uma alternativa aos servidores públicos que querem mudar de instituição sem prestar um novo concurso — e também uma forma de as instituições completarem seus quadros sem precisar gastar com um processo de seleção. Quando surge uma vaga, por morte, aposentadoria ou transferência, basta que as instituições envolvidas e o docente ou técnico se entendam para que a mudança ocorra. Esse processo costumava levar de 30 a 45 dias, até o fim do ano passado. Em 19 de dezembro, foi publicada uma portaria que reorganizou o processo de redistribuição de cargos, a partir de uma demanda do Tribunal de Contas da União (TCU). 

O caso analisado pelo TCU tratava de irregularidade em uma redistribuição no campus Birigui do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP). Um trecho do artigo 7º da portaria editada para prevenir irregularidades como a identificada pelo TCU veda “a redistribuição de cargo efetivo ocupado quando houver autorização ou concurso público em andamento ou vigente para preenchimento dos respectivos cargos, independentemente de classe, padrão ou nível de especialização”. Quer dizer, se um docente do departamento de química morresse no momento em que corria um concurso no departamento de educação física, sua vaga não poderia ser ocupada por redistribuição. Isso congelou qualquer troca de cargo no início deste ano, quando as redistribuições seriam retomadas após o período eleitoral, que suspendeu os processos de julho a dezembro.

O governo Lula só solucionou essa trava com uma portaria publicada no dia 9 de março, cujo artigo 9º especifica que “quando houver concurso público vigente ou em andamento, não poderá ser utilizado cargo vago de mesma especialidade ou área de conhecimento para fins de redistribuição”. Isso não foi o bastante, contudo, para destravar os processos. Marcelo* teve de desembolsar cerca de R$ 10 mil em uma ação judicial para conseguir sua redistribuição. “Foi um processo extremamente desgastante, o governo que entrou criou uma reburocratização”, critica, destacando que MEC e MGI usam sistemas diferentes, o que dificulta o acompanhamento dos processos. “Você liga no MEC e só ouve ‘não sei’, ‘tem que esperar’. Se o topo do Executivo não sabe o que fazer, quem vai saber?”, questiona, desabafando: “Nós estamos falando de um governo que está no quinto mês e ainda monta a equipe”

O drama de alguns dos professores e técnicos ouvidos pela reportagem se ampliou porque, por causa do período eleitoral, muitos deles esperam pela redistribuição há quase um ano. Um dos docentes aguardava o surgimento de uma vaga em seu estado natal há oito anos. Agora, teme perder o posto pela demora no processo. O professor Fernando*, cuja mulher e filhos viajaram com antecedência para adiantar a mudança, deixou a presidência de uma fundação de apoio ao ensino e a coordenação de uma pós-graduação na preparação para ser redistribuído. Seu rendimento mensal diminuiu e o processo não anda. Ele chama atenção para outra consequência nefasta da paralisia do MEC. “Essa inércia tem atrapalhado o planejamento das IFES para a realização de novos concursos e a recomposição do quadro de servidores em setores e áreas específicas. Sem contar que, no caso dos docentes, a redistribuição representaria economia na contratação de professores temporários”, diz.

Enquanto essas questões não se resolvem, há alunos sem aula e professores sobrecarregados. A Câmara dos Deputados promoveu audiência pública sobre o assunto nesta quinta-feira (1º). Durante a reunião, Joaquina Nobre, reitora do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais e representante do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif), disse que as alterações recentes trouxeram muita demora para o processo. “Nós precisamos de celeridade na redistribuição. São quase 100 mil servidores e a ausência de um impacta, numa manhã, a vida de 400 pessoas”, afirmou, destacando o impacto para os estudantes. Segundo ela, envolver mais de um órgão no processo “causa uma morosidade muito grande”

Para Mirian Dantas, representante da Andifes que também participou da audiência, “o processo se tornou tão burocrático que nada anda”. Os ministérios da Educação e da Gestão não participaram da reunião convocada pela deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS). Convidado, o Ministério da Gestão se limitou a informar por ofício à Comissão de Administração e Serviço Público da Câmara que analisou neste ano apenas oito processos de redistribuição, sete de interesse do MEC, dos quais três foram por via judicial, e que não há processos pendentes por lá. 

Em resposta a questionamentos da Crusoé, o MGI destacou que só se envolve nos processos de cargo vago e que “processos de redistribuição de cargos ocupados continuam sob a gestão do órgão de origem do servidor”. O ministério negou que a burocracia tenha aumentado como efeito de sua criação. “Todo e qualquer servidor que tenha interesse na tramitação de seu processo pode solicitar informação no órgão de origem, pelas vias administrativas já conhecidas”, informou, complementando que “é necessário esclarecer também que todo processo público requer a adoção de atos administrativos que assegurem a segurança jurídica necessária”. O MEC não respondeu às perguntas de Crusoé até o fechamento desta reportagem. 

* nomes fictícios

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  1. Educação nunca foi nem nunca será prioridade no Bananão. Os rios de dinheiro despejados na área só o são para serem canalizados para bolsos de nossos excelsos líderes.

    1. Quem vai pagar a merda de idiotas? Se liga mané !!!

  2. Bozo e lulla 2 🐀🐀 que não pensam na educação e nem na saúde .país nas mãos da esco Ria do congresso

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