A história do primeiro brasileiro PhD em Engenharia em Harvard

O pernambucano Matheus Farias é o primeiro estudante brasileiro de destaque entrevistado nesta série
25.07.24

O que mais me encantou quando estive em Boston, em abril de 2024, para participar da Brazil Conference, organizada por estudantes brasileiros de Harvard, foi a oportunidade de conhecer os próprios organizadores e outros estudantes de destaque nos Estados Unidos e no Brasil.

Acostumado como jornalista a ouvir e analisar discursos do presidente do Supremo Tribunal Federal, Luis Roberto Barroso, e de outros ministros, parlamentares e autoridades públicas presentes, bem como a acompanhar a carreira de cantores, músicos e atletas também participantes, a grande novidade, para mim, eram aquelas moças e aqueles rapazes que, ao contrário de tantos jovens dispersos na busca da diversão obsessiva, não só buscavam qualificação acadêmica nas mais prestigiadas universidades brasileiras e americanas, mas também manifestavam genuíno interesse em ampliar seu rol de conhecimentos.

Quem são eles? Onde vivem? Do que se alimentam? Aonde querem chegar?

Foi dessa curiosidade, não saciada em breves contatos feitos durante o evento, e da vontade de levar a outros jovens (e a seus pais!) o exemplo de trajetória daqueles estudantes, que surgiu esta série de entrevistas com o pernambucano Matheus Farias (publicada nesta edição), a paulista Verena Paccola e a goiana Sarah Borges (ambas reservadas para as próximas edições de Crusoé).

Só aí já temos o primeiro brasileiro PhD em Engenharia em Harvard; uma aluna de Medicina da USP que descobriu mais de 25 asteroides em projeto da agência espacial americana Nasa; e a primeira bolsista de Goiânia também em Harvard, onde estuda Psicologia.

As pessoas mais interessantes que eu conheço não sabiam aos vinte e dois anos o que queriam fazer da vida”, dizia o texto “Use filtro solar”, publicado em 1997 no Chicago Tribune pela jornalista Mary Schmich e viralizado no Brasil a partir de 2003, na voz de Pedro Bial. Aos vinte e dois, porém, há pessoas interessantes que já estão se preparando e tateando o mundo, em busca de seu próprio caminho.

Assista abaixo à entrevista com Matheus Farias e leia a transcrição completa.

 

 

Salve Salve, sejam bem-vindos. Eu sou Felipe Moura Brasil, esse é mais um Crusoé Entrevistas. Hoje, muito especial, porque eu fui em abril para Boston, nos Estados Unidos, para a Brazil Conference, em que eu participei como mediador, palestrante, debatedor, naquela conferência que reúne um monte de gente do Brasil. E eu conheci vários estudantes brasileiros, de universidades americanas, inclusive de Harvard, onde o evento era sediado, e também do MIT. E um desses estudantes que eu conheci  é o Matheus Farias, estudante brasileiro de Harvard e — diz ele, ele vai explicar isso pra gente — o primeiro brasileiro Ph.D. em engenharia em Harvard. Matheus, seja muito bem-vindo ao estúdio do Antagonista em São Paulo, é uma honra ter você com a gente.
Felipe, satisfação total estar em seu programa. Felipe é um amigo que a gente se conheceu lá na Brazil Conference, nos divertimos muito — inclusive vimos o eclipse juntos lá…

É verdade, o eclipse. Pessoal todo lá espalhado no campus de Harvard, vendo o eclipse, que coincidiu com a Brasil Conference.
É.

E tava um um um momento muito muito divertido, todo mundo lá colocando aquele óculos especial que foi distribuído ali de uma maneira muito organizada, bem americana. Matheus é uma alegria ter você aqui com a gente. Então explica: você já é Ph. D.ou vai ser Ph. D.? Você está para ser o primeiro brasileiro a obter esse título e o que que é exatamente, para quem não sabe?
Então, Felipe, eu estava fazendo graduação em engenharia eletrônica na UFPE, a Federal de Pernambuco. Aí fiz vários projetos ali durante a graduação. Me senti competitivo, quando fui chegando perto do final da graduação e uma coisa que é um pouco incomum aqui pro Brasil, mas é uma uma prática que já acontece nos Estados Unidos, é você ir direto da graduação para o doutorado, né? Então o Ph.D., a real é que quando você traduz para a linguagem acadêmica brasileira, Ph.D. é equivalente ao doutorado. E aí apliquei para o doutorado direto, e acabei passando. Quando eu cheguei lá em Harvard, tem um instituto que é o Instituto de Estudos Latino-Americanos lá de Harvard. Tem um braço brasileiro lá e o pessoal ficou ‘Matheus, não sei se você tá ligado, mas assim: no sistema de dados aqui, não tem nenhum brasileiro que passou aqui antes, não.” Então acho que sou o primeiro brasileiro a entrar no Ph.D em Engenharia e aí eu tô nessa, né? Desde 2021.

Muito legal e bacana, e a história do Matheus também é muito interessante e vamos começar a contar aqui. Como vocês ouviram pelo sotaque — e ele já falou da Universidade Federal de Pernambuco — ele nasceu em Recife, não é isso?
Nasci em Recife.

E qual é a sua história familiar, assim rapidinho, pra gente pegar a sua biografia?
Nasci em Recife lá em 1998, então não sou tão velhinho assim.

É um garoto.
Mas a minha trajetória foi um pouco diferente do usual assim porque a minha mãe… quer dizer, a minha mãe conheceu o meu pai lá muito muito cedo e os dois me tiveram. E aí meu pai acabou se afastando por questões dele na família. E eu fui criado pela minha mãe ao longo de toda toda minha vida. Então, com a minha mãe, a gente vivia de pensão lá em casa, minha mãe acabou se envolvendo muito com os trabalhos informais para tentar trazer dinheiro em casa e me educar. Eu tive a sorte do meu pai ser o cara que disse ‘eu vou pagar tudo relacionado à educação para você’ e o resto, enfim, a família meio que toma conta disso. Então eu estudei, sei lá, nos melhores colégios de Pernambuco, mas em contrapartida minha mãe fez os trabalhos informais. Ela foi camelô, fez massagem em aeroporto, vendia salgado… então fazia de tudo para botar um dinheirinho em casa.

É  comum a massagem em aeroporto lá em Pernambuco? Eu nunca vi isso aqui no Rio de Janeiro e São Paulo…
Era um uns trabalhos informais que minha mãe conseguiu lá pra juntar essa grana. 

E aí a escola em que você frequentava era pública, era privada?
Era uma escola privada, uma escola privada que na época era top 1 do Enem lá em Pernambuco então na escola muito boa.

E aí facilitou evidentemente para a aprovação no vestibular.
Facilitou. É muito natural, né? Na época já era o Enem. Então eu tinha que fazer o Enem ali no terceiro ano do ensino médio e tinha toda aquela pressão. A “pessoa” (sic) vai até o terceiro ano do Ensino Médio. Mas se você entra na graduação a pensão acaba se estendendo até o fim da graduação. Então eu tinha esse primeiro objetivo ali, de entrar em engenharia e acabei entrando.

Você tá falando pensão, é essa que o seu pai pagava.
Exato. Então acabei conseguindo entrar lá na engenharia…

Então você conseguiu que ele financiasse seus estudos até o momento em que entrou numa faculdade pública, onde não era mais necessário.
E aí acabei caminhando com as minhas próprias pernas lá.

E como é que se deu essa paixão pelas exatas, que depois levou a engenharia. O que chamou a sua atenção? Seja na adolescência, seja na época da Universidade?
Eu comecei, na verdade, eu comecei sendo um aluno muito ruim na época do colégio.

Difícil de acreditar, hein?
Eu era aluno muito ruim, eu até conto a história aqui na oitava série lá, eu fiquei de recuperação em física, que a professora meio carrasca assim e aí tipo sorte da vida, acabei passando lá na matéria. No primeiro ano, eu conheci um professor que mudou minha vida assim o nome dele é Charles Turuda. Foi um professor que viu um potencial em mim que era muito difícil de ver ali.

De física?
É um professor de física. Ele disse ‘olha Matheus, vamos ficar no final da aula, aí eu te mostro as curiosidades legais’. E aí foi quando eu comecei a conhecer as Olimpíadas Científicas que foram uma mudança total na minha vida — que foi quando eu vi que a física ela não era chata, como é do jeito que a gente vê para o vestibular. A física é super interessante quando você joga uma pitadinha de criatividade. Quando você vê os fenômenos acontecendo de verdade assim, isso era muito que as Olimpíadas Científicas puxavam. E aí…pô, fiquei viciado em ler livro de física. Eu lia livro russo, peruano, indiano de física, passava o fim de semana inteiro resolvendo os problemas, minha mãe achava que eu estava ficando maluco, eu gostava.

Que bom que alguém passou a fazer isso, né? Porque eu gostava na época da faculdade também, estudei num num colégio muito bom do Rio de Janeiro. Gostava de dizer que eu gabaritei a prova de física no vestibular da UFRJ. Acabei não indo para lá depois mas é gostava muito das exatas e gostava de redação, de português e tal — o resto não me interessava muito e depois eu comecei a estudar bastante, português, história, mas na época do colégio eu era muito mais de matemática, física, química e de redação, de textos. Mas a vida vai fazendo a nossa própria trilha, né? A gente vai descobrindo as coisas com o tempo porque também é muito cedo para fazer algumas escolhas definitivas… Mas pelo visto você já foi se destacando também nessa época. E aí quando é que surgiu o primeiro destaque maior ou as Olimpíadas, né que foram importantes na sua trajetória?
Aí comecei a me envolver muito com a Olimpíadas. Principalmente Olimpíadas de física, mas o engraçado é que eu nunca fui um cara vitorioso de física. Quer dizer: no meu terceiro ano do ensino médio estava eu acabei pegando uma menção honrosa, que é como se fosse o menor título possível lá na Olimpíada, mas só de ter criado meio que um grupo de amigos, aquele grupo de apoio que estuda junto de você, os caras eram muito feras e aquele grupo é um grupo que estava almejando alcançar voos maiores e tal…então você ver se a galera hoje, está no ITA, no IME, e nas universidades do exterior. Então de estar naquele núcleo e de ter aprendido a aprender que é uma coisa — que a gente acaba aprendendo muito nas Olimpíadas, né? Quer dizer, nos vestibulares, você está fazendo aquele estudo focadão para passar no vestibular, mas você não tem a pureza de aprender o conhecimento pelo conhecimento. Então isso é uma coisa que eu aprendi muito nas olimpíadas. E eu amo competição.

Isso é maravilhoso. O atleta mental Matheus de Farias. E essas Olimpíadas eram inter-universitárias?
Eram nacionais. E aí meio que você vai crescendo você vai apresentando.

Mas cada equipe era de uma faculdade ou era individual a competição?
Então, existem Olimpíadas que são em equipe, e existem Olimpíadas que são individuais. Na minha época normalmente você representava o colégio, como pessoas. Então você senta a bunda na cadeira. Resolve aquela prova que a escrita clássica e tem as Olimpíadas que é de arguição, né de discussão. que eu acabei me envolvendo, depois foi bem legal também legal.

E aí como é que foi descobrir a possibilidade de estudar nos Estados Unidos?
Entrei na graduação e aí…primeiro que esses meus amigos foram para as melhores universidades do mundo. E aí eu entrei na UFPE que é uma universidade muito boa é uma top 1 do Nordeste. Lá é bem legal, sendo que o que eu tinha estudado para as Olimpíadas científicas me deu uma base para pôr os dois primeiros anos da engenharia. Então eu disse ‘não faz sentido estudar essas coisas, faz sentido ou começar a fazer projeto, começar a botar coisa no dia a dia, começar a ver a tecnologia acontecendo mesmo’. E aí foi quando eu comecei a criar meus projetos, que acabaram sendo os projetos que eu me senti forte para aplicar para fora.

A gente vai falar de cada um deles, mas faz aí o panorama geral.
São projetos de tecnologia que vão atacar ali o impacto social, é uma coisa que eu sempre gostei muito pela realidade que eu vivia aí ao longo de toda a trajetória, então, não sei se o pessoal aí de casa teve a oportunidade já pra ir pra Recife, mas Recife foi maravilhoso, sendo que tem alguns problemas lá…

Tava doido pra voltar lá, estava falando isso para o Matheus aqui antes da gente começar.
Tá em casa. Tá em casa.

Ah, que maravilha bom saber
Lá em Recife há um dos piores trânsitos do Brasil e até do mundo assim. Uma situação bem complicada. E aí eu disse ‘pô, como é que eu ataco esse problema? Como é que eu resolvo esse problema com tecnologia?’ E aí foi quando eu conheci a inteligência artificial e eu construí o meu primeiro projeto que era um projeto que eu colocava em inteligência artificial no semáforo da cidade. Eu escolhia qual era o melhor tempo de verde e vermelho do semáforo, de forma que o fluxo dos carros melhorava ao longo do dia…

Esse é o doutor Emmett Brown de Pernambuco. Vocês lembram do doutor Emmet Brown? Não é da geração do Matheus, “De Volta Para o Futuro” 1, 2, 3… Fica muito essa imagem? O pessoal brinca com você [com essa visão] daquele cientista que vai ter várias ideias para fazer projetos especiais?
Tem muito aquela visão do cientista maluco que a gente tá maluco, cabelo todo espetado para cima e tal.

É o Dr. Brown. Mas você tem projetos realmente de impacto social, como você disse, que tem uma utilidade, que tem uma funcionalidade prática no dia a dia e de preferência para resolver problemas urbanos…Como é que foi esse projeto do  semáforo? Em termos físicos, em termos de engenharia. Qual é o material? Como que você fez isso legal?
Então esse projeto, primeiro que a gente começou já fazendo uma parceria com o órgão de trânsito da cidade — porque é muito importante você saber como é o trânsito hoje e como seria o trânsito com o o meu sistema, né? Então foi muito importante pegar os dados dele, então o pessoal fornecer os dados, uma parceria entre o público com a universidade…Então a gente tem esses dados para validação. O que foi que a gente fez: a gente criou esses sistemas e a gente treinou o sistema com os dados deles, para conseguir ver qual seria a melhoria aplicando esse algoritmo. Então a gente criou todo o ambiente de simulação,  como seria a arquitetura das ruas lá de Recife e tal, onde fica o semáforo, onde fica e como é o cruzamento. E aí uma vez que a gente aplicou isso e, como sempre digo e gosto de dizer, eu participava muito da competição. E aí eu dizia: ‘Qual a competição que tem que eu posso submeter esse projeto?’ E a gente submeteu para a competição lá que era a competição nacional dos sistemas embarcados, né? Que são esse tipo de sistema que você embarca no semáforo— e aí a gente conseguiu melhorar em 130% o trânsito da cidade nessas vias de teste que a gente conseguiu lá.

Que beleza, mas é um projeto especificamente para o tempo do sinal vermelho do sinal verde. E aí varia? Por exemplo, você tem um cruzamento em que é melhor que um sinal demore mais do que o outro por exemplo, porque havia mais ocupada do que a outra quer dizer são essas questões de engenharia do trânsito?
Tem um um conceito que a gente fala muito na engenharia de trânsito que é a ‘onda verde’. Quer dizer: você pega o primeiro verde e, se você manter aquela certa velocidade durante o tempo você vai pegar todos os verdes — é o sonho. Sendo que essa onda verde, ela é calculada hoje primeiro de uma maneira completamente manual, e segunda com base na velocidade máxima da rua. Se há uma plaquinha lá, 60 km/h, significa que se você pegar o primeiro verde a 60 km por hora e manter, você vai pegar todos os verdes. Mas sabe que isso não é uma realidade usual, né? Quer dizer: se chove em Recife — por exemplo, chove bastante principalmente nessa época agora — se há um buraco, se há algum evento grande na cidade, é importante que em vez de ser esteticamente dependendo da placa que seja dinamicamente dependendo do ambiente que tá acontecendo naquele momento. Então a nossa alteração de verde vermelha era dinamicamente ao longo do dia

E esse modelo foi usado em determinado período ou tá sendo usado até hoje?
Isso é uma coisa que foi junto ali durante toda a minha trajetória. Eu era um cara muito novo, eu fiz esse projeto com 19 anos de idade… Então mesmo que você tenha todo o projeto bonitinho funcionando, 130%, chegava na hora…’ó, tem essa empresa aqui que trabalha com isso aqui há 20 anos, o que é que a gente vai acreditar no menino de 19 anos?’

Ah, tem o preconceito etário, o etarismo, sei bem como porque também passei por isso no jornalismo, tem sempre o pessoal mais velho, com ar professoral, ‘esse garoto’ é ‘tem tempo todo, muito a aprender’ essas coisas assim…não analisa as questões pelo que elas são o dado real é o resultado real o trabalho real, e isso é realmente desagradável e muitas vezes perdem a oportunidade. Tenho certeza que seu projeto teria sido muito mais útil ainda, se levassem em consideração ele por si. Agora teve um outro também que eu acho fascinante… A gente tá aqui mostrando o caminho do Matheus até Harvard, né? Nós vamos voltar a pegar esse gancho de como ele foi parar lá, é porque tudo isso acabou contando depois para aprovação etc… e um desses projetos é o localizador de tiro com um guarda-chuva do avesso. Conta mais pra gente, o que é esse projeto.
Acho que foi o projeto na verdade que realmente me botou em Harvard, ficou bem famoso. Esse projeto… Tudo começou quando a gente foi ver como é que as corujas faziam para localizar as presas.

Isso é fantástico!
Tinha umas pesquisas que pegavam uma coruja e um ratinho e botavam na sala completamente escura e, pelo som que o ratinho emitia, a coruja conseguia encontrar onde ele tava. Isso era muito curioso, porque a gente viu que era devido a uma diferença anatômica que tinha na disposição das orelhas da coruja, tinham orelha que é um pouco mais baixa do que a outra. E aí, quando o ratinho emitia o som, aquele som chegava primeiro nessa orelha de baixo e depois na de cima…Então é como se você estivesse andando numa calçada, o carro passar do seu lado e, como o som chegou primeiro aqui do que aqui você vira né? Então você já sabe onde tá o carro. E a gente estendeu essa ideia para como se fosse um guarda-chuva de cabeça para baixo. Pensa que cada perninha do guarda-chuva tem um microfone. Quando o cara dá um tiro, aquele tiro vai navegar na velocidade do som. O som do tiro vai chegar em cada microfone em tempo diferente, cada microfone era como se fossem as orelhas da coruja…E aí a gente conseguia encontrar a localização do alvo precisamente.

Mas se esse guarda-chuva é pequenininho? Porque quando você pensa em tiro, né? Um barulho muito alto e guarda-chuva… Um equipamento tão pequenininho… E a coruja é do ouvido pra outro, numa sala pequena, um rato…é uma coisa. Agora…o tiro faz diferença? Cada ponto do guarda-chuva, em termos de distância, para a chegada do som?
A velocidade do som é bastante alta. Então, a resolução do sistema era muito baseada na geometria desse microfone. Quanto mais perto o microfone era do outro, maior resolução que você precisa para captar aquele som. Então vai aumentando a dificuldade do sistema acontecer. E o sistema, na verdade, tem duas partes importantes. Ele tem, primeiro, de reconhecer que aquele som é som de tiro — e aí envolve a inteligência artificial. A gente fez uma parceria com o BOPE. o Batalhão de Operações Especiais aí do Brasil, para treinar esse sistema. Quando você tem que treinar a IA para dizer o que é tiro e o que é não tiro. Eu não tenho arma em casa, então eu contei com o BOPE aí pra ele dar uns tiros e eu gravar… E a segunda parte é essa parte do do sistema, de pegar o som e calcular essas diferenças.

E como é que como é que ele entrega o resultado de onde de onde foi disparado tiro?
A gente tem um aplicativo que é muito parecido com esse aplicativo de localização, de mapa. Então aparecia um pino de onde o cara atirou, baseado nesse algoritmo de localização. A gente tinha o resultado e botava um pinozinho lá.

Maravilha. Quer dizer: a inteligência artificial já tá bem presente aí no seu trabalho como uma ferramenta para se criar em cima dela outras coisas.
E a gente submeteu esse projeto para uma competição mundial de inteligência artificial que aconteceu lá na China, inclusive uma semana antes da pandemia de Covid.

Caramba!
Correria a gente foi lá e era uma competição que não era limitada a alunos de graduação, né? Quer dizer: eu tava na graduação, mas os outros competidores tinham graduação, mestrado, doutorado, tinha grandes indústrias… Então, para chegar lá a gente ganhou da Microsoft, aí ganhou da Intel, ganhou de várias universidades incríveis dos Estados Unidos

Você tem história pra contar pro resto da vida, não? ‘Ganhei da Microsoft nas olimpíadas lá na China’.
Tem um listão lá, tá? A UFPE tá lá em cima. Microsoft lá embaixo. Aí eu circulei assim o resultado. É muito louco.

Que beleza. Mas aí como é que você fez para apresentar esse currículo para Harvard? Foi simplesmente fuçando a internet e preenchendo o formulário ou teve alguma dica especial?
Application de doutorado, esse processo de submissão para entrar no doutorado lá fora não é o Enem. É completamente diferente, você tem que enviar vários documentos. Alguns desses documentos, por exemplo, histórico escolar; suas notas durante a graduação. Tem uma parte que é muito legal que são documentos sobre a sua vida — então tudo que eu tô falando aqui, eu falei lá no documento de Harvard também. Qual é a sua história acadêmica, quais foram os projetos que você fez, por que faz sentido você entrar no doutorado nessa área…E tem outra parte, uma parte muito legal também, que são as cartas de recomendação durante a graduação. Eu tive a proximidade com vários professores que fizeram o projeto comigo, inclusive uma das minhas maiores referências que foi ministro da Ciência e Tecnologia do ministro anterior, né? Chamado Sérgio Rezende. O cara me abraçou…Sérgio fez doutorado lá no MIT, que era uma das universidades que eu pleiteava, né? Fazer o doutorado…

Tão qualificado que nem voltou mais a ser ministro…mas enfim, contribuiu para a sua formação.
Demais. Eu tinha a carta de recomendação, para mim, de uma das maiores referências de Ciência e Tecnologia do Brasil. A carta dele tá moldurada na minha parede até hoje.

A gente vai voltar a falar desse negócio de Ministério mais adiante porque vai ser a parte aqui sobre o futuro. Agora, como é que foi a sua reação quando recebeu a notícia de que foi aprovado?
Foi muito engraçada essa história. Eu estava sentado no meu computador numa reunião de projeto de pesquisa e eu recebi um e-mail. Quando eu vi o e-mail, um negócio de Harvard assim…‘isso aqui só pode ser trote. Eu abri aí e estava assim: ‘Olha, você acabou de passar em Harvard e tal, não sei o quê, comemore. Aí eu disse ‘gente, só um minutinho aqui que eu vou ali na cozinha aqui, aconteceu um negócio aqui’. ‘Mainha, passei em Harvard!’. Ela saiu chorando por tudo que é canto, a minha vó não sabe o que é Harvard, até hoje chama de ‘Harvani’…Aí pô, alegria danada, todo mundo comemorando eu vou para fora.

Como é que sua vó chama?
‘Havani’

‘Havani’! E mainha mainha ficou feliz, ficou orgulhosa do filho…
Mainha conhecia, mainha sabia que era um negócio que mudava a vida, mudava tudo.

Sensacional. E ela tá viva, acompanhando?
Está viva, acompanhando e vibrando muito. Inclusive vai assistir a isso aqui também.

Que maravilha! Ficamos muito honrados e damos aí os parabéns pelo filho, que eu tive esse prazer de conhecer e agora tô tentando extrair a história que é isso que nós jornalistas fazendo, vampiriza… A gente tenta trazer à tona tudo que a pessoa viveu, para servir de orientação pras outras pessoas também, sobre como as coisas acontecem. E como é que é a sua vida… Passando agora para uma questão mais cotidiana, mas de rotina: como é que é o seu dia a dia lá em Harvard? Você tem um dormitório, tem um quarto, e isso dura todo o período que você tá lá e é seu? Tem alguma troca anual? Tem muitos brasileiros? Fala um pouquinho do seu dia a dia.
Primeiro um fato muito curioso: é que Boston é a cidade dos Estados Unidos que tem mais brasileiro.

É, eu notei.
É, tem muito brasileiro lá. O estado é a Flórida — normalmente o pessoal pensa que é a Flórida, é Orlando, Miami e tal — mas [a cidade de] Boston tem muito brasileiro lá. Acho que o dado do último censo da associação dos brasileiros e de Harvard é que tem 120 mil brasileiros… Se você quiser, não fala nem inglês lá, de tanto brasileiro que tem. O meu dia a dia… Eu tento me conectar muito com o pessoal que tá fazendo doutorado — como a gente falou aqui, eu sou o primeiro brasileiro a entrar no doutorado em engenharia, então não tem brasileiros na engenharia fazendo doutorado. Então eu moro com mais três colegas que fazem doutorado: tinha um amigo americano, um colombiano e um turco. E o nosso dia-a-dia é: a gente tem umas matérias que tem que fazer ao longo do programa. No doutorado você tem que fazer 10 matérias. E você está sempre fazendo a pesquisa. E aí, o meu grupo tem mais cinco alunos de doutorado que são orientados por esse meu orientador, que a gente tem reuniões duas vezes na semana.

Durante quanto tempo de doutorado?
O doutorado lá é no mínimo cinco anos.

Cinco anos e você tem que fazer só 10 matérias?
Só 10 matérias ao longo do…

Por que assim? A impressão que eu tive, circulando lá e conversando com as pessoas como você é que você tem muita liberdade curricular para escolher aquilo que você quer. E me parece que não tem assim um excesso de ocupação com aulas…quer dizer: você participa de aula, você assiste às aulas, mas você tem um longo tempo para estudar para além das aulas, né? Talvez até para a aula ser mais rentável, produtiva. Exatamente…você vai preparado e você…é enfim, tem toda uma preparação para ela e a consequência dela—mas não sufoca você e não sufoca o seu tempo. Eu percebi que as pessoas têm tempo para circular, para ir para a biblioteca, para ficar lá, passar muito tempo… É assim?

A gente tem muita liberdade lá. Um negócio que eu acho muito legal é que lá em Boston tem várias universidades de prestigiosas. Não é só Harvard, por exemplo o MIT que fica ali no mesmo bairro.
É, pertinho. Eu fiquei lá num hotel entre Harvard e MIT e dava pra ir andando pros dois

E aí o sistema de matérias de Harvard era integrado como MIT. Eu, por exemplo: das dez matérias que eu fiz, oito foram em Harvard e duas foram no MIT. Então veja que legal…você não só conhece a comunidade científica de Harvard, mas também de uma das maiores universidades do mundo também que é o MIT, então você tem essa liberdade de escolha das matérias, onde você vai fazer matérias também. A única coisa que o professor-orientador pede é que faça sentido com as linhas no direcionamento ali do seu doutorado e direcionamento da sua pesquisa —mas tem muito tempo muita coisa legal para fazer lá em Harvard. A gente tem acho que tem cinco ou seis academias e essa academia são gratuitas para o pessoal do doutorado. E a academia, pessoal, não é só academia só de levantar peso não: ela tem piscina olímpica lá, tem as quadras de squash que eu gosto muito de jogar, de tênis, de badminton também jogava muito.

E eu adorava quando era moleque…tentei levar lá para o Rio de Janeiro pra praia, mas não aí o pessoal só queria saber de futevôlei, de vôlei, agora de beach tennis e etc também, passei a jogar muito futebol ele mas o Badminton não pegou. Ficou como aquele negócio que a gente vê quando viaja para os Estados Unidos e tal e joga de brincadeira, né? Mas acabou não se popularizando muito no Brasil, embora já tenhamos profissionais por aí. Mas Matheus, a gente obviamente não quer politizar aqui esse assunto, mas a sua história mostra como, até por ser da área de engenharia, como existe muito mais vida e oportunidade em Harvard, e em outras universidades americanas, do que muitas vezes chega no debate público pra gente — e a gente obviamente aqui trata muito de política em O Antagonista e etc. Então volta e me a gente tem que analisar certas coisas que acontecem no campo, sejam protestos, seja declaração de reitor de universidade americana que gera polêmica, mas assim…no dia a dia é é você sente uma uma politização de tudo, ou você sente assim um lugar com estrutura que você pode trilhar o seu caminho ou acadêmico meio é sem participar disso?
Eu trilho essa trajetória acadêmica sem participar, mas tem muita gente que participa ativamente também dos protestos lá e se engaja com essas questões políticas, né? Então esse ano e o ano anterior teve muitas coisas que aconteceram na geopolítica mundial, você tem aí a Ucrânia e Rússia, aí você tem agora a questão da Palestina lá…uma coisa que viralizou muito esse ano foi a questão das dos acampamentos, né? Nas universidades o pessoal acampou fazendo protesto em suporte a Palestina e as coisas começaram a esquentar muito nas proximidades da minha graduação do mestrado. Eu peguei o mestrado lá e ali nas últimas semanas estava muito sério. Porque teve um acampamento no jardim de Columbia, que é uma universidade muito forte lá em Nova Iorque, e aí a polícia chegou lá e caiu em cima…E teve toda uma uma discussão bem séria lá, né? Começou isso. E aí os acampamentos que eram primeiramente em suporte a Palestina e acabaram sendo em suporte aos estudantes da Columbia. E aí se espalhou pelas Ivy League, que são o grupo das universidades prestigiosas por assim… Então, lá em Harvard, tinha muita gente muita família querendo conhece, por exemplo, o Harvard Yard —que é a parte principal, o jardim principal que tem a estátua lá de John Harvard? Pessoal

Passei por lá, cheio de lendas em torno daquela estátua, inclusive cheio de lenha, mas enfim. Eu vi que você postou uma foto é no seu stories no Instagram contra o antissemitismo. E eu achei ótimo que você tivesse essa postura é porque enfim, a gente é contra preconceito seja contra é judeus, israelenses, seja contra palestinos. Quer dizer: essas pessoas que estão lá nos Estados Unidos, principalmente porque a gente viu os certos embates com professores judeus etc,  não tem nada a ver com decisões que estão sendo tomadas, seja pelo atual governo de Israel, onde mesmo assim tem divergências internas, seja pelo Hamas. E no entanto as pessoas vão projetando o seu ódio por determinado político, por determinado governo ou por um grupo terrorista — porque aqui a gente chama o Hamas de grupo terrorista, mas vão projetando esse ódio em cima de outras pessoas que têm algum elemento comum e não dá para ser assim, né? Imagina que você tenha conhecido pessoas do mundo inteiro com essa abertura de espírito que você tá demonstrando aqui sem esse tipo de vinculação. Mas existem momentos que você sente que ali no campus a carga ficou mais pesada, né?
Tem muita gente que puxa para o lado, tem muita gente que puxa pro outro, a depender das experiências de familiares… Ali o ambiente é muito internacional. Pra você ter noção: no doutorado, quando eu entrei, entraram 30 pessoas — dois americanos, o resto tudinho internacional. Então, o ambiente é muito internacional, a minha posição política assim em relação a isso é que eu não quero guerra. Não quero guerra de nenhum jeito, quer dizer, não tem isso de apoiar matar de um lado ou de outro. Também não entendo muito sobre o conflito historicamente falando e aí quando é pra apoiar a Palestina, apoio a Palestina, quando é para apoiar Israel eu apoio Israel também. Eu quero participar dos eventos de paz.

É um posicionamento ótimo. E aí você falou ‘olha, não entendo muito do histórico do conflito’… isso que você falou assim, en passant, para alguém como você, que é um estudante de engenharia jovem ainda é raro da gente ver. Essa noção de que ‘olha, se eu for começar a me posicionar publicamente a respeito disso. eu preciso ter uma base de conhecimento sobre aquilo’… quer dizer ,você é um cientista na prática. Você está aí, tendo toda uma formação científica. E no entanto o que a gente vê e muitas vezes a gente critica aqui é que muitos jovens têm uma posição que não tem nada de científica. Ela é anti-científica. Eles simplesmente ecoam certas narrativas que a gente sabe muito bem às vezes de onde vem, que contém sínteses enganosas… Então muitas vezes a gente analisa diversos projetos falando de uma maneira geral. Não tô falando especificamente sobre esse caso. Por parte da juventude, não é que a juventude não possa se engajar — mas é que muitas vezes a gente vê que eles estão querendo transformar o mundo antes de compreendê-lo. É isso que é problemático, né? E é por isso que às vezes tem ruído e tem ódio demais. Mas vamos voltar aqui pra gente caminhar para o final…Você respondeu sobre o quarto lá no dormitório? Acho que não, né?
É verdade.

Você divide com alguém lá na faculdade?
Eu divido com mais três amigos, mas acho que o fato mais curioso é que existe a possibilidade de você pegar um dormitório, sendo que não é uma possibilidade que o pessoal gosta muito não, porque é um banheiro por corredor e é um banheiro ou masculino ou feminino. Então imagina: às vezes tu tá no no corredor que não tem banheiro masculino e aí, três horas da manhã, quer ir no banheiro vai ter que descer o andar…então a gente costuma não querer dormitórios. E aí a minha sorte é que um dos meus amigos, que devia que dividia quarto comigo, ele é americano e de Boston. A gente se conheceu remotamente, ele disse ‘vou procurar uma uma casinha fora do campus e a gente mora lá e divide’. A gente pegou uma casa super legal que fica a 15 minutos andando do meu escritório lá da engenharia e é lá onde eu moro faz três anos, né? Então é bem legal.

E a Brazil Conference? Eu participei esse ano, o Eduardo era o presidente e vocês têm um, como é que vocês chamam…Um comitê…
Existe uma presidência lá, né? São vários presidentes.

Tudo é presidente lá — o reitor não é reitor, é o presidente da universidade. Mas como é que vocês chamam o órgão que organiza a Brazil Conference?
A Brazil Conference é a entidade. E aí é organizado pelos alunos de Harvard, mas acabou estendendo também para alunos dos Estados Unidos em geral. Se você tem algum vínculo, seja de pesquisador ou seja de aluno em alguma universidade dos Estados Unidos, você pode se engajar como voluntário— porque é uma conferência completamente voluntária  — também e você pode fazer parte da construção dessa presença .

Explicando para quem não sabe: a Brazil Conference ocorreu em dois dias, foi um sábado e um domingo, um sábado em Harvard de domingo no MIT ali em Boston organizada pelos brasileiros, com um um cronograma de painéis sobre diversos assuntos… com políticos, com empresários, com atletas ex-atletas, com um artistas. Então: da Ivete Sangalo até o presidente do STF Luís Roberto Barroso, um monte de brasileiros falou nesse evento, inclusive eu e parlamentares. Enfim, a gente tava lá participando e depois de conhecer toda essa turma. O Eduardo, que fez o contato comigo e inclusive era o presidente nessa ocasião— agora você vai ser o presidente é isso?
É. Tem vários presidentes, né? A gente chama de co-presidente lá. Eduardo estava responsável pelo braço que a gente chama de impacto social. Quando ele assumiu sua presidência, ele tem que declarar os vice-presidentes e eu fui um deles

O sobrenome do Eduardo?
Eduardo Vasconcelos. E aí Eduardo ele tinha sobre os braços dele lá seis programas de impacto social e um deles que foi o programa que eu toquei era o programa de pesquisadores. Então a gente fez um processo seletivo, teve quase mil inscritos, pesquisadores brasileiros de diversos estágios da carreira científica.

Foi fantástico isso. Eu assistia às palestras com a Ana Paula… Ana Paula, como é que é o sobrenome da Ana Paula?
Ana Paula Zapelini.

 Zapelini! Ótima Ana Paula que fez um projeto em cima de uma cafeteira. A gente tava comentando né? Quando a gente conversou a respeito disso é no Brasil é assim, né? A pessoa faz um projeto com uma cafeteira. O outro faz assim, tem uns outros exemplos assim, achei muito engraçado, porque no Brasil você não tem muita estrutura, você não tem muito apoio é e isso faz com que as pessoas ligadas à ciência tenham que improvisar. Você foi tratar de sinal de trânsito. Você pegou o guarda-chuva para localizar o tiro, e ela fez um negócio com a cafeteira para medir… Como é que era? A poluição no mar?

Não sei se tu lembra: um tempinho atrás aqui no Brasil que teve aquele derramamento do petróleo e tal uma confusão danada. Ela fez um projeto que usava uma cafeteira Nespresso para identificar se o peixe estava contaminado. O título era esse e eu disse mesmo ‘que danado é isso?’ Na hora do programa de da aplicação dela.
Espero que ela possa ver aqui um dia que é muito legal a história também. É uma história fantástica.

E aí você ajudou a organizar essa parte de pesquisadores com a nossa querida Sara Borges também ali estudante de psicologia de Harvard também. Espero que ela venha aqui pra participar desse nosso projeto aqui de falar da experiência de estudantes brasileiros nos Estados Unidos… e agora você vai ser um dos organizadores ano que vem, mas isso ainda ainda falta um bocado, né?
Exato.

Vamos falar do futuro, para além do ano que vem. Eu sei que você tem uma ideia de virar ministro…virar ministro. Olha só: aqui, até o momento todo mundo adora o Matheus, cientista cheio de história. Aí ele quer virar ministro, aí você sabe o que que acontece se você quiser virar político — porque ministro acaba sendo encarado como político. Metade do país vai começar a odiar você se tudo continuar a ser como é hoje, com toda essa divisão com essa polarização. Mas eu espero que você, que tem todo o direito, que tenha toda a liberdade para seguir a carreira que você quiser, que lá na frente se você conseguir essa trajetória que hoje você vislumbra que seja um país melhor, né? Menos ódio. Enfim, que seja mais construtivo. E que você possa contribuir para a ciência para a tecnologia nacional com tudo aquilo que você aprendeu. Mas de onde vem esse sonho, o que você espera fazer pelo país?
Eu tenho esse sonho de ser ministro da Ciência e Tecnologia há um tempo já. Desde quando conheci Sérgio, que foi esse mentor e esse orientador aí durante a graduação que foi ministro também. Então ele sempre plantou a sementinha:  ‘Matheus, faz aquela coisinha aí pela ciência brasileira e tal, volta’…então quando eu cheguei lá e principalmente conheci a Brazil Conference, eu disse ‘pô, tem muita gente incrível aqui,  com o currículo brilhante, e que tá investindo do Brasil, que tá apostando em fazer a diferença no Brasil. Egoísmo da minha parte não pensar em uma coisa parecida também, ainda mais tendo todo esse background de impacto social que eu tive. Então eu tenho esse sonho, eu vejo hoje uma lacuna muito forte que é a minha área de estudo, né? Eu tô trabalhando com inteligência artificial e desde 2016 e eu sinto que, hoje, por exemplo, não tem uma pessoa de inteligência artificial no Brasil. Quer dizer: se o presidente quer fazer algum projeto, quem é que ele chama para discutir? Quem é o cara? Não tem. E aí eu quero ser esse cara e eu quero construir essa carreira de impacto social, com políticas públicas e inteligência artificial. E no momento aí de uns dez anos ou um pouquinho mais pegar esse cargo de Ministério e fazer o impacto social forte, fazer com que a ciência do Brasil avance tem essa experiê…Eu quero queria que todo brasileiro tivesse essa experiência que eu tenho lá nos Estados Unidos,  que é de o meu orientador dizer ‘E aí qual é a ideia?’ Eu solto a ideia, ele diz ‘Você pode fazer o que você quiser, tome dinheiro. Dinheiro infinito. A pesquisa é dinheiro infinito, né?”

Que maravilha, é outra realidade, né, mas também é uma confiança muito grande, né? De que aquilo não vai ser mal utilizado, que…enfim, que existe uma responsabilidade com aquilo que está sendo dado e aqui no Brasil, a gente precisa melhorar essa cultura, né? Para que haja um mecanismo fomentador e traga resultados. Tomara que você consiga esse projeto Matheus Farias, prazer enorme conversar com você e a gente vai deixar para posteridade registrada essa entrevista porque daqui a 10 20 anos ou antes, né? Já que você é tão precoce em tudo, o pessoal vai ver se enfim é tudo corresponde aquilo que foi dito.
Vamos nessa.

Muito obrigado Matheus pela sua presença
Um abração pessoal! Felipão vai começar a me criticar quando estiver lá no ministério, mas por enquanto estamos juntos!

Aí você vai vir aqui e a gente vai fazer uma entrevista no outro tom. Aqui é de saudação, de contar experiências, é nessa brincadeira. Quando virar ministra, aí vem a postura vigilante, ‘O senhor falou isso’… Agora já tô deixando material aqui reservado. ‘Vamos mostrar o que o Matheus dizia 15 anos atrás’. É e agora Matheus. Ah, estamos brincando. Você é muito bem-vindo mais, valeu? Tamo junto e assim: para terminar, um recado para estudantes brasileiros que ouviram você assistiram a essa entrevista e falam assim ‘estou pensando em estudar nos Estados Unidos, eu tô pensando em estudar em outros países’. Você tem algum conselho para essas pessoas.
Felipão, eu acho que o maior conselho que eu daria hoje é: se você está aí no colégio, está aí nos anos de Ensino Médio, começa a se engajar na ciência de verdade, comece a ver o romantismo. Eu sou muito romântico… Começa a ver o romantismo da ciência, tipo a ciência na prática,  a ciência básica também. Como é que tudo aquilo foi construído. Não pensa só no vestibular não. Acho que isso foi uma coisa que fez a mudança de chave na minha vida, então isso é uma coisa que eu falo muito sempre é. Eu sou organizador de olimpíada de física no Brasil, então eu tô super engajado com isso. Fui técnico da seleção brasileira na Copa do Mundo de física no ano passado no Paquistão. Então eu tô sempre envolvendo por esse lado e eu vejo que o pessoal que vai pra fora é o pessoal que passa por isso. O que passa por Olimpíadas científicas que conseguem enxergar a ciência do jeito que ela é. Então convido todos vocês a conhecer as Olimpíadas científicas e detonar.

É um recado de amor ao conhecimento, né, mais do que amor a um status a um cargo é uma vaga, né? Vamos buscar o conhecimento. É porque ele é a melhor ferramenta. E se puder ter esse processo com alguma competitividade, melhor ainda. Mais Sabor. ‘Se não for para não ganhar, se não é para não ganhar vai ganhar ninguém nem me chama, quero ganhar de alguém, quero ganhar em primeiro lugar ficar com uma medalhinha’.
E assim: eu fico super aberto para quem quiser conversar comigo também, eu sou um cara que estou nas rede sociais, se quiser me seguir aí é @matheussfarias no instagram, a gente tá sempre discutindo sobre olimpíadas científicas, eu sou muito engajado nisso e também fica aberto para ajudar quem quiser ajudar fora.

Maravilha, Matheus Faria, senhoras e senhores, estudante brasileiro em Harvard e primeiro brasileiro Ph.D em engenharia na famosa universidade americana.

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  1. Essa entrevista tem que viralizar, para que o Mateus seja exemplo, pra mtos jovens que estão perdidos nos colégios. Vamos aguardar tbm, ele ser um Ministro. Esse promete, hein!👏👏👏. Excelente entrevista, Felipe

  2. Excelente entrevista com um interlocutor de gabarito. Oxalá Matheus concretize o sonho de chegar ao MCT e de fazer multiplicar a paixão pelo conhecimento entre os jovens brasileiros!

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