Waldemir Barreto/Agência Senado

Para parlamentares, fatiamento tumultua debate e atrasa reforma tributária

22.07.20 18:50

O governo entregou ao Congresso o primeiro projeto de reformulação do sistema tributário brasileiro na terça-feira, 21, com a promessa de envio de propostas complementares até o fim de agosto. Para deputados e senadores que integram a comissão mista responsável pela análise do tema, no entanto, o fatiamento da reforma tumultua o debate e atrasa a construção do texto final. Muitos estão céticos quanto à aprovação da matéria ainda neste ano.

A “primeira etapa” da reforma desenhada pelo governo Jair Bolsonaro estabelece a unificação de PIS e Cofins. Para substituí-los, será criada a Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços, CBS, com alíquota de 12% para empresas e de 5,8% para instituições financeiras. Como a mudança alcança somente tributos federais, a alteração foi descrita em um projeto de lei, que tem tramitação mais simples e precisa de menos votos para passar a valer.

Na avaliação de parlamentares, as consequências dessa colcha de retalhos foram sentidas já nesta primeira fase da reforma. Responsável por mais de 70% do PIB brasileiro, o setor de serviços reprovou o texto apresentado por Guedes sob o argumento de que será prejudicado com a alta da carga tributária. Em resposta, o governo negou que o projeto eleve a tributação.  Apesar da negativa, como contrapartida, o governo prometeu uma ampla desoneração na folha de pagamento das empresas — resta saber se haverá mais custo. Fala-se em uma nova CPMF.

O deputado Marcelo Ramos, do PL do Amazonas, analisou que o governo deveria ter enviado o pacote completo de modificações. “A fusão de PIS e Cofins não é nada do ponto de vista do enfrentamento da complexidade tributária ou da regressividade do sistema”, disse.

De acordo com o parlamentar, com o fatiamento, “vai ser muito difícil” aprovar as modificações. Ele acrescentou que a proposta do governo, assim como as PECs que tramitam no Congresso, parte de uma premissa errada ao sobretaxar o setor de serviços e “ignorar uma tributação mais justa para as instituições financeiras”. “Se você não fizer uma reforma estrutural, vai sempre puxar o cobertor e descobrir alguém”, pontuou.

A Crusoé, o deputado Mauro Filho, do PDT, afirmou que o envio das propostas em separado “retarda” a efetiva mudança do sistema tributário. Com o descompasso, o texto inicial do governo Bolsonaro, na avaliação do parlamentar, resulta em um alívio pequeno à indústria e em uma sobrecarga ao setor de serviços.

Além disso, o pedetista ressaltou que, para combater desigualdades e otimizar a arrecadação, a reforma não pode se resumir à unificação de tributos, tampouco alcançar apenas impostos federais. Ele sustenta que a reformulação completa do sistema precisa ser a prioridade.

“O Brasil tem o terceiro maior sistema regressivo do mundo porque, proporcionalmente, o pobre paga mais impostos do que os ricos”, avaliou. “Você, quando recebe seu salário, paga Imposto de Renda. Mas, se um banco ou uma empresa distribuírem dividendos, os acionistas que recebem não pagam o IR”.

Líder do PSD no Senado, Otto Alencar considerou que, além apresentar uma reforma tímida e atrasar o debate ao fatiar a proposta, a equipe econômica errou o timing da entrega.

“Esperávamos uma reforma mais abrangente, o que não ocorreu. Além disso, houve atraso na entrega. Nada contra a reforma, mas não vejo como aprovar o texto nas duas Casas em meio à pandemia e com a proximidade das eleições municipais. Não vai ser tão rápido como o governo está pensando”, declarou.

A reforma tributária passará pelo crivo da comissão mista, que já trabalha com duas propostas de Emenda à Constituição bem mais abrangentes, apresentadas por deputados e senadores — um dos textos prevê a unificação de até cinco impostos.

Com os trabalhos interrompidos desde março devido à Covid-19, a comissão será reinstalada na próxima quinta-feira e deve retomar as discussões em 4 de agosto.

“Pretendemos limpar a pauta, ou seja, de forma remota, fazer as audiências públicas aprovadas na comissão antes da pandemia e, à frente, ainda neste ano, votar um texto convergente, que unifica os interesses da Câmara, do Senado, dos governos federal, estadual e municipal e também do privado”, disse o presidente da comissão, senador Roberto Rocha.

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