É para comemorar ou para apavorar?
Não são bons os indicadores de realizações dos primeiros 100 dias de Lula, muito menos as expectativas suscitadas pela volta do PT ao governo.
Examinemos a sua proposta de responsabilidade fiscal desfibrada a pretexto de assegurar a responsabilidade social (que, de social, stricto sensu, não tem nada: ‘social’ não é sinônimo de ‘pobre’ ou de ofertar benesses para os pobres, mas vá-se lá dizer-lhes!).
É engraçado o que o PT faz com a cabeça dos trouxas. Haddad articula um plano que é uma licença para gastar e os trouxas dizem: “Ufa! Ainda bem. Imagine se fosse o plano da Gleisi. Menos mal. Saímos ganhando“. Fora o teto de gastos.
Sobre isso, convém responder três perguntas sugeridas pelo artigo do Felippe Hermes na Crusoé da semana passada (31/03/2023):
1) Não há mais necessidade de dois terços do Congresso para mudar, ou emendar, o teto (agora basta uma maioria simples)?
2) Não há punições reais pelo descumprimento do que foi estabelecido (descumprir o teto implicava em crime de responsabilidade fiscal – e agora)?
3) O governo não precisará mais ir ao congresso conversar quando quiser aumentar os gastos (já está autorizado a gastar mais, até determinado patamar)?
Vejam que as três questões acima são políticas, não propriamente “técnicas” (econômicas). Sobre as questões econômicas sugiro a leitura do artigo dos Marcos (Mendes e Lisboa): Regra fiscal: uma avaliação preliminar.
Celso Ming no Estadão de 31 de março asseverou: a “incerteza está em saber se na prática ele [o arcabouço fiscal] se sustentará, especialmente se os gatilhos funcionarão caso a meta fiscal não seja atingida. A impressão é a de que facilita os gastos, sem punição quando deixar de ser cumprido“.
No mesmo dia, Vinícius Torres Freire constatou na Folha que o plano é flexível demais. Lendo seu artigo só nos resta aduzir. Não há como fazer um plano de responsabilidade fiscal, de forma honesta, e comprovada, sem cortar gastos.
O editorial do Estadão de 1º de abril concluiu: “A proposta de arcabouço fiscal do governo aposta num crescimento irreal de receitas e não propõe uma única medida concreta para rever os gastos estruturais da União“.
Carlos Alberto Sardenberg, ainda no primeiro de abril, equacionou: “O novo arcabouço fiscal só funciona, mantendo as contas públicas em razoável equilíbrio, na ocorrência de três situações: 1) expressivo ganho de arrecadação do governo federal; 2) forte crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) ou; 3) alta inflação”. Lendo seu artigo é impossível não suspeitar que, para seu plano dar certo, na ausência de um boom no PIB e não podendo aumentar a arrecadação, o governo torcerá pelo aumento da inflação.
Afonso Celso Pastore, em entrevista ao Estadão, um dia depois, alertou: “Se o governo aprovar esse arcabouço, ele obtém uma licença para aumentar gastos. Se ele não aumentar a carga tributária, o superávit primário não vai ser gerado… Essa equação só fecha com aumento brutal de carga tributária”.
Esse arcabouço fiscal do Haddad é o maior malabarismo já visto em economia como política disfarçada. Tudo indica que é para gastar mais e não para cortar gastos. Ah!… Mas é melhor do que nada – dizem os corifeus da imprensa. Vamos ver quem será punido quando a meta fiscal não for atingida.
Claro que Haddad sabia o que precisava ser feito. Mas não podia propor porque, além de não concordar, sabia que Lula e o PT querem gastar e não aceitariam. Então fez uma proposta política de mediação. Um teto de gastos é inaceitável para populistas? Vamos propor então um piso de gastos, que tal?
O que se espera de nós? Que gritemos “Viva o novo piso de gastos” (sem mecanismos efetivos de controle)?
Mas não para por aí. Pois lá vai agora o governo Lula desfigurar totalmente o Marco do Saneamento para beneficiar empresas estatais, que passam a poder ser contratadas sem licitação e sem metas a cumprir. Desde, é claro, que essas empresas estatais possam ser aparelhadas, como foram no passado. Por isso Lula é contra a Lei das Estatais. Porque quer mais seis centenas de cargos para nomear seus militantes da frente de esquerda e para comprar aliados.
O PT no governo vai também intervir na política de preços da Petrobrás. Vai – é só questão de tempo – se insurgir contra as agências reguladoras. Vai querer controlar o Coaf e a Receita Federal. E vai, é certo, continuar dinamitando a autonomia do Banco Central.
Lula e o PT não gostam da palavra autonomia. Preferem a palavra soberania. Nem desconfiam que não há equivalência entre soberania e democracia. Soberania é uma reminiscência autocrática (soberano dizia-se o monarca absolutista). Na democracia nenhuma instituição, nem mesmo um governo (querendo falar em nome do país) pode ser, a rigor, soberano. Império, só o da lei. Só a lei (democraticamente aprovada) pode ser soberana. Por isso que a democracia não pode ser confundida com soberania (de uma classe social – que os populistas chamam de “o povo” –, de um líder, de uma força política, de um governo, de um Estado-nação) para, supostamente, entregar mais-cidadania (para “o povo”). Mas essa é uma cláusula pétrea da “constituição” do neopopulismo lulopetista que não será alterada por nenhuma argumentação, por mais sólida.
A volta do PT não é apenas o resultado do processo de alternância normal em democracias. Como se sabe, o PT não aceita a rotatividade democrática a não ser como resultado de um erro que tenha cometido por subestimar a força de seus inimigos. Usa as eleições não apenas para chegar ao governo, mas para tomar o reter o poder. Se, depois do mandato de um petista, um inimigo ganhar as eleições desalojando o partido do governo, isso equivale a uma catástrofe. Pane geral no sistema! Algo deu errado, pensam os dirigentes e militantes do PT.
Cem dias é um tempo muito curto para estabilizar a velha forma de dominação petista, recauchutada para o período 2023-2026. No máximo, o governo vai listar algumas dezenas de realizações no varejo – alguma corretas, reconheça-se, conquanto cosméticas. Não terá nada de realmente novo a apresentar. Mas – eis o problema – terá muita coisa de velho para tentar nos empurrar goela abaixo.
Dentre essas velharias, destaca-se a retomada da vibe da Guerra Fria. Sobre isso, as movimentações do país no cenário internacional desenham um quadro pavoroso.
Além de não se aliar à coalizão das democracias liberais em defesa da Ucrânia, barbaramente invadida e agredida pelo ditador Putin, o governo brasileiro esconde suas solertes propostas sob a justificativa da paz.
O Conselho de Segurança da ONU rejeitou há uma semana uma resolução russa que pedia a criação de uma “comissão de investigação internacional independente” sobre a sabotagem dos gasodutos submarinos Nord Stream, em setembro do ano passado. O texto recebeu apenas três votos a favor (Rússia, China e Brasil), enquanto os outros doze países se abstiveram. A resolução russa era copatrocinada pela China e por países não membros do Conselho, como Belarus, Coreia do Norte, Eritreia, Nicarágua, Venezuela e Síria. Entenderam? Foi uma iniciativa das sete ditaduras mais asquerosas do planeta. Em nome da paz o Brasil apoiou essa enormidade.
Em nome da paz, o Brasil não assinou a declaração final da segunda edição da Cúpula da Democracia. Provavelmente não concordou com a exigência de que “a Rússia retire, imediata, completa e incondicionalmente, todas as suas forças militares do território da Ucrânia“. Mais de 75 países assinaram: as democracias liberais, é claro, e muitas democracias eleitorais. O Brasil mostrou para o mundo que se alinha melhor às ditaduras.
Em nome da paz, o ministro das relações exteriores do PT, Celso Amorim (sim, o outro – Mauro Vieira – é o “oficial” do governo), vai conspirar meio secretamente com o ditador Nicolás Maduro (que cometeu uma inconfidência e revelou o encontro, do contrário nem ficaríamos sabendo que ele ocorreu). Como se não bastasse, organiza em seguida outra missão cercada de sigilo para confabular com o ditador Vladimir Putin. E diz que não tem tempo nem de passar num voo de pássaro na Ucrânia, ao menos para ouvir a opinião de Volodymyr Zelensky, o agredido. Ora, isso não é neutralidade. O governo brasileiro se alinha ao bloco das ditaduras contra as democracias liberais. Qual a dúvida de que esse Amorim é, objetivamente, um agente da guerra fria que caracteriza a política externa (e interna) do PT?
Se esse é o legado dos 100 dias do terceiro governo Lula (e o quinto do PT), então não há mesmo nada para comemorar. Só para apavorar!
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O "Shadow Cabinet" de Dallagnol vai mostrar din-din por din-din onde forem os gastos descontrolados que essa turma de la.drões pretende perpretar. Acho que Dallagnol vai ter muito trabalho e precisar o dobro de parlamentares para sua iniciativa ter eficácia
Desastre total interna e externamente. Os ptralhas querem o poder e não governar assim como o sindicalista ( origem dos ptralhas ) quer quer emprego mas não quer trabalhar.
Para apavorar com certeza...
Essa agenda obscura do PT a quem surpreende? No final, o que conta são o partido e a militância. O Brasil é um mero detalhe. Se não como se explica esse alinhamento com essas ditaduras asquerosas, quanto L elegeu como contraponto à ditadura de JB, que o PT segurou apenas para voltar gloriosamente.
Fora Lulla! Bolsonaro na cadeia! Alckmin Presidente! (dos males o menor) …
Nosso país ainda não apresentou um Presidente da República que pense no bem estar da população
Só para apavorar, mesmo! Filme de terror!
Muito bom artigo Augusto de Franco.
Com as forças armadas protetora institucional do Estado de quatro à quadrilha a única força capaz de deter e frear a quadrilha é o Congresso Nacional que tristemente vemos se render e se vender por emendas bilionárias entregando o país à sanha da ditadura clepto-comuno-fascista em clara implantação com a destruição dos valores cultivados há séculos transformando o povo em escravos do totalitarismo ladrão e assassino.
Nenhuma novidade. Só mais do mesmo.
O Bozo era muito, muito ruim, mas o PT consegue ser ainda pior - por ser solerte (o outro era tosco), é mais perigoso.
Realmente, estamos no mato sem cachorro...
E sem bússola nem rádio.