Valter Campanato / Agência BrasilMais da metade dos casos registrados no Brasil são causados pela cepas que não são cobertas pela VPC10

A volta do negacionismo vacinal

Governo ignora cientistas ao decidir não atualizar imunizante contra pneumonia
25.05.23

A cada 43 segundos, perdemos uma criança para a pneumonia em todo o mundo. Por diferentes etiologias, segundo levantamento feito pelo Unicef. Muitas dessas mortes poderiam ser evitadas por meio de uma adequada adesão à vacinação. Como, por exemplo, com o uso da vacina pneumocócica conjugada, conhecida pela sigla PCV. Existem vários tipos dela, e cada uma recebe um número que descreve contra quantas bactérias é capaz de proteger.

Em 2022, o Brasil não atingiu a meta de cobertura vacinal para a maioria dos imunizantes do calendário básico infantil. A imunização contra as doenças pneumocócicas faz parte dessa estatística, justamente em um momento em que tanto se discute a importância da proteção contra as doenças respiratórias.

Apesar dos dados preocupantes, o governo Lula, que ao longo de toda a pandemia da Covid-19 defendeu a vacinação e chegou por diversas vezes a chamar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de “genocida“, rejeitou a atualização da vacina contra a pneumonia no Sistema Único de Saúde (SUS).

O bloqueio do governo, já na gestão da atual ministra da saúde Nísia Trindade, ex-presidente da Fiocruz, à incorporação do imunizante mais moderno, se deu após a reunião de retorno da consulta pública da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) realizada no dia 26 de abril. Nesse encontro, a Fiocruz e a farmacêutica GSK (GlaxoSmithKline), que são as atuais produtoras da vacina pneumocócica conjugada 10 (PCV10), argumentaram não ver a necessidade de incorporação da vacina pneumocócica conjugada 13 (PCV13, da Pfizer) alegando que a medida resultaria em custos indiretos e logísticos para o governo.

Maurício Zuma, diretor-geral do instituto Bio-Manguinhos, um braço da Fiocruz, disse no encontro que há impactos econômicos e tecnológicos e afirmou que: “A gente está aqui porque a gente tem a convicção de que a vacina PCV10 é segura ela, é eficaz, gera proteção coletiva e adequada para nossas crianças. Além disso trata-se de um ganho tecnológico para o Brasil, por ser um projeto totalmente alinhado com políticas que impulsionam o desenvolvimento do nosso complexo“.

Depois da consulta pública, a Fiocruz disse ainda que a vacina PCV13 não mostrou grande vantagem em relação ao que já existe hoje — e observou que o Bio-Manguinhos já trabalha na atualização do seu produto.

O atual Programa Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde prevê a aplicação da PCV10, que protege contra dez sorotipos de penumococo, bactéria causadora da pneumonia, para crianças de até 5 anos de idade e é produzida pela Fiocruz em parceria com a farmacêutica GSK. Porém, o tema discutido durante a 12ª Reunião Extraordinária da Comissão, realizada no dia 29 de novembro de 2022, na gestão de Marcelo Queiroga, a Conitec aprovou a incorporação da PCV13, produzida pela Pfizer, para imunizar crianças de até 5 anos no SUS. A atualização amplia a proteção contra três tipos a mais do pneumococo e até agora só está disponível na rede privada (em clínicas particulares, pode-se obter até a pneumo23, que protege contra mais dez agentes). A PCV13 também ajuda a prevenir os casos graves causados por Covid-19, ao melhorar a resistência imunológica do organismo contra infecções no pulmão.

Provocada pela bactéria pneumococo, a doença pneumocócica possui uma gama de apresentações clínicas, entre elas meningite e pneumonia. Estamos falando da causa mais comum de doenças graves nos menores de 5 anos. A PCV10 previne cerca de 70% das doenças graves em crianças, como pneumonia, meningite e otite. Já a PCV13 previne por volta de 90% dessas doenças e afeta a 13 sorotipos de pneumococos, enquanto a outra afeta apenas a dez.

O presidente do Departamento de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, médico Renato Kfouri, surpreendeu-se com a decisão da Conitec. Ele esteve na reunião do ano passado que votou pela incorporação da PCV13 e fez um alerta. “A Sociedade Brasileira de Pediatria é a favor dessa inclusão porque a doença tem se mostrado num cenário preocupante. Mais da metade dos casos registrados no Brasil são causados pela cepas que não são cobertas pela PCV10“, disse Kfouri. “Não é habitual após uma consulta pública com contribuições positivas a Conitec voltar atrás de uma decisão de toda uma comissão técnica” disse Kfouri.

Para o pediatra, os argumentos apresentados na reunião que derrubou a incorporação são fracos: “Nunca vimos a Conitec voltar atrás de uma aprovação de incorporação que demostra avanço de tecnologia. Nós estamos tentando entender o que aconteceu. Os argumentos apresentados na consulta pública são inconsistentes e não há evidências científicas para a não incorporação. Temos motivos de sobra para incorporar… são mais de 110 países que já utilizam a PCV13 em seus programas de imunização“.

Sandra Barros, ex-secretária de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos estratégicos em saúde do Ministério da Saúde, informou que a matéria foi à consulta pública com recomendação favorável da Conitec para ampliação no SUS de uso da PCV13 para a prevenção de Doença Pneumocócica Invasiva (DPI) e pneumonia em crianças de até 5 anos de idade. Ela disse que a reunião de novembro do ano passado não discutiu os pontos que foram levantados pelos representantes da Fiocruz, os quais também não foram apontados no decorrer da consulta pública. Na ocasião, o plenário considerou a não inferioridade da tecnologia e a segurança semelhante em relação à opção atualmente disponível no SUS. Também se considerou que o preço proposto para a pneumo 13 poderia gerar uma possível economia de recursos. A ex-secretária também estranhou os argumentos alegando que os custos logísticos iriam aumentar, uma vez que a Conitec fez uma avaliação econômica prévia comparando com as opções disponíveis. Além disso, os argumentos em favor da PCV10 não foram encaminhados à consulta pública.

Vale destacar, ainda, que o Brasil está entre os 15 países com maior incidência de infecções pela bactéria pneumococo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

A atual PCV10 já não é mais a melhor opção, não sei se essa escolha ocorreu por fatores políticos ou econômicos. Não há justificativa técnica e cientifica para a não incorporação da PCV13“, diz Renato Kfouri.

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  1. Excelente estreia na Crusoé, Kenzô. Eu ainda tive a esperança de que a opção pela PCV10 ser por, no campo, a maioria das infecções penumococicas estarem sendo causadas por cepas cobertas por essa vacina. Aí vem o pediatra e me lembra que aqui é Brasil, nada faz sentido e a gestão pública opta invariavelmente pela pior opção. Aqui está um tema que deveria ser dado mais a conhecer ao grande público. Saúde infantil não é brincadeira!

  2. Pouco importa que crianças morram, não são eleitoras. Realmente, o genocídio mudou de lado. Nosso país que já foi modelo em vacinação está voltando aos tempos do obscuros do bolsonarismo. Lamentável!

  3. Mudança no Marco do Saneamento e agora essa questão vacinal mostra como o desgoverno ptralha ( mentiroso e irresponsável ) se preocupa com a Saúde da população.

  4. Saiu a tchutchuca do centrão ,entrou o chefe do quadrilhao .POBRE PAÍS ,nas mãos de políticos. Pi caretas e dos COR RUPTOS DO CENTRÃO

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