O ataque de pelanca do petismo

Alguém aí acha ruim ter sorte? Sim, sorte: aquela força sem a qual, como dizia Nelson Rodrigues, não se consegue nem chupar um Chicabon (“você pode engasgar-se com o palito ou ser atropelado pela carrocinha”). Se você ganhar na Mega Sena, vai devolver aquela dinheirama toda porque o prêmio foi um caso de sorte, e não de mérito seu? Se você, na última hora, tiver deixado de embarcar num avião que depois caiu, vai se lamentar por não ser um dos passageiros?

Pois é, nenhum ser humano em seu juízo perfeito responderia “sim” a essas perguntas. Mas é basicamente assim que muitos petistas estão reagindo a qualquer um que ouse dizer que o Deus-Sol Luiz Inácio Lula da Silva vem sendo sortudo neste primeiro semestre do seu governo. Antigamente, a turminha só achava ruim quando falavam mal de Sua Lulidade; hoje, especialmente nas redes sociais, eles têm ataques de pelanca — expressão fascinante, perfeita para o contexto — se você apenas insinuar que Lula tem sorte, essa coisa execrável.

E é sempre aquela coisa muito orgânica, muito espontânea: como já disse outras vezes, longe de mim dar a entender que milhares de lulistas devotos escrevendo exatamente a mesma coisa nas redes estejam fazendo isso por terem recebido o “salve” do comando da facção. O principal alvo na semana que passou (houve outros) foi o editorial do Estadão cujo título dizia “Lula é um sujeito de sorte” — e não naquele sentido irônico da música de Belchior (“ano passado eu morri, mas este ano eu não morro”). Oh, meu Deus, como essa gente ousa dizer que os bons números da economia não são obra e graça do maior estadista do Universo conhecido, e talvez do desconhecido também, merecedor de mil prêmios Nobel?

Ora, nem o melhor governo da galáxia conseguiria, em seis meses, implantar mudanças estruturais de efeito imediato. O Estadão é até bonzinho em destacar como positivas a aprovação do arcabouço fiscal pela Câmara e a apresentação do relatório preliminar da reforma tributária — façam aí um sublinhado imaginário em “apresentação” e “preliminar”. Tudo isso é carta de intenções; a nova regra fiscal não começou a ser aplicada, a reforma tributária está bem longe de vir à luz e nada disso tem como afetar a economia neste momento, para o bem ou para o mal, a não ser na parte das “expectativas”. Ao mesmo tempo, a conjuntura externa está muito melhor que o esperado, com recessão “postergada” nos EUA e na China; por que diabos seria ruim para nós que Lula tenha tido essa sorte?

O que os petistas do ataque de pelanca não querem admitir é que, em grande medida, os bons números do PIB são puxados pelo agro (que é pop, mas eles odeiam — e olhe que não estamos falando do sertanejo universitário) e que a inflação está sendo contida pela taxa de juros que os monstros que habitam o Banco Central insistem em não reduzir. Claro: preferem insistir que tudo isso foi obra de São Lula, ao qual basta ser ele mesmo, em toda a sua divina lulidade, para operar milagres. Nada de novo, já que o petismo sempre foi excelente em se apropriar de coisas boas que não produziu. Quem continuará precisando de sorte somos nós, que já demos azar de cara só de ter nascido aqui no Bananão.

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A GOIABICE DA SEMANA

Foi instrutivo ver senadores da suposta oposição a Lula aprovarem alegremente a indicação de Cristiano Zanin ao STF, um prêmio do Deus-Sol ao seu advogado por tê-lo tirado da cadeia. Destaco a gloriosa Damares Alves, que primeiro declarou voto contrário ao advogado, depois disse que gostou muito dele — só faltou chamar de “fofo” — e em seguida jurou para a sua torcida que votaria mesmo contra. Mas o highlight foi Flávio Bolsonaro (foto), o filho 01, que durante a sabatina na CCJ do Senado elogiou a atuação “garantista” do Frederick Wassef de Lula. É isso aí: na política, seja situação ou oposição, todo mundo se garante.

Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado