Divulgação/Warner BrosLeonardo DiCaprio no papel-título de O Grande Gatsby, filme de 2013: o mercado malvado tem basicamente essa cara aí

O Brasil nessa situação e o mercado jantando

20.01.23

A culpa é claríssima: tem um pessoal aí que, ao longo das últimas décadas, surrupiou tanta balinha e tanto bombom Ouro Branco das Americanas que os caras finalmente foram lá checar e PÁ, descobriram R$ 20 bilhões de rombo. Aliás, rombo não, desculpem: “inconsistências contábeis”, expressão que usarei a partir de agora com todos os meus credores (“olha, houve uma inconsistência contábil aqui, que é ganhar muito menos do que eu mereço, e infelizmente não vou poder pagar o aluguel nos próximos meses”). Agora, parafraseando aquelas antigas vinhetas da Globo, é recuperação judicial e o melhor do Carnaval.

Muita gente merece um joinha nessa história, desde a turma que estava recomendando ações das Americanas na véspera da descoberta do rombo até, principalmente, os supostos auditores da PwC, que deixaram 20 bilhõezinhos passarem por baixo dos seus narizes. Também ficou difícil falar no “toque de Midas” do 3G, o trio de bilionários (Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles) que aparece o tempo todo no ranking dos mais ricos do Bananão e detém 31% do capital da empresa. Aliás, toda vez que alguém faz reportagem sobre o Lemann, as “lições” que o campeão nacional tem a dar são platitudes do tipo “trabalhe duro” e “sonhe grande”: fico sem entender como pessoas como ele e o Elon Musk, que passa o dia postando groselha no Twitter, ganham o dinheiro que ganham — o que certamente só corrobora minha condição de pobre vocacional.

(Falando nisso, circulou pela internet um troço chamado “Dobre Seus Lucros”, apresentado como “o livro de cabeceira de Marcel Telles”, que tem um capítulo recomendando atrasar pagamentos: “Passe a pagar suas contas em 45 dias, depois sessenta dias, depois em três ou seis meses, no caso dos fornecedores mais tolerantes”. Acho que saquei: o negócio é adotar o modelo Zé Carioca de gestão e fugir da Anacozeca, a associação nacional dos credores do simpático papagaio criado por Walt Disney. Devo, não pago, nego enquanto puder.)

Do outro lado, temos os grandes gênios das redes sociais perguntando incessantemente: “E o mercado, hein? A Bolsa não vai desabar com a fraude das Americanas, hein? É só quando o Lula quer dar de comer aos famintos, hein, hein? Tem que privatizar as Americanas!!!” (uau, que puta sacada, parabéns). Não vou nem tentar argumentar que o problema da empresa — que já está errada de saída em não se chamar Estadunidenses —, cujas ações viraram pó, é dos seus acionistas e funcionários, e não de todos os contribuintes. Em vez disso, fiz o que todo homem de imprensa empenhado em servir à pátria deveria fazer: liguei para o Mercado pra perguntar qualé, bróder, que silêncio é esse?.

Caso vocês não saibam, o Mercado é um misto do Leonardo DiCaprio brindando em O Grande Gatsby com o personagem dele em O Lobo de Wall Street. Infelizmente, não obtive resposta aos meus questionamentos: a assessoria do Faria Limer primordial me informou que ele estava muito ocupado participando de uma suruba com todas as drogas possíveis, lícitas e ilícitas, com pausas ocasionais para chicotear algum pobre e xingar muito o Lula no Twitter. Também me convidaram para ser chicoteado, do que gentilmente declinei. Enfim, é óbvio que o que essa gente odiosa quer é não deixar o filho do pobre ir de avião para a faculdade: o Brasil nessa situação e o mercado jantando (e convidando, muitas vezes, o Lula ou algum petista de alto coturno, mas não vem ao caso agora).

O que eu quero é saber como chegar a dever R$ 20 bilhões e tornar minha dívida tão impagável que ela acabe sendo perdoada: chega dessa coisa de pobre que é pagar rigorosamente em dia o carnê do Baú da Felicidade — quer dizer, meus compromissos financeiros. Talvez fundar uma igreja seja o canal: dá para fazer aplicações financeiras isentas de Imposto de Renda e de IOF e ainda ser chamado de reverendo Ruy Goiaba, Sua Santidade, Guia Genial dos Povos e outros títulos maneiros. Irmãos em Cristo, lembrem-me de passar o Pix para vocês na próxima coluna: para fazer 20 bilhões sumirem, a gente tem que dar um primeiro passo.

***

A GOIABICE DA SEMANA

Juro que tentei, mas não consegui resolver a situação de empate técnico entre o ex-ministro da Justiça guardando no armário uma minuta de golpe (“estado de defesa no TSE”), o gênio ex-assessor de Damares Alves que foi de tornozeleira eletrônica colocar explosivo num caminhão-tanque perto do aeroporto de Brasília e o advogado que entrou armado numa sala de ressonância magnética e acabou levando um tiro da própria pistola. A idiocracia se instalou entre nós de tal maneira que não sei como o Bananão ainda está de pé (narrador: “não está”).

Wellington Macedo, gênio da tornozeleira; acusado de terrorismo, ele está foragido

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  1. Confirmado: estamos numa carnavalcracis sem similar no planeta. E viva a criatividade deste povo de “Terra Brasilis”!

  2. Impossível não gostar das colunas do Goyaba, especialmente as bananices da semana. Que país, meus caros, que país!

  3. Muito bom, ri demais!!! Mas a goiabice da semana deveria ter sido dada ao 3G. Aliás, o nome já diz tudo: 3G, trio goiabice.

  4. Ruy posso escolher se vou rir ou chorar de seu texto? Estou sentindo que jamais chegarei a ser uma empresária de sucesso. Sei que é de envergonhar, as tenho que admitir que sou honesta.

  5. Como sempre, mandando bem. Tem uma frase genial do Churchill que diz muito dessa turma sem noção: “Fanático é quem não pode mudar de idéia e não quer mudar de assunto.”

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