Foto: Bruno Spada/Câmara dos DeputadosO deputado Jhonatan de Jesus, escolhido para o TCU com a conivência do Centrão de Arthur Lira e da esquerda do PT

Lulinha, o leniente

O PT, seu papa e devotos de Jair Messias — Jhonatan de Jesus, Daniela do Waguinho e Juscelininho — calam, como o Moisés de Michelangelo
03.03.23

Com 239 votos de seus colegas deputados, Jhonatan de Jesus (Republicanos), eleito em Roraima, foi aprovado para ocupar a vaga de Ana Arraes no Tribunal de Contas da União (TCU). Ele indicou o mais polêmico dos três últimos diretores do Distrito Sanitário Indígena – Yanomami (Dsei-Y), Rômulo Pinheiro de Freitas, cuja gestão mereceu cobranças e manifestações dos povos originários. O período de sua administração coincide com o agravamento da tragédia humanitária do povo yanomami na maior reserva do Brasil: nela aumentou o número de crianças e adultos desnutridos e mortos. O senador Mecias (sic) de Jesus (Republicanos), pai de Jhonatan, indicou outros dois gestores, Francisco Dias Nascimento Filho e o ex-vereador de Mucajaí Ramsés Almeida. Isso não foi levado em conta por Arthur Lira, presidente da Câmara e líder do Centrão, nem pela esquerda do PT, que tapou olhos e ouvidos até para o fato de o grupo político ser de uma fidelidade canina ao ex-presidente Jair Bolsonaro. E à sua política anti-indigenista de proteção a garimpeiros invasores.

O site Jusbrasil identificou 103 processos contra Jhonatan de Jesus nos Diários Oficiais. A maioria é do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), seguido pelo Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA). Dos encontrados na Justiça pública, foi a parte que mais apareceu, seguido pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. Segundo as tabelas apresentadas a Camila da Silva, da Carta Capital, pelo senador Jorge Kajuru (PSB-GO), o Ministério da Saúde gastou R$ 41 milhões em voos às terras yanomamis, enquanto a Funai usou R$ 3,9 milhões com alimentação.

“Acho importante destacar o fato, porque quando chegar ao TCU não tem volta. Não posso afirmar a relação [de Jhonatan com os problemas de garimpo e desvio da saúde], mas é preocupante que não tenha uma investigação clara. Não se pode colocar uma pessoa que está dentro do cargo para investigar [questões que são de seu interesse]. […] Sou favorável [a] que tenha uma investigação para ver se há ligação direta”, disse a jornalista e ativista do povo indígena wapichana Ariene Susui ao Correio Braziliense.

O TCU é um órgão do Poder Legislativo e, portanto, da alçada do Congresso Nacional, não havendo interferência do presidente da República, Lula. Mas é patente o silêncio do Partido dos Trabalhadores (PT), pelo qual este se elegeu no segundo turno da eleição presidencial, em 2022. E também dos membros da aliança política responsável por esse triunfo.

De tal responsabilidade Lula, Alckmin e os líderes da frente amplíssima, que despejou a direita radical da chefia do Executivo, não podem se esconder, contudo, no caso da ministra do Turismo, que fazia questão de se chamar Daniela do Waguinho, mas trocou recentemente o nome de guerra para Daniela Carneiro. Pedagoga, ela foi reeleita com apoio do marido, prefeito de Belford Roxo, Wagner Carneiro, de quem era secretária, com 213.706 votos, batendo outro campeão bolsonarista do pleito, o ex-ministro da Saúde general Eduardo Pazuello, com 205.324 votos. O desempenho espetacular nas urnas levanta a suspeita de apoio das milícias locais, acusadas pelas autoridades policiais e judiciárias de exercerem a velha prática, ao que tudo indica insepulta, do voto de cabresto. Daniela ex-do Waguinho, atual Carneiro, evaporou-se exatamente durante o Carnaval, maior atração do calendário turístico nacional.

O mais novo membro do atual governo a frequentar as denúncias de malversação do erário é o maranhense Juscelino Filho (União Brasil), também deputado. O ministro das Comunicações do governo Lula enfrenta suspeitas que vão da ocultação de patrimônio ao uso do orçamento secreto para beneficiar propriedades da família. Médico radiologista e sem experiência em comunicações, tema da pasta, ele era um deputado federal do baixo clero até o ano passado. Foi incluído por Lula na sua equipe nas chamadas “cotas parlamentares”, para facilitar a relação com o Congresso.

Sua presença no noticiário data da denúncia do Estadão sobre o dito orçamento secreto, pois direcionou a prática sigilosa para asfaltar uma estrada que passa em frente a oito fazendas da sua família. As fazendas ficam em Vitorino Freire (MA), município do qual a irmã, Luanna Rezende, é prefeita. No total, a obra para asfaltar a estrada foi orçada em R$ 7,5 milhões. Apenas o trecho de 19 km, que passa em frente às fazendas da família de Juscelino Filho, custou R$ 5 milhões. O restante atende 11 ruas em povoados da cidade. Juscelino justificou que fazendas beneficiadas pela estrada são cercadas por “inúmeros” povoados. E disse considerar “leviano” afirmar que a estrada beneficiou apenas as posses de sua família.

Juscelininho não declarou um patrimônio de pelo menos R$ 2,2 milhões em cavalos de raça ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ele entregou a declaração de bens em 2022, quando registrou a candidatura a deputado federal, citando bens de R$ 4,457 milhões. O valor declarado é semelhante aos R$ 4,426 milhões que ele movimentou em leilões desde 2018. Os equinos são criados num haras também em Vitorino Freire. No papel, a terra pertence à própria irmã e a Gustavo Marques Gaspar, um ex-assessor dele na Câmara. Em leilões, entretanto, Juscelino é festejado por organizadores como dono.

Seu último feito foi viajar para São Paulo, com a justificativa de urgência, tendo saído de Brasília em 26 de janeiro. Mas seus compromissos oficiais duraram 2h30, e ele ficou até segunda-feira (30). Assessorou compradores de animais e recebeu o “Oscar” dos criadores naquele fim de semana. Também promoveu um de seus animais e inaugurou praça em homenagem a uma montaria de seu sócio. Sua atuação parlamentar tem como destaque um projeto para a criação do dia nacional do cavalo, único apresentado por ele em 2022.

O feito o associou ao exemplo dado pelo imperador Calígula (sapatinho), que nomeou o cavalo Incitatus para o Senado romano. E, de forma injusta, fez lembrar o velho ditado segundo o qual “quem fala muito dá bom dia a cavalo”. Afinal, o ministro não tem dito muita coisa a respeito de suas idiossincrasias. Nem ele, nem o PT, nem Lula, que já merece a alcunha nada majestática de “o leniente”. Nenhum deles tem o porte de Bucéfalo, alimária de guerra de Alexandre, o Grande. Todos imitam a estátua de mármore de Moisés esculpida pelo renascentista Michelangelo Buonarroti, que, segundo reza o folclore, não atendeu ao apelo do escultor quando, entusiasmado com a verossimilhança de sua estátua, ordenou: “Fala!”.

José Nêumanne Pinto é jornalista, poeta e escritor

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  1. O pai Mecias não foi aquele que da eleição do senado com os dois votos no envelope? Eles não se cansam de se sujar. Acabam aonde? ministro do TCU?

  2. É prática costumeira políticos nomear " escroques " sem moral e sem nenhum pudor em desviar dinheiro publico para seus "comparsas " ( Cumpanheiros ou aliados ). Ouvi de pessoa qualificada que Haddad tem ética e moral ilibada. Tem berço. Quanto tempo durará " com a chave do cofre ? ". Yonamani: Chaga aberta no coração da Amazônia. Gilmar praticou crime de difamação ? Um condenado no STF, Pode ? Só no Brasil...

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