Divulgação/NYSEBolsa de Nova York: com raras exceções a B3 segue Wall Street

A dona da pedra

A B3 não faz outra coisa a não ser seguir a tendência do S&P500, do Índice Nasdaq e do Industrial Dow Jones – e a recíproca não é verdadeira
29.09.23

Embora eu já tenha usado esse vocábulo, “pedra”, em algumas de minhas crônicas anteriores, algum leitor mais recente pode não saber a que estou me referindo.

Quando, em 1968, após ter regressado de Nova York, comecei a trabalhar como operador de pregão na Bolsa de Valores do Rio, as cotações das diversas ações eram anotadas numa pedra (mais explicitamente um quadro-negro).

Dois operadores fechavam um negócio. O auxiliar do comprador entregava o boleto num balcão da Bolsa, que por sua vez repassava a cotação para um rapazote. Este, mais do que depressa, galgava uma escada cujo topo se apoiava num corrimão (como esses das farmácias antigas) e subia para uma plataforma estreita junto a… junto à “pedra”.

No quadradinho correspondente ao papel negociado, o clerk apagava o preço anterior e escrevia o novo.

Lá embaixo, na agitação do trading floor, um operador poderia estar perguntando a outro:

“Qual foi a última da Belgo (Cia. Siderúrgica Belgo Mineira)?”

“Acabei de chegar aqui [respondia o colega], mas lá na pedra [ele dava uma olhada para o quadro negro, que era verde] está a 17.”

Por 17 ele poderia estar querendo dizer, por exemplo, 8 cruzeiros e dezessete centavos, porque ninguém perdia tempo dizendo o prefixo, no caso Cr$ 8, já que isso era uma coisa óbvia.

A expressão “pedra” não surgiu à toa, pois as primeiras bolsas de valores funcionavam nas cidades de Brugges e Amsterdã, junto a um muro de pedra. Daí usar-se “pedra”. Não por acaso, a mais importante bolsa de valores do mundo funciona em Wall Street (Rua do Muro).

Tudo isso é história. Hoje em dia, se vê as cotações em laptops, tablets e celulares. Restam poucos trogloditas, como é o meu caso, que já perscrutaram os preços numa pedra.

Durante décadas e mais décadas, a NYSE usou uma ticker tape com furinhos, como as fitas de telex e de pianolas (estou muito anacrônico na crônica de hoje).

Nas sociedades corretoras, os traders manuseavam a fita, resultado da impressão dos códigos dos furinhos, para ver as cotações, não raro com grande atraso em relação ao momento em que o negócio fora fechado no pregão da Bolsa.

Na capa de meu livro Os Mercadores da Noite, edição da Inversa, são exibidos diversos recortes desses tickers.

Então era assim: os gringos lá com suas ticker tapes e nós com as anotações no quadro-negro (verde).

Se hoje ainda existissem essas metodologias, podíamos dizer, sem sombra de dúvidas, que Wall Street é a dona da pedra.

Sim porque, nos últimos tempos, a B3 não faz outra coisa a não ser seguir a tendência do S&P500, do Índice Nasdaq e do Industrial Dow Jones.

A recíproca não é verdadeira. São Paulo pode levar um tombo cavalar, ou experimentar um bull run colossal, que a “Rua” de Lower Manhattan não fica nem sabendo.

Nem sempre foi assim, com os yankees dando as cartas.

Durante o bull market de 1968/1971, a gente nem olhava as cotações de Nova York. O que interessava mesmo era o que acontecia aqui.

A primeira vez que vi a então Bovespa sofrer um tombaço lastreado em Nova York foi na terça-feira, 20 de outubro de 1987.

Na véspera, a Bolsa de Valores de Nova York, representada pelo S&P500 e pelo Dow Jones (o índice Nasdaq já existia mas não tinha a menor importância), perdera um quarto de seu valor, no famoso crash de 1987.

A partir daí, não foram poucas as vezes nas quais a Rua do Muro derrubou, ou puxou, o Ibovespa.

Tanto é assim que os especuladores, gestores e analistas brasileiros acompanham tudo que acontece nos Estados Unidos.

A maior influência ocorreu nos dias subsequentes aos atentados de 11 de setembro de 2001.

Unemployment, US non-farm payroll jobs, PPI, CPI, Beige Book, Housing Starts, Building Permits, New Home Sales, Durable Good Orders, Retail Sales, Trade Balance, tudo isso tem a mesma importância para os profissionais brasileiros do que nossos boletins Focus, IPCs, IPCAs, IPAs, etc.

Isso sem falar das reuniões do FOMC (Federal Open Market Committee, ou Comitê Federal de Mercado Aberto, do Federal Reserve), das coletivas de imprensa do chairman do FED e das atas das reuniões do colegiado americano.

Nos últimos tempos, depois que o FED decidiu que a inflação nos Estados Unidos tem de retornar ao patamar de dois por cento ao ano, e está agindo de acordo com essa meta, com raras exceções a B3 segue Nova York.

Hoje mesmo, quarta-feira, 27 de agosto, enquanto escrevo esta crônica, a B3 até que começou bem, nem que seja por causa de um short covering de realização de lucros, tão violentas foram as quedas nos últimos dias e semanas.

A alegria dos touros durou pouco. Logo a Dona da Pedra, ou Dona da Rua, mostrou quem manda.

Pode ser que um dia essa influência diminua, ou mesmo acabe. Ou, finalmente, quem sabe, passe para o mercado chinês, que já tem grande importância no Brasil, pois se trata de nosso maior parceiro comercial.

Mas por enquanto isso ainda está longe de acontecer. A pedra daqui espelha a de Nova York, a Dona da Pedra.

Os comentários não representam a opinião do site. A responsabilidade é do autor da mensagem. Em respeito a todos os leitores, não são publicados comentários que contenham palavras ou conteúdos ofensivos.

500
  1. O sonho comunazista é outro crack da Bolsa de NY como em 1929 que pode estar chegando ... tremei Joesley, Wesley e Fulinha ...

Mais notícias
Assine agora
TOPO