RuyGoiaba

O torcedor é, por definição, um doente

09.12.22

É difícil imaginar uma expressão mais redundante do que “torcedor doente” de futebol. Adoro, por exemplo, quando alguém escreve que alguma coisa é “prioridade zero” — o que pressupõe a existência das prioridades um, dois, três, 15, 98-B — ou quando alguém diz, com aquela expressão de admiração, que Fulano morou em “oito países diferentes”: eu ficaria muito mais admirado se ele tivesse morado em oito países iguais. Mesmo assim, “torcedor doente” deve ser o caso mais pleonástico. TODO torcedor de futebol é doente, e a Copa do Mundo no Catar, como era previsível, está fornecendo abundantes exemplos disso.

A bipolaridade futebolística é fato constatável por qualquer pessoa que conheça a relação de amor e ódio — oscilando entre um e outro a cada minuto — que os torcedores mais fiéis têm com os seus times. Com as seleções nacionais, uma vez que a Copa engrena, é a mesma coisa. Ganhamos da Sérvia com os gols do Richarlison? Timaço, franco favorito, ninguém segura, temos ótimas opções de banco. Perdemos para Camarões com o time reserva? Péssimo jogo, a estratégia do Tite é um horror, não temos banco, nunca vencemos Copa perdendo jogo na fase de grupos. Fizemos quatro gols na Coreia do Sul só no primeiro tempo? Timaço, ninguém segura etc. E assim sucessivamente, até a eliminação (“eu falei que esse time aí não presta”) ou a vitória (“eu disse que ninguém segurava!”).

No próprio jogo contra os sul-coreanos, vocês precisavam testemunhar a grita num dos meus grupos de amigos quando Tite resolveu substituir o goleiro titular, Alisson, pelo segundo reserva, Weverton. “Absurdo”, “palhaçada”, “o goleiro está entrando frio no jogo”, “isso não se faz”. Vejam bem: faltavam uns dez minutos para a partida terminar, estava 4 a 1 a nosso favor e, a não ser que acontecesse uma hecatombe, a Coreia jamais conseguiria fazer quatro gols e virar o jogo para 5 a 4, ou três e levar a decisão para os pênaltis (não era a Alemanha de 2014, afinal). Tite só queria dar ao Weverton a chance de ter uma foto em campo na Copa, mas naquele momento o pessoal teria aplicado uns sopapos no técnico se estivesse atrás do banco e não, felizmente, no WhatsApp: bipolaridade.

Hoje, o nosso problema é a síndrome de abstinência. Escrevo na quinta (8), estamos — os viciados em Copa do Mundo — sem jogos desde terça-feira e, subitamente, parece que a vida deixou de fazer sentido. Somos obrigados a lembrar que coisas hediondas como “PEC da Gastança”, “Centrão”, “grupo de transição do Lula” e a própria política do Bananão como um todo existem. Os mais fissurados recorrem até a reprises de jogos da Série B do Brasileiro, tipo Vasco x Ituano, para conseguir segurar a onda do cold turkey. E sempre aparece algum caricaturista muito perspicaz para fazer uma charge na linha “eles te roubam enquanto você torce”: mas não me diga, seu jumento. Eles roubam também quando nós não torcemos, e a gente vai lá e (re)elege todo mundo.

Mal posso esperar pela volta do ópio do povo e dos torcedores oscilando violentamente dos píncaros da glória (sempre quis meter essa palavra, “píncaros”, em algum texto meu) às profundezas do desespero. John Lennon estava errado: vida não é aquilo que acontece enquanto você está “fazendo outros planos”, mas o longo espaço de quatro anos entre uma Copa e outra.

***

A GOIABICE DA SEMANA

Aloizio Mercadante tem currículo para ser um dos grandes campeões desta seção. Na última quarta (7), o “coordenador técnico” da transição para o governo Lula veio a público dizer que a destituição de Pedro Castillo no Peru era “inaceitável” — ou seja, Castillo tentou dar um autogolpe à moda de Alberto Fujimori, fechar o Congresso e instaurar um regime de exceção, mas não conseguiu virar ditador, e nós não podemos aceitar isso! Até o próprio Lula divulgou nota depois para dizer que a decisão do Congresso peruano estava dentro do “marco constitucional”; mas Mercadante, vocês sabem, é o cara que parabenizou Zélia Cardoso de Mello pelo Plano Collor e, anos depois, estimulou Dilma Rousseff a bater de frente com o MDB de Eduardo Cunha. O Bigode não pode ver uma ideia errada passando, que não resiste a ir correndo abraçá-la.

Juca Varella/ Flickr LulaMercadante, uma das mentes mais brilhantes do PT (Foto: Juca Varella/Flickr Lula)

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  1. Olha, depois de 13 anos terríveis de PT, de toda a luta pra tirar a Dilma, e de mais 4 anos catastróficos com Bolsonaro, eu estou cansada!!! Não aguento mais acompanhar a política nem pelo Antagonista, que adoro! Agora entendo a apatia total em que mergulharam os russos após a Revolução de 1917, após saírem das mãos sanguinárias dos czares para caírem anos depois na ditadura de Stalin... Ou seja, toda a nossa luta pra melhorar o Brasil não deu em nada! Nessa Cleptocracia, adianta lutar? ☹️

  2. Acabou o circo(copa) e por aqui vai acabar o pão também...é muita gente incompetente e sem caráter tomando conta do bananão

  3. Somosroubadosempre...Agora com a posse do "molusco" a corrupção estruturada tem a oportunidade de retomar sua trajetória. Mas o povo gosta...

  4. Tudo voltou como dantes. Pensei que estivesse livre do carrapato do PT no poder. Ledo engano. Voltou com a liberdade do Lula. O stf letra minúscula, foi o protagonista dessa semvergonhice, como dizia o prefeito Odorico Paraguassu. Corruptos e carrapatos voltaram mais fortalecidos. Arregaçam as mangas para maiores investidas, com experiência de obstruirem suas descobertas. A lava jato destruída facilitará as ações desses marginais. Há décadas somos vítimas de populistas no poder. Triste sina.

  5. "Eles roubam também quando nós não estamos torcendo e a gente vai lá e reelege todo mundo". Se há frase que defina o manicómio que é o Brasil é esta.

  6. Pois é, chegamos ao fim dos feriados e gazetas por causa dos jogos da seleção, parando o país da pindaíba e engarrafando o trânsito… chegou a hora de avaliar e bradar contra a escalação de certos petistas sem preparo e luz para cuidar das finanças.

  7. Ou seja, a alegria do brasileiro , na atualidade, dança conforme a música. Em outras épocas, está alegria ainda conseguia acontecer honestamente. Hoje, até a alegria dos brasileiros é desprovida de sinceridade e dignidade.

  8. já pedi ao pessoal de O Antagonista, não postar foto do Mercadante, estraga o dia de qualquer cidadão! saber o que ele pensa já é sofrimento mais que suficiente.

    1. ... Dar continuidade, Rosilene. O "show de horrores" faz parte da paisagem, como o Pão de açúcar.

  9. Imagina se fosse coordenador técnico da seleção... Ainda bem que não é. O ptista, não muito chegado ao dito cujo, para agradar o guru deve estar pensando que "felizmente o congresso bonzinho liberou essa dinheirama para gente chafurdar; depois nos livramos desse "encosto". Sugestão: inventa uma pesquisa de satisfação pro chato. É a nova moda ligth do luloptismo "democraticamente" incorporar ou desincorporar associados ( e bota porta da rua nisso!).

  10. Eu alterno entre pena e raiva do Brasil. Povo burro! Teve a chance de mudar mas, não, não quis. Preferiu ficar entre lula e bozo. PQP! Agora, aguenta!

    1. E a gente teve opção de voto? Os partidos deram um jeito de minar qualquer candidatura que ameaçasse essa polarização. É só ver como os candidatos perdedores foram rápidos em escolher um dos lados. Teve candidata que nem esperou perder e já declarou voto no L antes do primeiro turno e se dizia lutando contra o sistema e seu partido. Enquanto tivermos esse sistema político viciado e corrompido, não teremos opção de mudança. Que Deus tenha piedade de nós.

    2. ... Fico mais ou menos como você, Carlos. Mas sem "pena". ... Somos um bando de imbecis imbecilizados - com redundância - e tudo o mais.

  11. Para subir o nível e atingir o patamar de imbhecil Mercadante deveria ter 50 neurônios a mais e repassar pelo ensino fundamental 13 vezes.

    1. O mesmo que nine, senador cuecão, etc, etc... conhecido como. Pode-se chamar de vulgo, alcunha, cognome, como melhor preferir.

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