MarioSabino

Adeus e até logo

16.09.22

A Fênix é aquele pássaro mitológico que renasce periodicamente. Simboliza a busca pela eternidade, miragem demasiado humana que começou lá no Egito antigo, prosseguiu na Grécia e em Roma e se perpetuou nas religiões que sobrevivem até hoje. Em O Livro dos Seres Imaginários, Jorge Luis Borges compila os cálculos dos prazos de cada uma das vidas da Fênix:

“Tácito e Plínio retomaram a prodigiosa história; o primeiro corretamente observou que toda antiguidade é obscura, porém que uma tradição fixou o prazo da vida da Fênix em mil quatrocentos e sessenta e um anos. Também o segundo investigou a cronologia da Fênix; registrou que, segundo Manillo, ela vive um ano platônico, ou ano magno. Ano platônico é o tempo de que necessitam o Sol, a Lua e os cinco planetas para voltar à sua posição inicial; Tácito, no Diálogo dos Oradores, o faz abranger doze mil novecentos e noventa e quatro anos comuns. Os antigos acreditavam que, completado esse enorme ciclo astronômico, a história universal se repetiria em todos os seus detalhes, por se repetirem os influxos dos planetas; a Fênix viria a ser um espelho ou imagem do universo. Para maior analogia, os estoicos ensinaram que o universo morre no fogo e renasce do fogo e que o processo não terá fim e não teve princípio.”

O mito da Fênix me ocorreu enquanto pensava neste último artigo para a Crusoé. Não pela miragem da eternidade, que nunca cultivei, mas porque, na minha existência finita de homem sem sonhos, fui morrendo e renascendo a cada década, desde que fiz 20 anos, quando começou a minha vida adulta. Sou uma Fênix apenas de mim mesmo, com um princípio bem preciso, prazos decenais e um fim que será o derradeiro.

Agora, aos 60 anos, deixo os meus dois filhos editoriais, O Antagonista e a Crusoé. Como escrevi no Twitter, chegou a hora de andarem sem mim. Deixar que os filhos adquiram autonomia implica a morte de um papel paterno. Mas também significa o renascimento de um pai que observará de longe como os filhos se comportarão, na torcida para que trilhem o próprio caminho sem maiores percalços, e que ele seja bom e longo. Não há melhor legado.

Só tenho a agradecer aos leitores que me acompanharam aqui, semana após semana. Se, por um breve momento, eu os fiz refletir, rir e se emocionar, conquistei algo de muito valioso para mim.

Adeus e até logo. Fênix enquanto der.

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