Agência Brasil

O risco do abolicionismo penal

30.11.18 20:00
Francisco Codevila

Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 9.054/2017, que propõe alteração na Lei de Execução Penal, no Código de Processo Penal, na Lei de Crimes Hediondos, no Código Penal, no Código de Trânsito Brasileiro, na Lei Antidrogas e na Lei dos Juizados Especiais. O referido projeto, aprovado no Senado Federal, aguarda deliberação da Câmara dos Deputados.

Dentre os vários e importantes temas disciplinados no projeto, chamo a atenção para as medidas de transação penal e suspensão condicional do processo de caráter extremamente abrangente.

Segundo o novo artigo 394-B do Código de Processo Penal, nos crimes praticados sem violência ou grave ameaça, cujo somatório das penas máximas não supere oito anos de reclusão, poderá o Ministério Público propor aplicação imediata de pena de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas. Esse dispositivo não se aplicará aos crimes de tráfico internacional ou transnacional de drogas ou de tráfico de drogas interno — nesse caso, quando o acusado for reincidente.

De acordo com o novo Parágrafo único do artigo 33-A da Lei Antidrogas, o tráfico de drogas praticado por agente primário não envolvido com organização criminosa, igualmente, enseja proposta de transação penal para aplicação imediata de medida restritiva de direito ou multa.

Pelo novo artigo 76 da Lei dos Juizados Especiais, nas infrações em que a pena máxima cominada ou aplicada não for superior a cinco anos, trate-se de crime de menor potencial ofensivo, ou não, o Ministério Público poderá propor aplicação imediata de medida restritiva de direito ou multa.

E, por fim, segundo o novo artigo 89, da mesma Lei dos Juizados Especiais, nos crimes praticados sem violência contra a vítima, em que a pena mínima cominada não for superior a três anos, trate-se de crime de menor potencial ofensivo, ou não, o Ministério Público poderá oferecer suspensão condicional do processo. O dispositivo em questão não será aplicado aos crimes hediondos e equiparados.

Portanto, em síntese, existem três possibilidades de transação penal: a) crimes praticados sem violência ou grave ameaça, cuja pena não supere 8 anos de reclusão; b) tráfico de drogas cometido por agente primário não envolvido com organização criminosa; c) crimes cuja pena não seja superior a cinco anos de reclusão.

Além disso, há a possibilidade da suspensão condicional do processo para crimes praticados sem violência contra a vítima, cuja pena mínima não seja superior a 3 anos.

Observo que, caso aceitas as propostas de transação penal ou suspensão condicional do processo, a consequência será a aplicação de medidas restritivas de direito ou multa.

Pois bem, sem descer a maiores detalhes sobre o projeto e focado apenas nas consequências das medidas acima descritas, saliento que, caso aprovada da forma como se encontra a proposta, a partir da sua em vigência, não haverá mais pena de prisão para os seguintes crimes, só para citar os mais recorrentes: 1) furto; 2) furto qualificado; 3) roubo mediante grave ameaça (nova redação do artigo 157, do Código Penal, segundo o projeto); 4) apropriação indébita; 5) apropriação indébita previdenciária; 6) estelionato; 7) receptação; 8) violação sexual mediante fraude; 9) assédio sexual; 10) corrupção de menores; 11) associação criminosa; 12) constituição de milícia privada; 13) moeda falsa; 14) falsificação de documento público; 15) falsificação de documento particular; 16) falsidade ideológica; 17) peculato; 18) concussão; 19) corrupção passiva; 20) corrupção ativa; 21) contrabando; 22) sonegação de contribuição previdenciária; 23) crimes contra as finanças públicas; 24) crimes contra a ordem tributária; 25) lavagem de dinheiro; 26) organização criminosa; 27) posse irregular de arma de fogo de uso permitido; 28) porte ilegal de arma de fogo de uso permitido; 29) tráfico internacional de arma de fogo e, 30) crimes contra o sistema financeiro.

Em nome, portanto, de uma estratégia de desencarceramento, todos aqueles que cometerem os crimes acima descritos, entre outros tantos não citados, não irão cumprir pena de prisão, sujeitando-se, apenas, a medidas restritivas de direito, como prestação de serviços comunitários, pagamento de cestas básicas, recolhimento domiciliar noturno etc.

Ora, se há problema no sistema carcerário, e de fato há, certamente a solução não é evitar o cárcere e expor ainda mais a sociedade ao contato com o criminoso. No limite, chegaremos ao abolicionismo penal, como forma de evitar o encarceramento.

Observo, por fim, que a não aplicação de pena de prisão ao criminoso servirá de estímulo para o cometimento de novos crimes. Nenhum criminoso temerá mais as consequências da prática daqueles crimes, pois sabem, de antemão, que, no máximo, serão obrigados a prestar serviços comunitários ou pagar uma cesta básica.

É isso mesmo que queremos?

Francisco Codevila é juiz da 15ª Vara Federal Criminal de Brasília e atuou no processo em que a ex-presidente Dilma Rousseff era acusada pelas pedaladas fiscais. O magistrado acabou tendo que rejeitar a ação porque o crime prescreveu. Na decisão, assim como neste artigo, ele criticou as amarras legais que impedem que um caso dessa magnitude, que levou ao impeachment de Dilma, tenha punições adequadas também na esfera criminal.

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  1. Muito bom e oportuno o artigo. Especialmente vindo de um juiz federal comprometido com a correta aplicação das leis. Compartilhei o conteúdo em minha página no Facebook. Infelizmente, tentei fazer o mesmo no WhatsApp, mas os contatos para os quais postei a matéria informam que não é possível acessar o conteúdo integral, salvo fazendo a assinatura prévia. Isso parece bastante contraditório, além de nada simpática a atitude. Crusoé perde com isso oportunidade de se tornar mais conhecida.

  2. Isso é uma afronta ao cidadão brasileiro de bem e à nossa nação! Essa estratégia da esquerda de implantar o caos, para depois, implantar de vez o comunismo/socialismo em nosso país, não pode sequer ser cogitada, imagina aprovada. O povo brasileiro já deixou claro, através das urnas, qual caminho queremos seguir. O governo do Presidente Bolsonaro haverá de respeitar isso e construir um novo Brasil! Com respeito à Constituição, com oportunidade e justiça para todos, e com respeito à família!

  3. Sem chance disso aí ser votado esse ano. Presidente da Câmara Rodrigo Maia não seria louco de colocar esse projeto em pauta. Viria pressão de todos os lados, principalmente do Jair Bolsonaro. Sem Chance !!!!

  4. Se conluio existe é com os parlamentares passíveis de ir para o xilindró... tantos deles não se reelegeram! Qualquer dúvida, basta ouvir o que Sérgio Moro pensa e fala sobre o tal "desencarceramento"!

  5. Acho que no fundo no fundo, essa turma quer é se proteger para o futuro que se desenha . Legislam em causa própria. Esse papo de diminuir os problemas carcerários é só manobra diversionista. Colocam essa relação enorme de crimes para serem tratados dessa forma, mas lá no meio está a corrupção , onde são especialistas. Preparam o caminho para as coisas continuarem como estão.

  6. A gente começa a observar um conluio do poder legislativo e o poder judiciário trabalhando ativamente no sentido de libertar criminosos, principalmente de colarinho branco, para assim livrar a cara de muitos de seus proprios membros. A sociedade se queda amedrontada, inerte e sem qualquer defesa. O poder se encontra totalmente corrompido.

  7. Há muito o Congresso Nacional não representa os anseios do cidadão comum. São bandidos legislando em causa própria.

  8. Nesta semana, um "abolicionista" destilou suas sandices no Entre Aspas da Globo News. No final do programa, deixou a máscara cair e tascou um Lula Livre. É disso que se trata, bandidos de grosso calibre querendo pegar carona nos "peixes pequenos". Felizmente, no governo Bolsonaro, essa loucura não passa.

  9. AUTOR: RENAN CALHEIROS!!! http://www.camara.gov.br/proposicoesWeB/fichadetramitacao?idProposicao=2160836 Pessoal, visitem este site do Congresso com suas contas do Face, cliquem em "O que você acha disso / Responda" e votem contra essa excrescência!!!

  10. Sempre considerei interessante que as empreiteiras condenadas por corrupção pudessem ter suas multas reduzidas, no processo de leniência, em troca da construção de presídios modelos - onde, naturalmente, presos fossem obrigados a trabalhar pelo próprio sustento. Talvez fosse uma boa solução...

  11. Todo dia temos que matar um leao. Bandidos da mais alta periculosidade com anuencia da Suprema corte de Lacaios. So nos resta ganhar as Ruas. Isso nso pode passar. Onde esta Kim, Joice, Chequer,. Vamos para as ruas derrubar essa bandidagem do congresso. Ainda bem que Bolsonaro se passar vai vetar. Rodrigo Maia é um Gangster precisa ser abatido antes que faça uma merda dessa.

  12. É, não é fácil não. Ainda bem que tem um juiz para nós mostrar tudo isso. Ainda bem também que teremos um novo e bom governo brevemente, com um Ministro da Justiça que entende bem de crimes.

  13. ... ... Sugiro a abolição do Brasil como projeto de país civilizado. ... ... Os Sentinelas - tribo citada no artigo do Mario Sabino - estão à nossa frente no que diz respeito à civilização. Eles vivem na Idade Média. Tudo que fazem, que praticam, condiz com a mentalidade deles, de seu tempo. ... Parabéns, Sentinelas !!! ...

  14. Acho que está na hora de uma intervenção militar. Não merecemos criminosos fazendo leis pra proteger outros criminosos. E, depois, um STF pra libertar de novo os criminosos.

    1. Se fosse instituída a pena de varaços em praça pública para todos esses crimes, garanto que não haveria reincidências. A vergonha aliada à dor jamais seria esquecida. Cria-se, em cada cidade, um palanque em praça pública e um painel onde constará o nome do malfeitor, o horário da punição e o número de varaços, definido em processo de conhecimento sumaríssimo. Se acaso reincidir tem a pena anterior dobrada, e assim por diante. Santo remédio, é assim que se combate o crime e a superlotação.

  15. Meus deuses, quanto mais se reza mais aparece assombração... este congresso nos coloca cada vez mais a beiradinha do abismo.Será que ninguem pensa na nação e em mudar tudo que aí esta de errado.Ja que se copia tanta coisa de americanos, porque não copiam apenas o código penal.

    1. Um velho sonho da esquerda brasileira é criar um sistema onde a burocracia mande mais do que o direito, e pelo que dá pra deduzir, a estratégia é desacreditar a Lei pra impor a burocracia, e esse projeto se encaixa direitinho . Aprovando leis absurdas como essa, você abre o caminho para concretizar o sonho dos petralhas e de toda a esquerda maldita .

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