OrlandoTosetto

Saudades de não saber quem seriam os ministros

16.12.22

Apareceram os nomes de alguns dos futuros ministros. Já não era sem tempo, dirá o amigo afoito; mas eu, que sou zen e vi os nomes, preferia que tivesse demorado um pouquinho mais, que tivessem continuado escondidos por um bocado mais de tempo.

Veja o caso da Fazenda. Eu confesso que não sei muito bem o que deve fazer um ministro da Fazenda, de modo que só me resta confiar na sabedoria do luminar. Mas moro em São Paulo, e sei de pelo menos uma coisa que o novo ministro gosta e tem enorme expertise em fazer: pintar ciclovias. Estou, portanto, convicto de que teremos um Ministério da Fazenda muito empenhado em passar quatro anos pintando ciclovias no solo pátrio. Da minha parte, até vejo com bons olhos a possibilidade de alguém conseguir pedalar de Ferraz de Vasconcelos até Caracas, seja pela integração regional, seja pela integração ideológica. E há ainda o incentivo à indústria: pintar uns dois milhões de quilômetros de ciclovias em estradas de terra gasta tinta, colega. Ainda que tudo isso pareça muito auspicioso, os que entendem de Fazenda, ao que parece, não acharam tão bom. Não era melhor ter segurado a informação um pouco mais?

Outra coisa: eu talvez ande lendo os livros errados, vendo os filmes e documentários errados, etc., mas me pergunto se um ministro da Justiça tão aberta, tão orgulhosa, tão rutilantemente comunista não proporia uma péqui amenizando esse negócio de proibir a pena de morte no Brasil. Me pergunto isso porque, segundo os tais livros, filmes e documentários de que falo, todo país que comunistou adotou a prática penal de enforcar ou fuzilar compatriotas por certos crimes. O amigo, querendo me tranquilizar, argumentará que não se pode fazer isso, pois as péquis não alcançam as cláusulas pétreas; e eu argumentarei que cortes tão supremas e tão criativas, inovadoras e proativas (e tão obviamente atentas às necessidades do novo governo velho) quanto as nossas não vão achar muito difícil fazer brita com qualquer coisa pétrea que se lhes apresente. Aliás, enquanto conversamos, talvez já estejam fazendo. Em seguida, o amigo argumentará que a pena de morte não consta do Código Penal; mas eu argumentarei que, aprovada a péqui, o resto se resolve com um bom almoço, uma boa caneta, um sambinha e a companhia risonha dos bons amigos. De novo: ainda que a farra seduza, os que manjam um pouquinho de justiça ficaram desassossegados; não era melhor continuar moitando? Pelo menos até depois do Natal?

Dos outros ministérios – Casa Civil, Defesa, Cultura – não tenho nem autoridade e nem estatura para dizer nada: sou a última flor do Brás, e pois sou, como o meu idioma, inculto e belo. Mais inculto do que belo, como percebe qualquer leitor atento.

* * *

Perguntas retóricas são aquelas que a gente faz por fazer, seja porque já sabe a resposta, seja porque a resposta, se houver, não interessa. Aqui apresento uma ao amigo: por que é que político eleito é diplomado? Não é como se ele tivesse se formado em medicina, é? Não é como se ele tivesse obtido grau em alguma coisa oceânica como a “gestão de projetos”, que vai da ponte pênsil à ergonomia das caixas de fósforo, ou terminado um curso online de “como ler os livros clássicos”. Essas coisas dão diplomas, certificados que seja, porque correspondem a um certo empenho, duvidoso que pareça, em aprender.

Mas um – digamos – deputado? É como se o mero fato de ele ter sido eleito lhe concedesse conhecimentos especializados ou fora do comum, conhecimentos que o autorizam a ser diplomado. Tá aqui o Beldroegas: antes da eleição era uma besta, não sabia fazer um “o” com um copo, mas agora que é deputado federal, ah, agora…! Assim, se o engenheiro engenheira, se o médico medica, se o leitor de livros clássicos lê livros clássicos, o deputado deputa. E tá aqui um diploma, ó, pra te mostrar que ele não é nada leigo em deputanças, que ele está plenamente apto e qualificado para deputanças. Ou deputações. Ou deputagens. Ou lá o que quer que os deputados façam.

Bom, aceitemos, vá, não vamos reclamar: o Brasil é terra pródiga em diplomações. Não passa dia sem que eu, por exemplo, receba uns três ou quatro de idiota. Por que então negar a uns vivaldinos seus atestados de esperteza?

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  1. É por esse e outros que cancelei a renovação da assinatura deste jornalístico atol. Esse cara cita "inculto e belo" e utiliza termos como "vivaldino"... A que ponto chegamos !

  2. Será que fundamentos pétreos podem virar diamantes? Se for possível, os supremacistas de deuses estariam se transformando em super homem que parece ser o único a deter a patente dessa magia. Constiruições, do mundo inteiro (e bíblias de beatos), se cuidem!

  3. Adorei seu comentário! Eu Tb moto em São Paulo e lembro que o novo ministro não era muito chegado ao trabalho: chegava às 9 e às 5 já pirulito várias!!! Um zero a esquerda isso nós sabemos !!!!

  4. Gostei de "transformar causa pétrea em brita", quer dizer achei divertido, é perigoso falar gostei, porque o Lula e os petistas devem estar realmente pensando em cláusula pétrea podem transformar em brita a seu favor. Não dá ideia, né?

  5. Nada que não possa ser piorado, por enquanto, serão 37 Ministérios, então, que preparemos nossos estômagos.

  6. De primeira ... a ministra da diversidade não será mais a Granja mas madame Jane Córner antiga e mais famosa cafetina candanga conhecidíssima da politicalha e ACREDITEM vai botar moral no galinheiro.

  7. Orlando existe a possibilidade de um invasor de propriedades alheias para o Ministério das Cidades. O Renan Calheiros também vai assumir um Ministério nao é???

  8. Com certeza. Esperasse pelo menos o inquilino indesejável sair do Palácio do Planalto . Após esse alívio, encontraríamos força para suportar os dissabores de um governo petista por esses quatro anos vindouros.

  9. O que deputados fazem? Políticos no geral e deputados no particular fazem NEGOCIATAS. Só, somente e apenas. Quanto ao ministro da justiça, também político, até recentemente pertencia aos quadro do PC do B (sim ainda existe). Possivelmente crê em gnomos. Agora justiçará o país... Sim, Pindorama e suas idiossincrasias...

  10. Concordo com o colunista! Poderiam ter deixado para apresentar os nomes depois da noite do Ano Novo! Assim poderíamos comemorar a chegada de 2023 na maior alegria, sem saber o tamanho da bomba que irá explodir no nosso colo depois da posse do molusco…

  11. Cláusula pétrea numa constituição com pés de barro? Isso não existe, podem fazer o que quiserem com cada vírgula dela.

  12. Legal mesmo foi ver a "emoção" do Lula ao ser diplomado. Logo ele que, não faz tanto tempo assim, se gabava de ter chegado ao "puder" sem ter diploma universitário, agora chora por ter se sentido discriminado. Aafffffffff.

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